Narciso e avesso
Houve tempo em que vendo Rui Vitória fustigado por remoques e comentários de gente do seu próprio clube - o achei vítima de uma das mais poéticas criações de Nélson Rodrigues: dos Narcisos às avessas a cuspirem na própria imagem. Por tudo o que aconteceu com o Belenenses e sobretudo com o Moreirense (o que aconteceu com o Ajax só foi o que foi porque primeiro o Benfica não teve sorte e depois ainda teve azar) - começo a não estar tão certo de ser tremendamente injusto o que se foi soltando dos lenços brancos a tremularem nas bancadas (ou dos maus remoques e comentários enfarinhados).
E acho-o porque o que vi nesses jogos (ainda assim, num mais do que noutro) foi uma equipa insípida - com os seus jogadores a mostrarem-se piores do que são (e não apenas no seu caráter). Foi uma equipa atormentada - com os seus jogadores a jogarem com a cabeça a fugir-lhes dos pés a entortarem-se ou a encolherem-se (e não apenas nos remates à baliza). Foi uma equipa atarantada - com os seus jogadores a jogarem como malabaristas bêbados a caírem do trapézio (e não apenas com a bola em vertigens.) Quando isso acontece - a culpa é do treinador? Não sendo só, é. É culpa do treinador que não consegue pôr nos pés dos seus jogadores a cabeça levantada que os leve a ver que o inferno não está no céu que se escurece a seus olhos. É culpa do treinador que não consegue tirar dos seus jogadores os dias abalados em que a realidade lhes atropela a vontade e a esperteza, deixando-os (e à equipa) estendidos no chão que se lhes escapa.
Ou seja, se contra o Belenenses e sobretudo contra o Moreirense, Rui Vitória foi um treinador incapaz de mexer bem na equipa (mexendo, assim, melhor no jogo e no seu destino) - parece-me que já só tem uma hipótese de resgate: voltar ao melhor de si, dentro de si. Não sei, porém, se lhe chegará porque pode ter um outro problema a abalá-lo: o melhor Sérgio Conceição não sair de dentro do Sérgio Conceição - e ainda menos dos pés e da cabeça dos jogadores do FC Porto.