O Mundial da jangada de pedra

OPINIÃO05.06.202107:05

O Mundial de futebol ibérico apresenta-se como uma candidatura forte e que faz todo o sentido político, social, cultural e histórico

A candidatura ibérica ao Campeonato do Mundo de Futebol de 2030 faz todo o sentido. E faz mais sentido ainda para Portugal, porque é a oportunidade plausível para um país pequeno e periférico como o nosso poder ter, no seu país, e para deleite de um povo que adora futebol, a mais importante prova universal da modalidade.
Assim que se conheceu a pretensão de uma candidatura ao Mundial, emergiram as habituais vozes da cultura envergonhada que, sorumbática e invejosa, condenam o futebol de todos os males deste e de qualquer outro mundo. Recuaram, por isso, os tradicionais iluminados, ao argumento velho e estafado, feito da mentira mil vezes repetida de que o Euro-2004 tinha sido a razão principal do início do descalabro económico do país e que, anos depois, todos os portugueses tiveram de pagar essa dívida e com juros. Não é verdade, está mais do que provado por economistas credíveis e independentes que o Euro-2004 nos trouxe um saldo francamente positivo entre benefícios e prejuízos. Foi em 2004 que Portugal conheceu o início do seu enorme crescimento turístico, foi depois da organização do Euro que o país consolidou a imagem de um Portugal europeu e moderno que tinha começado a construir com o sucesso internacionalmente reconhecido da Exposição Internacional de Lisboa, em 1998, e que nos trouxe, enfim, uma visão diferenciada do habitual miserabilismo que olha para qualquer investimento essencial como uma despesa desnecessária por quem preferia manter o país encerrado em seculares torres de granito.  
Penso, aliás, que Portugal poderá vir a aproveitar a experiência da candidatura ibérica ao Mundial de futebol para uma eventual candidatura olímpica. A organização dos Jogos Olímpicos, a maior manifestação social e cultural, também evidentemente política, que o homem construiu e desenvolveu, tem, hoje, uma grandeza de custos insuportável para qualquer cidade, mesmo para aquelas que têm a dimensão das grandes metrópoles, como acontecerá, este ano, com Tóquio. Daí que ganhe força e consistência, no próprio Comité Olímpico Internacional, a ideia de se proporem candidaturas conjuntas e, por isso, seria particularmente interessante analisar a possibilidade de uma união de interesses entre Lisboa e Madrid, ou entre o Porto e Barcelona.
Para já, a candidatura ibérica ao Mundial de futebol, apresentada pelos respetivos presidentes das federações, Fernando Gomes e Luis Rubiales, e politicamente avalizadas pelas presenças do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa, do rei Filipe VI e dos primeiros-ministros António Costa e Pedro Sanchez, mostra-se como uma candidatura forte, credível e com claras condições de vencer.
Seria, além de uma celebração da cultura ibérica e da paixão popular pelo futebol, uma homenagem ao nosso Prémio Nobel da Literatura, José Saramago, o escritor de dimensão universal que se dividiu, durante toda a sua vida, entre os seus amores a Portugal e a Espanha, algo que, aliás, também foi comum a Camilo José Cella, Nobel espanhol, nascido em Tuy, amante de futebol e grande amigo de Portugal. Ver o esplendor de um Mundial de futebol nessa Jangada de Pedra que Saramago imaginou, seria algo de verdadeiramente inesquecível para o povo ibérico.
A decisão final só acontecerá em 2024 e ainda não se conhece toda a concorrência, que se prevê forte, sobretudo se os britânicos avançarem com uma candidatura conjunta. Seja como for, o futebol português volta a dar um exemplo ao país, ao pensar mais no futuro do que no passado e no presente. Ao ter uma ideia clara, firme e coerente sobre o caminho a percorrer.


RUI JORGE E A ÉTICA DE UM LÍDER

Rui Jorge está há cerca de uma década a trabalhar nas seleções nacionais de futebol e acaba de renovar o seu contrato. Tem feito um trabalho competente, com excelentes resultados desportivos e, sobretudo, com uma notável coerência técnica, no sentido da execução de um plano de evolução e crescimento do futebolista português, preparando-o mais para o futuro do que exigindo-lhe o máximo resultado no presente. Além disto, que já não seria pouco, é um exemplo notável de ética profissional de um verdadeiro líder.


MOEDAS E A ÉTICA DE UM LÍDER

Carlos Moedas é candidato à Câmara de Lisboa e percebe-se que a um candidato compete tentar evidenciar os defeitos dos concorrentes, principalmente quando o mais forte é o presidente atual. Há, no entanto, uma ética a preservar, sobretudo numa figura pública que já tem uma história de serviço público ao país. E, por isso, ninguém será capaz de entender que o mesmo homem que critica Medina por não consentir as festas dos Santos Populares o acuse de ter contribuído para o aumento dos níveis de transmissibilidade em Lisboa.