A mulher que apita os homens
HÁ uma certa importância antropológica no facto de Stéphanie Frappart ter sido a primeira mulher a arbitrar uma final europeia. Não é tão-só uma história desportiva.
Lendo o livro Sapiens, do israelita Yuval Harari, há uma passagem que, para não estragar, prefiro transcrever a parafrasear: «A teoria mais comum é a de que sendo os homens fisicamente mais fortes usaram essa vantagem para submeter as mulheres, controlando meios de produção e transferindo esse controlo para a política. Há problemas com esta teoria: primeiro, a ideia de que os homens são mais fortes é incompleta, porque as mulheres são mais resistentes à fome, à doença e à fadiga; além de que, ao longo da história, as mulheres foram tendencialmente excluídas de trabalhos que implicam escasso esforço físico, na religião, na lei, na política, enquanto se dedicavam, isso sim, também a trabalhar campos e a cuidar dos pesados afazeres da residência. Mais: não há relação entre força física e poder social e político na história da humanidade; nunca se selecionaram faraós ou papas com combates de boxe…
Há ainda uma outra teoria que dá os homens como, se não mais fortes, mais agressivos. Anos de evolução - assim o provam estudos hormonais e cognitivos - tornaram os homens mais violentos do que as mulheres, mais predispostos para a brutalidade e para as práticas de guerra. Mas, dando por garantido que o soldado comum é um homem, significa tal que quem comanda tem de sê-lo? Não. Seria como assumir que os campos de algodão cultivados por escravos negros foram propriedade de negros e não de elites brancas. Por que razão não poderiam soldados, homens, ser liderados por uma mulher?»
O que sobreveio na Supertaça europeia foi uma história que vai muito atrás, mais humana, mais evolutiva, do que aparenta. Corre bem, acalma as guerras.