Pelos caminhos do futebol Com alma andaluza e ambição à portuguesa: José Maria quer o Amora de volta
Pelos Caminhos do Futebol é a rubrica de A BOLA que, semanalmente, o leva até ao País profundo. Esta quarta-feira, fomos conhecer a fundo o projeto da SAD do Amora. O negócio de Geny Catamo, o regresso à Liga 3 e um novo estádio
José María Gallego Moyano, 49 anos, é um empresário espanhol nascido em Sevilha, conselheiro do Betis e, desde 2021, presidente da SAD do Amora, clube fundado em 1921 e com passagens pela I Divisão em 1980/1981, 1981/1982 e 1982/1983. A chegada de José María à liderança da SAD do clube da margem sul do Tejo aconteceu de forma natural, a partir do desejo de investir num clube português.
«A minha ideia era investir num clube em Portugal e rapidamente apareceu o Amora», começa por explicar a A BOLA, nas bancadas do Estádio da Medideira. A decisão foi tomada após conhecer melhor o clube, a cidade e o seu ambiente. «Vimos um pouco da mística do estádio, a história do clube e da cidade e percebemos que era o sítio adequado para desenvolver um projeto e, com calma, levar o Amora aos campeonatos profissionais».
Quando assumiu o cargo, o Estádio da Medideira estava longe das condições ideais. «Não se podia jogar futebol aqui», recorda. Durante a primeira temporada na Liga 3, o Amora teve de jogar toda a época como visitante. «Na altura, a Câmara estava a investir no Estádio Carla Sacramento. Foi um ano muito complicado», admite.
Questionado sobre se considera o estádio a sua grande obra, responde com cautela: «Ainda não, porque a Medideira é um estádio que precisa de muita reforma.» Explica que há um projeto diferente em mente e que a renovação não deverá passar por fundos públicos.
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«Sabemos das dificuldades para uma Câmara que também tem que investir noutras áreas importantes para a cidade. Entendemos que a Medideira deve ser renovada com um novo estádio, construído por entidade privada e não pública», esclarece. Segundo o dirigente, há já conversas com fundos de investimento: «Estamos a trabalhar nesse sentido. Já tivemos conversas com alguns fundos, no sentido de construir um novo estádio, com uma área comercial.»
Contudo, o momento não é ainda o ideal para avançar com a obra. «Tivemos algumas conversas, mas agora estamos focados na fase de subida, que é realmente importante. Queremos devolver o Amora à Liga 3, de onde nunca devia ter saído», afirma.
Ainda assim, garante que o plano será retomado em breve: «Assim que a temporada terminar, tentaremos agilizar. Não será um projeto imediato, porque há muitas questões administrativas.»
Mesmo as intervenções já feitas no estádio tiveram em conta a ambição de regressar aos campeonatos profissionais. «Essa era a ideia», admite. O clube chegou a utilizar o Estádio Municipal, partilhado com outros emblemas, com o apoio da Câmara. «Mas percebemos que os adeptos querem ver o Amora jogar na Medideira, por isso temos vindo a reabilitá-la», diz. José María Gallego reconhece que, apesar de o Carla Sacramento ser um estádio moderno, está «longe do centro da cidade». E reforça: «A nossa ideia é sempre recuperar a mística da Medideira.»
Quanto ao principal objetivo da época, é direto: «Sim, claro, é subir de divisão já este ano. Entendemos que o Amora é um clube de Liga 3 e esse é o nosso grande objetivo. Vai ser uma guerra dura, porque todos os clubes têm boas equipas e também merecem.»
Com uma visão estratégica de médio e longo prazo, José María Gallego acredita na força de um projeto bem estruturado. «O objetivo sempre foi desenvolver um projeto com calma, com um processo bem definido e uma metodologia», adianta. Sublinha, ainda, que no futebol, «quando se trabalha a longo prazo, é mais fácil». E completa: «Todos queremos ganhar ao domingo, mas quando tens um processo claro, os resultados acabam por chegar.»
