Sonho europeu de Vieira que não é sonho

OPINIÃO16.10.201801:31

É natural que os adeptos do emblema da águia queiram marcar presença massiva no jogo da Liga dos Campeões,  na próxima semana, no estádio do Ajax, o mesmo da final da Liga Europa em 2013, perdida frente ao Chelsea (1-2),  embora a  oportunidade lhes permita, igualmente, recordarem  o mais dourado acontecimento que o Benfica viveu, quando, a 2 de maio de 1962, também em Amesterdão, na final da Taça dos Campeões Europeus,  derrotou o poderoso Real Madrid, por expressivo e inimaginável 5-3.


No ano anterior, em Berna, vencera, igualmente na final, o não menos temido Barcelona, tendo erguido pela primeira vez o tão valioso troféu e com essa proeza  mostrado ao mundo a magia e a qualidade do jogador português. Mas foi na cidade holandesa que se virou uma página da história do futebol europeu, com a queda do venerado  Real Madrid, de Di Stéfano, Puskas, Gento, Santamaria, Del Sol e outros: vencedor da Taça dos Campeões cinco vezes seguidas, entre 56 e 60, viu o seu  incrível ciclo travado pelo humilde Benfica.


 Há 56 anos (Costa Pereira; Mário João, Cavém , Germano, Ângelo Martins, Fernando Cruz, Coluna, José Augusto, Eusébio, Águas e Simões), inequivocamente, o Benfica colocou ponto na final na hegemonia espanhola  e ele próprio se transformou na mais importante referência europeia durante  toda a década de 60, como  atestam as presenças na finais de 63 (Milan, 1-2), de 65 (Inter, 0-1) e de 68 (Manchester United, 1-1 e 1-4 no prolongamento).


A notoriedade encarnada criou raízes e resistiu até 1990, quando pela última vez participou numa final dos Campeões Europeus (Milan, 0-1, em Viena), a seguir à de 88, com o PSV (0-0, decidido por penáltis 5-6, em Estugarda), o que, além de traduzir o ressurgimento do Benfica europeu trinta anos depois da primeira conquista, dá alento à ambição de Luís Filipe Vieira de recolocar o clube no patamar de excelência que ocupou e que a sua grandeza lhe impõe. Mais do que um sonho, como lhe chamam, é um objetivo desportivo alcançável, sendo certo que, a repetir-se o intervalo temporal, está na hora de a águia voltar a voar pelos céus da Europa.  


Os adeptos querem muito, o presidente  mais ainda e por diversas vezes tem abordado o tema através de mensagens para dentro, e para fora, absolutamente convencido de que é possível chegar lá acima, e Domingos Soares Oliveira, administrador,  por estes dias, abriu a porta a todos os entusiasmos, em Londres, numa cimeira Sport Business, ao declarar que estão identificados os princípios e os fundamentos do clube que irão orientar a estratégia global durante a década vindoura. Prova de que o trabalho de casa está feito, sendo altura, por isso, de passar da teoria à prática, tanto mais que a decisão superiormente tomada,  antecipando os desafios do futuro,  vai ter consequências na vida da instituição, inclusive no futebol profissional, ao nível de «estilo de jogo, tipo de equipas e de jogadores».


A estrutura existe, enfrenta as dificuldades e encara o presente com a confiança de quem tem a perfeita noção de que o caminho escolhido vai permitir ao Benfica recuperar tempo desperdiçado, por motivos sobejamente conhecidos, e reclamar o lugar que lhe pertence na elite do futebol internacional.


Neste sentido, o treinador tem de fazer parte da solução e em circunstância alguma ser um problema.  Não é minha intenção sugerir sequer que Rui Vitória o seja, mas convém que nenhuma dúvida fique por esclarecer, tanto mais que não são assim tão poucos os pontos de interrogação que se vislumbram entre o universo benfiquista sobre o seu desempenho,  e só não os vê quem não quiser ver.


Vieira tem defendido Vitória em todas as situações, sobretudo nas de maior tensão. Na  sua mais recente intervenção,  elogiou-lhe a audácia e a coragem no lançamento de jovens praticantes.  Mas um treinador tem de ser mais do que isso, de aí a dúvida suscitada por Domingos Soares Oliveira na capital inglesa. Admitindo-se alguma dissonância  na divulgação da mensagem, afirmou ele que o facto de Rui Vitória ter sido  contratado numa perspetiva de longo prazo não inibe que se questione se o Benfica tem «o treinador certo».


Excelente questão para a qual não tenho resposta, apenas uma opinião e mesmo essa de fraco valor porque  não frequento a academia do Seixal, não vejo os treinos,  nem tenho acesso ao balneário, obviamente.


Parece-me, no entanto,  que os adeptos veem nele mais uma boa pessoa do que um bom treinador. Não é pecado, mas creio que o  Benfica precisa mesmo é de uma personalidade que empolgue, que aglutine, que lidere. Como a do  treinador que, em reunião  na UEFA, faz poucos anos,  aplaudiu o papel de Vieira e mandou  dizer-lhe que  com  aquele  plantel  jogaria  para ser campeão europeu.  
Creio que é alguém com esta forte determinação que faz falta. Para abanar, fazer acreditar e, talvez,  ganhar. Porque não é sonho. É real.