Nuno Borges usou um laço preto em Wimbledon 2025. Foto Wimbledon

Gostava de ver os 'palhaços' felizes

Cada vez mais o tema da saúde mental está em cima da mesa e na boca dos atletas. Sobretudo na dor da derrota, tantas vezes solitária onde a resiliência devia merecer uma vénia. Pelo esforço tantas vezes não recompensado, conforme Tiago 'Saca' Pires alertou esta semana

Adorava que Kika Veselko, Yolanda Hopkins, Teresa Bonvalot, Frederico Morais, Afonso Antunes e todos os outros portugueses que sonham entrar no circuito mundial de surf tivessem sucesso.

Gosto de surf. Sempre gostei. Acho que a ideia romântica de correr mundo, com o ar mais descontraído, mesmo que isso não corresponda à realidade, sempre me encantou. Gosto de ficar na areia a ver a luta, quase sempre honesta, com a natureza e como lidam com os caprichos do mar. Esta semana, Tiago Pires, que aprendi a admirar pelo que fez pelo surf nacional, colocou o dedo numa das feridas quando disse que era preciso pagar «aos palhaços do circo», alertando para uma vida passada longe de casa durante meses a fio e bastante mais mal paga quando comparada com o futebol, claro.

Teresa Bonvalot

No surf, como no motogp, como no ténis, há uma solidão na viagem, na vitória, na derrota, que se dilui nas modalidades coletivas e até mesmo em algumas individuais. Mesmo quando Fernando Pimenta vai sozinho no K1, quando a judoca Patricia Sampaio pisa o tatami ou Diogo Ribeiro entra na piscina, há, por norma, uma seleção que está por perto, alguém que sofre das mesmas dores, a quem lançar um olhar a pedir conforto quando tudo corre mal, ou um sorriso de felicidade se a marca caiu ou a medalha está a caminho.

Observo, semana após semana, como Nuno Borges celebra as vitórias, engole as derrotas e não desiste de voltar na semana seguinte. Sim, eu sei que é profissional, que é a vida que escolheu, que faz parte, etc. Mas não deixo de pensar que não ganham milhões. Nem ele, que é o melhor, nem Jaime Faria ou Henrique Rocha, que correm mundo com a trouxa às costas atrás da vitória que lhes vai mudar o destino.

O piloto português de MotoGP Miguel Oliveira da equipa Pramac Racing Yamaha 2025. Copyright ©2025 Yamaha Motor Racing Srl
O piloto português de MotoGP Miguel Oliveira da equipa Pramac Racing Yamaha 2025. Copyright ©2025 Yamaha Motor Racing Srl

Vejo Miguel Oliveira, por exemplo, que tem um colega de equipa que é neste momento o seu maior adversário. Quando as luzes se apagam e os motores se desligam volta sozinho para casa.

Não quero ser mal interpretada pelos protagonistas das modalidades coletivas. Gosto da adrenalina, gosto dos golos, dos cestos espetaculares, dos remates inacreditáveis, gosto da disputa. Não gosto de lágrimas, lido mal com a tristeza. Ao longo dos anos que levo de jornalismo, deixei de gostar de clubes. Gosto das pessoas, independentemente da cor que vestem quando estão a jogar. E, às vezes, acabo de ver um jogo a torcer para que empatem. Para ninguém ficar triste

Sporting empatou na Polónia e festejou top 8 europeu. Foto Instagram de Salvador Salvador

Ainda assim, nas modalidades coletivas há sempre alguém que sofre com os sofredores, os outros companheiros de desaire, e a dor partilhada tem uma cara diferente.

Não gosto de perder, pelo contrário, mas a idade traz destas coisas e aprendemos a reconhecer quando os adversários são ou estão mais fortes.

Fala-se cada vez mais em saúde mental dos atletas. Às vezes, receio até que se comece a banalizar o tema, mas é preciso uma determinação inabalável para todas as semanas levar com um pano encharcado na cara e continuar a levantar-se.