Ivan Caçador e Eurico Nicolau têm um percurso de mais de 25 anos juntos. Foto FAP

O último apito

Eurico Nicolau e Ivan Caçador colocam amanhã um ponto final na carreira de 25 anos dedicada à arbitragem e escolheram para a despedida o mesmo palco onde começaram, na Marinha Grande. Podiam tê-lo feito no França-Noruega de há poucos dias, mas preferiram o SIR 1.º de Maio

Quando cheguei ao jornal A BOLA tive muita sorte quando o José Lopes decidiu escolher-me para começar a acompanhá-lo aos jogos de andebol. Pacientemente — às vezes ainda sorrio a pensar na quantidade de perguntas com que o bombardeava — explicou-me tudo o que havia para saber, apresentou-me todas as pessoas e ensinou-me como ser forte nas convicções, como não desistir até conseguir a entrevista, a notícia, a reportagem em que acreditamos.

Tive sorte também porque o olhar do José Lopes de jornalista se juntou ao olhar de antigo árbitro. Acho que, por isso, sempre gostei dos árbitros, sempre achei que eram parte importante do espetáculo desportivo, seja qual for a modalidade, e nunca percebi, racionalmente claro, a razão pela qual recolhem tantas vezes a fúria de adeptos, treinadores, jogadores que falharam o penálti, erraram a tática, fizeram mal a substituição. Gosto de pensar que são fortes e, por isso, podem carregar todas as desgraças alheias. Erram? Claro! Muitas vezes. Tal como o jogador que falha o livre de sete metros, o guarda-redes que permite um golo no pior momento, o treinador que erra a substituição.

Por causa do José Lopes, acho, sempre tive boa relação com os árbitros de andebol, neste caso. Mais com uns do que com outros, naturalmente, mas sempre boa de uma forma geral. Recordo a primeira vez que fiz uma reportagem com Goulão e Macau, de quem guardo até hoje o maior carinho pela forma como me trataram.

Quando conheci o Eurico Nicolau e o Ivan Caçador não eram ainda a dupla de referência que se tornariam na modalidade. Vi-os crescer profissionalmente, tornarem-se apreciados dentro e fora de portas e ouvi até algumas vezes treinadores e jogadores questionarem porque razão não eram eles os nomeados para os seus jogos. Acho que isto diz muito sobre a sua qualidade, a sua sobriedade e a sua forma de estar na arbitragem e na vida.

Assisti a dezenas de jogos apitados pelos miúdos da Marinha Grande. Não me lembro de terem sido desagradáveis ou mal encarados.

Tive a sorte, mais uma vez, de acompanhar a sua participação em fases finais de grande eventos nacionais e internacionais e ter oportunidade de partilhar com o Eurico e o Ivan momentos de alegria e outros que nem por isso. Salónica foi um marco na nossa relação, que guardarei para sempre como amizade. Fiz várias entrevistas e reportagens com ambos. Nunca se negaram a falar, salvo situações em que não estavam autorizados. E, mesmo nos momentos piores, que também os houve, foram sempre corretos e simpáticos. Este fim de semana vão colocar um ponto final na carreira.

Podiam tê-lo feito no jogo França-Noruega que marcou a sua despedida internacional, há dias. Escolheram fazê-lo no SIR 1.º de Maio, na Marinha Grande.

O que continua a dizer muito sobre ambos. Obrigada, Eurico e Ivan.