O pior cego

OPINIÃO22.01.202103:00

Como o que estamos a viver deve também envergonhar-nos

E SPERO, com toda a franqueza, que já todos sejamos capazes de compreender, de uma vez por todas, como temos andado, muitos de nós, individualmente, a brincar com a responsabilidade coletiva e a evidenciar, em muitos casos, a lamentável indiferença, e até a absurda e incompreensível negação, sobre uma pandemia que em Portugal se transformou nas últimas semanas numa tragédia descontrolada, enquanto ia ganhando adeptos a ilusão de que o ano novo nos traria vida positivamente nova.
Afinal, por responsabilidade política, também, sim, mas sobretudo por responsabilidade de todos, abateu-se de novo, e agora de forma cada vez mais cruel e dramática, o surpreendente pesadelo de assistirmos, diariamente, à destruição psicológica e física de profissionais de saúde e vítimas da Covid-19, como se, desculpem a comparação, estivéssemos a ver cair tragicamente em Portugal um avião todos os dias.
É por isso que não posso, confesso-vos, deixar o desabafo numa gaveta e silenciar a minha dificuldade em compreender como se demorou tanto a tomar a decisão política de encerrar a escola por duas, três ou quatro semanas que sejam, quando parecia cada vez mais evidente que, no atual contexto severo e trágico, a comunidade jovem tinha tudo para potencialmente poder continuar a transformar-se num perigoso e crescente foco de contágio, por culpa acrescida ainda da designada nova variante do vírus que provoca esta maldita doença da Covid-19 (traduzido do inglês, doença por coronavírus).
Não sou, evidentemente, especialista na matéria. Mas sou pai. E sinto como é igualmente difícil, creio, aceitar o argumento político que defende (e ouvimos vários responsáveis políticos defendê-lo) que o fecho da escola (e estamos a falar de fechar a escola pelo tempo máximo provável de um mês, imagine-se) compromete o futuro destas novas gerações. Como se o futuro destas novas gerações não esteja tanto mais gravemente comprometido quanto mais tempo durar este tremendo e difícil combate contra uma pandemia absolutamente devastadora, sob todos os pontos de vista da vida dos nossos tempos.  
Apetece-me, com toda a franqueza, perguntar aos responsáveis políticos se não compromete, seguramente, muito mais o futuro destas novas gerações ver tantos e tantos jovens a perder, em muitos casos, os avós, e nalguns outros casos os próprios pais, a perder o tempo de convívio normal e saudável, a perder abraços, a perder o  indispensável contacto físico, a perder relações, experiências, vivências e amor, a perder diversão e partilha, a deixar de cantar, contar, ler, correr, saltar e passear em grupo? Não será a ausência de tudo isso, a ausência de muito desse essencial ao crescimento, tão mais difícil de reverter e recuperar do que a paragem, seja por quinze dias ou por um mês, das atividades escolares, naturalmente fundamentais e obviamente desejáveis que ocorram com a presença dos jovens nas escolas?
Mas não será a presença dos jovens nas escolas seguramente o sonho e a vontade de todos os pais?
Porque têm então os responsáveis políticos, no uso dos seus discursos de retórica, de falar como se o desejo de ver encerrada a escola fosse um capricho de pais, de diferentes especialistas de saúde pública ou, simplesmente, de muitos dos profissionais da área médica, exaustos por há muito terem superado os seus próprios limites físicos e emocionais, frustrados pelos incompreendidos apelos e relatos do drama ou pela ausência de resposta aos sucessivos pedidos de  socorro. A plateia chega a parecer estupidamente surda e absurdamente cega.
Devemos acreditar que o esforço e sacrifício de encerrar a escola contribuirá decisivamente para atenuar o sofrimento dos que verdadeiramente sofrem. Mas o que estamos a viver, não deve apenas entristecer-nos. Deve também, não se esqueçam disso, envergonhar-nos!

N EM mesmo num momento tão difícil como aquele que vivemos, o futebol português se livra das controvérsias inexplicáveis, das polémicas confrangedoras ou de acusações incompreensíveis e inaceitáveis de quem vive, cegamente, a pensar apenas na cega ambição de vencer.
Assim foi, de novo, com o triste episódio envolvendo os testes de Covid-19 aos jogadores do Sporting, Nuno Mendes e Sporar.
Num assunto que deveria merecer de todos um profundo sentido de responsabilidade, foram lamentáveis as posições de FC Porto e da Liga, lamentável o aproveitamento público do tema que o Sporting começou por fazer, e mais lamentável ainda que a empresa responsável pela realização dos testes a todo o futebol profissional português se tenha dado ao luxo, segundo a própria Direção-Geral da Saúde, de não dar dado em tempo útil resposta à entidade, que regula, gere e coordena a saúde pública do país, impedindo assim, como parece, que Nuno Mendes e Sporar pudessem defrontar, na última terça-feira, o FC Porto, na meia-final da Taça da Liga que o leão acabou por vencer. Se não tivesse vencido, não teria o fogo muito mais lenha por onde arder?
Exige-nos a responsabilidade enquanto jornalistas que recusemos dar ouvidos a qualquer das teorias de conspiração que depressa se acumulam nesse incontrolável mundo das redes sociais, sejam elas contra os clubes em causa ou contra o laboratório contratualmente responsável pelo compromisso assumido com a Liga pela realização, com toda a transparência, dos referidos testes a todos os profissionais que conhecem, desde o início, os riscos que correm neste tempo de pandemia.
Mas mesmo sem culpados, há, em todo o caso, uma vítima, que é o Sporting. E pela vítima deve, em primeiro lugar, responder a Liga.
Já quem privou os adeptos de qualquer resposta foi, incompreensivelmente, Rúben Amorim, depois de ver a sua equipa bater o campeão nacional em Leiria. Não pareceu um protesto; pareceu uma birra!