O que ensinou a novela Costa/Vieira
O que mudou em Portugal nos últimos quatro anos? Em 2016, o primeiro-ministro António Costa integrou a Comissão de Honra da candidatura de Luís Filipe Vieira à presidência do Benfica e não se ouviu qualquer rumor de crítica. Em 2020, Costa fez o mesmo e caiu o Carmo e a Trindade, a ponto de Vieira ver-se constrangido a prescindir do apoio do chefe do Governo (a história é mais complexa...).
Duas teses, entre aqueles que defenderam em 2020 que era intolerável que Costa apoiasse Vieira, ganharam espaço, uma e outra com narrativas diferentes.
Uma, popularizada entre os talibãs do anti-futebol, advogava, pura e simplesmente, que não era aceitável que houvesse misturas entre uma sociedade bacteriologicamente pura e o mundo de pecado e promiscuidade do futebol. Embora toda a grande corrupção do país estivesse fundada na política e na banca (trata-se de uma constatação baseada em factos) era no microcosmos do futebol que Belzebu tinha os seus agentes e interagir com eles era pior que vender a alma ao Diabo.
Outra, mais elaborada, fulanizava a questão e dizia que o problema estava na alteração de circunstâncias: até 2016, Luís Filipe Vieira era socialmente aceitável, mas de então até hoje, tinha passado a ativo tóxico a evitar.
A primeira, por básica, não merece muita atenção, porque se baseia em inveja e preconceito.
Já a segunda é mais aceitável, embora esteja ferida de um erro na formulação, que passa pela desconsideração da presunção de inocência. Embora casos como os do ex-ministro Miguel Macedo ou do ex-diretor do SEF, Manuel Jarmela Palos, vilipendiados na opinião publicada e absolvidos, «sem dúvidas» pelo Tribunal, devessem colocar alguma decência nos justicialistas...
O tempo da Justiça fará o seu caminho e, no fim do processo, haverá que respeitar a sentença. Até lá, contudo, o futebol precisa de aprender com os erros que cometeu e que, de facto, estão na base da péssima imagem que hoje em dia tem.
Não faz sentido que os clubes funcionem como centrais de ódio, que mais não servem do que para lançar portugueses contra portugueses. Se não perceberem isso, se não arrepiarem caminho, então terão apenas aquilo que fizeram por ter: o desprezo da sociedade.