Tudo tem uma razão...
Antes de o árbitro apitar qualquer equipa pode ganhar, é essa a beleza do futebol. Em teoria é assim, na prática nem por isso...
HÁ, no futebol, razões que a própria razão desconhece. Razões como aquela que faz com que o Trofense, um plantel avaliado em pouco mais de três milhões de euros, consiga bater o pé e fazer sofrer o Benfica, cujo conjunto de jogadores vale (embora todas as avaliações de jogadores, como se sabe, sejam sempre bastante subjetivas...) quase 100 vezes mais. Ou que uma equipa do Campeonato de Portugal como o Alverca tenha conseguido, em 2019/2020, eliminar da Taça de Portugal o Sporting. Ou o Atlético, na altura também do Campeonato de Portugal, tenha afastado da mesma prova o FC Porto em pleno Estádio do Dragão, em 2006/2007. Ou o Gondomar, então na 2.ª Divisão, eliminar o Benfica em pleno Estádio da Luz em 2002/2003. Podia continuar. Porque embora não haja - embora às vezes nos pareça que sim, naquela tentação que temos de classificar a Taça de Portugal como a prova em que os Davides abatem os Golias - muitos casos de grandes que caiam às mãos de clubes de escalões inferiores, há, ainda assim, suficientes para encher, pelo menos, uma das colunas deste espaço. O objetivo deste texto não é historiar os escândalos da Taça de Portugal, mas antes tentar percebê-los.
Costumamos dizer que os orçamentos não ganham jogos. E é verdade. Talvez essa seja, afinal, a verdadeira razão do sucesso desse jogo: antes de o árbitro apitar são, sempre, onze contra onze, uma bola e duas balizas. Independentemente de quanto vale cada indivíduo de cada equipa. Qualquer uma pode ganhar. Em teoria é assim, embora todos saibamos que, na prática, a equipa que vale mais está, sempre, mais perto de ganhar. É por isso que os adeptos do Trofense saíram de um jogo que perderam mais orgulhosos do que os do Benfica, que acabaram por ganhá-lo. Sentiram, os da Trofa, o mesmo que sentem os adeptos de um qualquer dos três grandes portugueses quando veem a sua equipa bater o pé (às vezes só empatando ou perdendo por poucos) a um adversário que compete, a nível orçamental, noutro campeonato. Porque todos sabem que, também no futebol, a teoria é uma coisa e a prática é outra.
Ora, quer isto dizer que não é, afinal, assim tão normal que um grande caia às mãos de uma equipa que lhe é (pelo menos devia ser sempre...) inferior. Tal como não se trata, apenas, de futebol quando uma equipa como o Benfica precisa de ir a prolongamento para eliminar o 14.º classificado da Liga 2. Há razões, objetivas ou subjetivas, para que isso aconteça. E embora os adeptos não tenham de se preocupar com elas, um treinador que veja acontecer à sua equipa aquilo que Jorge Jesus viu acontecer ao Benfica diante do Trofense deve, sempre, disso tirar algumas ilações. É inevitável.
A mim, sempre que vejo um grande perder, ou até empatar, em 90 minutos contra uma equipa de escalão inferior só me vêm à cabeça três razões: a) culpa dos jogadores: o adversário correu mais, o que significaria que os onze que entraram em campo em vez de olharem para o jogo como uma oportunidade de mostrarem ao treinador e aos adeptos que merecem jogar mais o encararam como um frete que apenas pretendem despachar para voltarem à sua vidinha; b) culpa do treinador: o técnico adversário encontrou forma de com um plantel muito mais fraco equilibrar, ou ser até superior; c) culpa do planeamento: o onze que se apresenta (composto normalmente por muito poucos dos habituais titulares) não ser, de facto, melhor do que o onze do adversário.
Às vezes, é verdade, pode acontecer que as três razões se conjuguem e é aí que acontecem as verdadeiras surpresas. Seja pelo que for, um jogo como aquele que o Benfica teve na Trofa não deve (não pode) ser encarado com um encolher de ombros, mesmo que ganhando. Porque qualquer uma das três razões é preocupante.