Desde o início, ficou claro para o dirigente espanhol que a aposta na formação era pilar. «A ideia foi criar um projeto sustentável a longo prazo», explica. «É fundamental desenvolver talentos jovens e tornar o clube financeiramente sustentável. E a única forma de o fazer é apostar na formação, gerando valor e garantindo uma ou outra venda por ano, que acho que temos conseguido», afiança, destacando ainda o potencial da região: «A Margem Sul tem muito talento e temos que aproveitá-lo.»
Questionado sobre a desconfiança que muitos adeptos ainda mantêm em relação às SAD's, José María Gallego reconhece o sentimento: «Sim. Para nós, no início, também foi um choque — para o clube e para a SAD — perceber quais eram os objetivos comuns.»
No entanto, acredita que o tempo e a consistência de ideias ajudam a conquistar a confiança.
«Como costumo dizer, com processo e paciência conseguimos unir as pessoas. A ideia é permanecer aqui, mas no futebol nunca se sabe onde se estará amanhã.»
Fora do Amora, José María Gallego é também conselheiro do Betis e segue de perto o momento do clube. «O Betis está num bom momento, sobretudo a partir do mercado de janeiro, com a chegada de alguns jogadores. A equipa deu um salto», diz com um sorriso.
O clube continua em várias frentes e José María Gallego acredita no seu potencial: «Estamos a lutar por objetivos importantes — ainda vivos na Conference League e na liga a lutar por um lugar na Champions.»
Quanto à possibilidade de conquistar a Conference League, mostra ambição: «É uma competição bonita, mas dura. Temos o Chelsea, a Fiorentina, que vamos encontrar nas meias-finais. São ambas muito competitivas, mas, com o momento que a equipa vive, vamos tentar lutar por tudo. E por que não ganhar um título europeu?»
«Rui Silva merecia jogar num grande em Portugal»
Também comentou a saída de Rui Silva do Betis para o Sporting. «Além de ser um grande guarda-redes, é um excelente profissional e uma grande pessoa. Merecia jogar num grande clube em Portugal — e nunca o tinha feito. É um prémio para ele», garante. Apesar da perda, compreendeu a decisão: «Era o nosso titular, mas percebemos que a sua vontade era representar um grande clube português.»
Sobre a eleição de Pedro Proença como novo presidente da Federação Portuguesa de Futebol, considera tratar-se de uma mudança positiva. «É importante para o futebol português. Era troca necessária na Federação, sobretudo para clubes como o Amora», vinca.
Mostra-se, de resto, otimista quanto ao futuro da Liga 3: «Com a chegada de Pedro Proença, a competição vai crescer muito. A Liga 3 vai ter mais visibilidade e o Amora tem que estar lá.»
«Geny? Estamos condenados a entender-nos»
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Geny Catamo deu os primeiros passos em Portugal pela porta do Amora, vindo do Black Bulls de Moçambique. Em 2018, Zuneid Sidat era o administrador da SAD do Amora. O empresário moçambicano contratou vários jogadores do seu país de origem, entre eles Geny Catamo.
Depois de empréstimos a V. Guimarães e Marítimo, o ex-Amora conseguiu impor-se de verde e branco no Estádio José Alvalade. Sobre o passe de Catamo, que envolve negociações com o Sporting, José María Gallego opta pela diplomacia: «A relação com o Sporting é muito cordial, principalmente desde a chegada do Bernardo [Palmeiro, atual diretor geral do futebol do Sporting, substituto de Hugo Viana], sempre com respeito, mas não posso avançar nada.»
Admite que os interesses dos dois clubes são diferentes, mas que a solução acabará por chegar. «Estamos condenados a entender-nos, mas ainda não é o momento. Estamos focados na fase de subida e o Sporting está concentrado na Liga. Em algum momento, encontraremos uma solução», assegura.