Albertinho e Diogo Ribeiro, em fevereiro, no Mundial de Doha, após a conquista do primeiro ouro Fotografia FPN

Selecionador Alberto Silva conta tática de Diogo Ribeiro para um ouro que se pensava prata

Alberto Silva fala das emoções da prova de 50m mariposa

Além das qualidades naturais para a natação, ambição e grande capacidade de treino e velocidade de aprendizagem de Diogo Ribeiro, na base deste sucesso, a conquista do ouro nods 50m mariposa nos Mundiais de natação, está igualmente o trabalho de Alberto Silva e da sua equipa no CAR Jamor desde que assumiu o cargo de selecionador há três anos, após os Jogos de Tóquio e começou a trabalhar com o nadador que, entretanto, se transferira para o Benfica. 

À partida para o Catar, Alberto, treinador com maior palmarés da natação brasileira, com múltiplos medalhados em Jogos Olímpicos e Mundiais, contara a A BOLA que o objetivo da Seleção no Mundial de Doha seria chegar às finais e medalhas. Concordou que no último ano seria a primeira vez que o velocista competiria num grande evento sem contratempos de lesões, covid ou intoxicações alimentares. E que, a nível pessoal, continuava a ter a mesma paixão à ida para o seu 20.º/21.º Mundial como havia ido ao primeiro em Fukuoka-2001. 

Mantinha era os problemas se ansiedade quando os nadadores competem, «mas o controlo melhorou um pouco… Já não consigo é correr para a bancada e depois descer e ir até à zona de descontração tantas vezes e com a mesma agilidade», afirmou. Por isso, depois de toda a festa e do novo campeão ter saído do Aspire Dome cerca de três horas depois de disputado a final devido a ter de descontrair, cerimónia do pódio e controlo antidoping, perguntámos a Albertinho se, ao final do dia, estava tão cansado como o Diogo. 

«Não, depois da ansiedade e do êxtase vem a... quebra. Mas é um cansaço bom», responde com voz… cansada. Pareceu… 2.º lugar E como viveu este dia e aquela prova tão rápida? Ao que parece, também pensou que o Diogo tivesse sido 2.º classificado. «Não sei se reparou, mas quando os primeiros nadadores chegam e tocam na placa, acende-se uma, duas ou três luzes. O problema é que havia ali alguma coisa e a luz refletiu nessa plaquinha e pareciam duas luzes, de 2.º lugar. Ele também viu duas, como nós na bancada», contou Alberto Silva o porquê de Ribeiro ter levado tanto tempo a reagir à conquista. 

«Comemorámos na mesma a medalha, mas quando olhámos para o placard, ele era primeiro. Mas o Diogo continuava virado para a luz, a pensar que era 2.º. Queria ganhar esta prova achava que tinha capacidade para isso. Não é que tenha ficado triste, mas não ficou eufórico. Então, só quando se voltou é que também viu que tinha sido primeiro», diz recordando o momento. Apesar de ter tido o segundo tempo de reação à partida mais rápido (0,61s), no final o Diogo contou que a primeira parte não correu bem. 

O que é que pensa que depois fez a diferença para depois ir buscar os outros? «Primeiro esse de ter sido um dos detalhes que mais treinámos: o percurso subaquático e a transição para o nado, dito breakout. Treinou-se muito isso, não só na partida, mas também após as viragens e ele foi evoluindo e fez bastantes bons treinos. Havia-se adaptado». 

«Mas do lado esquerdo estava o Cameron McEvoy [Austrália], que é quase recordista do mundo dos 50 livres, e do outro lado, o Dylan Carter [Trindade e Tobago], também um especialista em partidas. Em camara lenta até se consegue ver que o Dylan parte de mais alto e entra mais forte na água. Sabíamos disso e o Diogo tentou corrigir a partida da eliminatória para a meia-final. Melhorou um pouco, mas ainda não era o que queríamos, por isso teve uma má chegada na meia-final, uma braçada a mais», recorda. 

«Assim, para a final, recomendámos que, independente se saísse bem ou mal, e do breakout, não queríamos que ficasse a pensar nisso. Só tinha de se focar na parte de nadar já que estava a fazê-lo mais rápido que os outros. Com a melhor natação, deslocamento na água, e que aí recuperaria o tempo, mas teria de conseguir uma boa chegada. Aquela abraçada final é que decidiria tudo, tal como em Fukuoka [onde foi prata], A última aproximação foi fantástica. Encaixou muito bem a última abraçada e foi decisivo», diz, satisfeito.

Vou deixá-lo dormir

Em Fukuoka, o próprio Diogo acabou por contar na entrevista a A BOLA, após ter sido vice-campeão do mundo aquilo mexeu um bocado com ele para os dias seguintes do campeonato. Nessa noite nem dormiu bem. Havia muita excitação, adrenalina… Desta vez preocuparam-se com isso para o resto do Mundial? «É lógico que é uma preocupação, tanto para o bem quanto para o mal», comenta rindo-se. «Se tivesse tido um resultado mau, podia ter ficado chateado e também ter uma má noite de sono, ou amanhã ainda estar com isso na cabeça. Sabemos que não vai ter uma noite tranquila de sono, mas é aqui que a competição se divide em duas partes», salienta Alberto. 

Fotografia Simone Castrovillari/ASF

«Não quero que me entenda mal, mas até agora foi um desafio pessoal. Uma diversão. Estamos em ano olímpico e sabemos que os 50 mariposa não fazem parte dos Jogos. Por isso focámo-nos nessa prova para aqui, trata-se de Mundial e quisemos aproveitar a oportunidade. Mas estamos com os olhos voltados para as distâncias que ele nadará em Paris [50 e 100 livres, 100 mariposa]», reforça. 

«Esta foi a sua primeira competição em Doha e amanhã não tem nada. Por isso não vale a pena estar a avisá-lo ou ele saber que tem de relaxar e tentar dormir. A adrenalina vai estar alta. Ele vai estar num estado de êxtase, por isso vou deixá-lo dormir até acordar naturalmente. Vai perder o pequeno-almoço e depois almoça e à tarde espero que volte à realidade para seguir em frente. Então, a partir de quarta-feira, começa uma outra competição, com foco nas provas individuais dos Jogos a estafeta de 4x100 estilos, para também aí fazer uma boa prova e tentar ajudar Portugal conseguir uma vaga [já só há 13 das 16] para Paris-2024», conclui.