Teremos sempre Paris

OPINIÃO26.05.202217:00

Liverpool e Real Madrid lutam pela coroa máxima depois de terem perdido duelos importantes contra dois clubes-estado árabes

FALTAM três dias para a final da Champions, no Stade de France. A mãe de todas as finais. Paris há de fazer luz para um dos dois finalistas, derrotados neste último fim de semana pela força dos petrodólares árabes. O Liverpool, como se sabe, perdeu a Premier por um simples ponto (pela segunda vez em quatro anos) para o riquíssimo Manchester City, propriedade do Emirado Árabe Abu Dhabi (mais especificamente, do Abu Dhabi United Group, consórcio gerido pela família reinante). 

Já o Real Madrid ganhou La Liga mas perdeu o jogador que ia ser a cara do clube na próxima década, Kylian Mbappé, do Paris Saint-Germain, propriedade doutro riquíssimo estado árabe, o Catar. Que, segundo a imprensa francesa, contou com a cumplicidade do próprio presidente Emmanuel Macron para manter em Paris a jóia da coroa do PSG, da liga francesa e do próprio Catar, nada interessado em perder o seu jogador-bandeira a seis meses de receber o Mundial.

À medida que se vão sabendo pormenores sobre o negócio, fica mais claro que a espetacular reviravolta do affaire Mbappé (o Real Madrid e a imprensa da capital espanhola davam o assunto como encerrado há muito tempo) foi decidida a nível político numa entente que colocou a França e o Catar do mesmo lado da barricada. Conseguido o entendimento, o resto foi fácil. A inigualável capacidade financeira do estado árabe encarregou-se de assegurar a continuidade de Mbappé em Paris sem que Florentino Pérez, presidente do clube-líder da velha nobreza europeia futebolística, pudesse fazer o que quer que fosse. Que clube europeu normal, quer dizer, que se submeta às regras correntes dos negócios e das boas contas, pode oferecer um prémio de assinatura de €300 milhões?

Só dois, e não são normais. São os dois clubes-estado - Abu Dhabi-City e Catar-Paris - que vivem num mundo com regras à parte, toleradas pela UEFA e por outros reguladores importantes. 

Se a derrota do Liverpool não causou grande transtorno nos adeptos reds e até foi recebida com simpatia e compreensão pela imprensa inglesa - «Não é vergonha nenhuma perder a Premier fazendo 92 pontos e marcando 94 golos», escreveu o Daily Mail - a perda de Mbappé fez estalar o verniz tanto à imprensa alinhada com o Madrid como ao próprio presidente da Liga espanhola, Javier Tebas, que contava com a aquisição do astro francês para reanimar uma liga nitidamente em perda (nos últimos anos saíram Neymar, Ronaldo e Messi…) e cada vez mais longe da Premier. 

A final de Paris está a ser promovida por Florentino Pérez e pelo madridismo como uma maneira de mostrar a Mbappé, a França e ao Catar, que a Champions é só para alguns (para vocês não é de certeza!) e que o Madrid é o maior desses alguns onde, evidentemente, também cabe o Liverpool, outro peso-pesado da nobreza europeia. A Marca, aliás, já fez saber a Mbappé que continuando em Paris não poderá ganhar a Champions nem a Bola de Ouro - o que não é inteiramente verdade, se nos lembrarmos a quem foi atribuído o último troféu.

Entre as dores do orgulho ferido realista e as dores da perda do quádruplo pelo Liverpool, há uma final para ganhar - a tal final omnipresente nos pesadelos do PSG e do City. Espero que ganhe o Liverpool. É melhor, joga um futebol incrível e tem um treinador diferente de todos os outros. Mas se for o Real Madrid, que sirva para o grande Karim Benzema ganhar a Bola de Ouro. Bem a merece. 

De qualquer forma, teremos sempre Paris.
 

Liverpool lutou até ao fim pelo título de campeão e acabou com menos um ponto que o City 


A ONDA DA NAZARÉ 

26,21 metros era a altura do monstro marinho que poupou a vida ao desafiante alemão Sebastian Steudtner na Nazaré. Há uns tempos, fui lá com o meu filho Martim. Ficámos horas a olhar e fotografar as muralhas de água que ganham ali, na aproximação ao canhão da Nazaré, dimensões gigantescas e contornos surrealistas.  Sempre adorei a Natureza e já vi coisas belíssimas por esse Mundo, da quase impenetrável floresta tropical húmida da Ilha do Príncipe aos fabulosos fiordes da Nova Zelândia. Nem me sentiria bem se ao fim de tantos anos não pudesse escrever aqui n’ A Bola que as ondas gigantes da Nazaré são, de caras, uma das maiores atrações naturais do planeta Terra. A boa notícia é que estão tão perto de casa que é um crime não ir vê-las, medi-las, apreciá-las e estimá-las. Como tesouro nacional que são.


TEM ‘DADO’ FC PORTO  

E STAVA a arrumar papéis velhos guardados pela minha mãe e dei de caras com o primeiro artigo que escrevi para os jornais. Foi em março de 1987. Nessa altura, o Benfica era a potência indiscutida do futebol nacional. Tinha 51 títulos (dois deles internacionais), contra 33 do Sporting (um internacional) e 21 do FC Porto. 

Trinta e cinco anos depois, o Benfica tem 83 títulos (dois internacionais), contra 81 do FC Porto (sete internacionais) e 54 do Sporting (um internacional). Entre o primeiro artigo que escrevi (sobre o Liverpool, curiosamente) e a atualidade vi, como jornalista, o FC Porto ganhar 60 títulos (sete internacionais), contra 32 do Benfica e 21 do Sporting (todos domésticos). É um facto que o Benfica continua a ser o clube com mais troféus e mais adeptos e o  campeão das manchetes nos jornais e dos tempos de antena televisivos; e que o Sporting, mesmo nos períodos em que não ganha (e têm sido bastantes), continua a ser uma formidável força desportiva; quanto ao FC Porto, limita-se a ser o clube que ganha. Massivamente. Não sei quanto tempo mais escreverei nos jornais. Mas sei que por este andar o FC Porto será fatalmente em casa aquilo que já é em termos internacionais. O número 1 de Portugal.