O calcanhar de Vitória
Da desilusão para a euforia em quatro dias. Na quarta-feira, perante um Bayern sério mas sem pisar a fundo no acelerador, o Benfica somou a oitava derrota consecutiva na Champions, um registo pavoroso que deve ter feito Eusébio, Mário Coluna e Béla Guttmann darem mais três voltas na tumba. No final do jogo Rui Vitória disse, naquele seu jeito peculiar de comentar derrotas sem lhes atribuir qualquer significado que possa ser-lhe imputado, que o Benfica tinha feito tantos remates como o adversário e deu a entender que a equipa tinha jogado de olhos nos olhos com o poderoso rival. Os adeptos não deixaram de aplaudir a equipa mas muitos deles voltaram para casa com a desagradável sensação déjà vu. O Benfica prometera fazer a vida negra aos alemães mas não fez - muito longe disso, ficou-se pela rama. Moro perto do estádio da Luz e ouvi um adepto, meu amigo (jornalista, por sinal), desabafar nessa noite: «[nós] com os pequenos é sempre a aviar. Já com os grandes é sempre a mesma história (não foi bem esta palavra que usou): jogamos com mentalidade de pequeno.»
No domingo, despachado o Desportivo das Aves perante 53.606 adeptos deliciados com o talento e a irreverência de João Félix e a categoria do médio brasileiro Gabriel (nunca me cansarei de elogiar a extraordinária capacidade de mobilização benfiquista, que bonito ver aquele estádio quase sempre cheio), Rui Vitória falou de «exibição categórica» e enviou um recado paternal ao miúdo Félix: «(…) vai ter de continuar a trabalhar para ganhar o seu espaço. O futebol leva para cima mas também leva para baixo.» Engraçado como esta última frase resume o comportamento padrão do Benfica na «era Vitória»: tendencialmente forte com os fracos, tendencialmente fraco com os fortes. Não, não é uma opinião: são factos (vejam o quadro em anexo…). Eu até diria mais: é o calcanhar de Aquiles de Rui Vitória. Uma tendência de «encolha», de «ficar aquém», de não se conseguir impor nos jogos de grande responsabilidade. Um padrão comportamental que o treinador ainda não consegui erradicar ao fim de três épocas na Luz (já vamos na quarta) e que, para não ir mais longe, impediu o Benfica de assegurar um histórico penta no jogo do título da última época, em casa, com o FC Porto.
Gosto de muitas coisas em Rui Vitória e no trabalho de Rui Vitória (a pinta com que ele lança os miúdos!...). Mas como é que se pode definir um treinador que, estando num grande, faz quase sempre figura de pequeno nos jogos com os da sua igualha? É verdade que os campeonatos também se ganham nos jogos com os minorcas, mas não é nesses jogos que se afere a dimensão de quem lidera um grande - é nos outros. Os de dificuldade elevada. E são precisamente dois dessa categoria que Rui Vitória tem pela frente nos próximos dias: o jogo com o AEK em Atenas (2 de outubro) é fundamental para o futuro do Benfica na Champions: necessidade imperiosa de (no mínimo) pontuar, sendo absolutamente PROIBIDO somar 9.ª derrota seguida na prova. Logo seguido do duelo na Luz com o FC Porto (7 de outubro), o clássico que Rui Vitória ainda não conseguiu ganhar e que tantas mágoas e desilusões tem causado à nação benfiquista. Será desta?