Volta a Portugal Aquele para quem, salvo desistência, a coisa só pode mesmo melhorar

MAIS DESPORTO12.08.202317:28

Sardas, cabelo a atirar para o ‘cenoura’, bronze ‘à ciclista’ - braços, pescoço e pernas rosados, o resto quase lixívia – e um sorriso mesmo sendo o 120.º… e último da classificação geral da 84.ª edição da Volta a Portugal, à partida da 3.ª etapa, este sábado os 191,8 km entre Sines e Loulé: salvo desistência, a coisa só pode, mesmo, melhorar para o jovem alemão Jonas Beck, de 18 anos, que, como disse este domingo à partida da tirada a A BOLA, quer mesmo terminar a ‘Grandíssima’ lusa.

Natural da cidade de Emmendingen, e corredor da modesta Bike Aid, Jonas quase sufocava de calor em Sines, em tronco nu, à sombra, enquanto ao lado, no areal da praia Vasco da Gama, a festa da Volta fazia alguns calçarem os chinelos e virem ver de perto os ases do pedal. Ele e os companheiros da equipa germânica.

«Isto é calor em demasia. Sou ‘branquinho’, tenho de me besuntar de protetor solar, claro. Não me digam que querem falar comigo por ser o último?! Não acredito», atirou à equipa de reportagem de A BOLA Mas teve de se conformar.

«Nunca esperei nem queria estar nesta situação. Bem, seis já desistiram, não foi? Só pode melhorar mesmo. Não era o que eu queria, andar a meia hora do camisola amarela. Mas é a minha primeira Volta e estabeleci como objetivo terminá-la, fosse qual fosse a classificação», disse-nos, a rir às gargalhadas por também conhecer a máxima – para muitos, mera consolação insuficiente – de ‘os últimos serem sempre os primeiros’.

«Não estabeleci objetivo algum de ‘top 100’ ou ‘top 50’. Apenas ganhar experiência e concluir a prova, mas com este calor, e a verdadeira montanha ainda por chegar na segunda semana, isto promete inferno. Se acabar à frente de um deles, já dá», sorriu Jonas, apontando para os companheiros de equipa, que a seu lado riam a bandeiras despregadas pelo inusitado motivo da atenção mediática: ser o último.

Espírito olímpico sim, mas… querer mais

«Se gozam comigo ou me provocam?  [risos] Brincam um bocado. Vergonha não, de modo algum: dou tudo. Mas essa coisa do espírito olímpico, que a teria de que acabar já é uma vitória, não resume tudo. Acabar é bom, mas queria ver se não em último», diz o franzino ‘teenager’ de 1,81 m e 65 kg cujos sonhos são os próprios da idade e de um entusiasta que começou a pedalar aos oito anos sem saber que um dia iria fazer disto meio de sustento.

«Vencer um Tour, Giro ou Vuelta? Primeiro, gostava de chegar a uma equipa do escalão World Tour. Depois, claro, isso seria imenso. Basta ver a receção que o Jonas Vingegaard teve em Copenhaga após a vitória no Tour, foi espetacular. Amo ciclismo, mas vou com calma. Aqui com os meus companheiros iremos recuperar, espero», revelou-nos quem destaca um aspeto positivo que poderá passar despercebido a muitos, e que o tem levado a continuar mesmo quando as pernas já pesam toneladas: o apoio dos fãs aos mais atrasados.

«É verdade, sabes? Acho que tenho mais aplausos do que o camisola amarela [risos]. Dão-me muita força, a mim e a quem vem com muito atraso. Sabem das dificuldades que sentimos, respeitam o nosso esforço dão ânimo. Acho que é porque percebem que, depois de eu passar, já podem sair do calor e ir para casa, que acabou tudo, só vem o carro-vassoura atrás. Isso sim, em apoio e força dos adeptos, o último pede meças ao primeiro», concluiu Beck, ainda a pensar se a entrevista seria para os ‘Apanhados’. Até por ter o dorsal 66. «Sim, mais um e era 666, o número de Satanás, segundo dizem, do diabo. Pois se o camisola amarela até é um anjo [Leangel], tudo normal». Nem mais