Nação prudente e mortal
Portugal eliminado pelas ‘mexidas’ de Luis Enrique, que tomou conta do jogo na meia hora final. Ficámo-nos pelo quase, mais uma vez
FOI pena, mas nada que não estivesse escrito no filme idealizado por Luis Enrique com as substituições operadas ao minuto 60 (entradas de Gabi, Pedri e Pino) e reforçado com o lançamento ao minuto 73 da flecha Nico Williams, o homem que atarantou a defesa portuguesa e esteve na origem do golpe de misericórdia espanhol, assinado aos 88’ pelo até aí tristonho Álvaro Morata. Tal como sucedeu anteriormente nas derrotas caseiras com França (0-1) e Sérvia (1-2), Portugal só precisava de um empate para garantir a qualificação, mas terminou acossado pelo adversário e com toda a gente a ver - nas bancadas e pela televisão - o que ia fatalmente acontecer.
É fácil dizer, depois de conhecido o resultado, que Luis Enrique percebeu melhor (e muito mais depressa) do que Fernando Santos o que o jogo estava a pedir. Como fácil será concluir que a entrada de João Mário (73’) foi um ato completamente falhado e que a entrada de Matheus Nunes, muito provavelmente, teria feito muito mais sentido. Como será fácil dizer que Cristiano Ronaldo, sem a velocidade, rapidez de reflexos de outrora, e presentemente esquinado (de que maneira!) com a baliza contrária, deveria ter sido substituído quando era preciso alguém com velocidade e fôlego, capaz de impedir o avanço em bloco dos defesas espanhóis.
Cristiano andou com a Seleção ao colo nos últimos 15 anos, mas Fernando Santos não está a conseguir protegê-lo com esta absurda insistência na titularidade a tempo inteiro, quando até os maiores fãs de CR7 conseguem ver que ele está fisicamente mal (como era expectável depois de não ter feito a pré-época) e claramente falho de confiança. Ronaldo está a falhar oportunidades que em condições normais nunca perdoaria e é no mínimo estranho que Santos teime em não ver isso.
Entre os dez minutos iniciais frouxos e os vinte minutos finais de domínio absoluto da Fúria, Portugal competiu com a bravura que o dérbi exigia, teve o jogo controlado e criou e desperdiçou as melhores oportunidades de golo. Valeu à Espanha a categoria e inspiração de Unai Simón. Mesmo nos quinze minutos iniciais da segunda parte, a Espanha pareceu sempre menos atrevida, menos em jogo que a equipa nacional que, apesar de prudente, apesar de nunca ter traído o seu perfil de equipa reativa (e não pró-ativa), podia de facto ter marcado primeiro. Mas quando chegou a altura de mexer no jogo, é um facto que Luis Enrique foi muito mais lúcido e pragmático que o nosso engenheiro. As substituições dele mudaram completamente a fisionomia do jogo a favor da Espanha. A partir daí, Fernando Santos não teve resposta e quando reagiu, foi tarde e a más horas. Pena não ter conseguido antecipar o que vinha aí… e não pode dizer que não estava avisado. A França e a Sérvia não nos deixam mentir.
Desilusão dos jogadores da Seleção Nacional no final do jogo com a Espanha, derrota portuguesa por 0-1
ESPANHA É A QUE FALHA MENOS
Com o triunfo em Braga, a Espanha tornou-se ontem a seleção europeia com mais presenças em fases finais no séc. XXI (16) e menos qualificações falhadas (apenas uma, a da final four da Liga das Nações de 2019, ganha por Portugal). É um registo muito relevante, que atesta a enorme consistência competitiva da Roja neste segundo milénio. Muito por força da fabulosa tripla conquista de 2008 (Europeu, com Luis Aragonès), 2010 (Mundial, Vicente del Bosque) e 2012 (Europeu, Vicente del Bosque), a Espanha tornou-se desde então uma das seleções mundiais mais temidas e respeitadas. Por muito que nos custe, a vitória de ontem na Pedreira foi apenas mais uma na longa e invejável lista do vizinho ibérico. Desta feita com Luis Enrique ao leme. A França tem 15 presenças em fases finais (duas qualificações falhadas), mais uma que o trio formado por Portugal (dois falhanços), Alemanha (três) e Itália (três), todos com 14. Lembro que Portugal continua a ser uma das quatro (em 52) seleções europeias totalistas nas provas mais importantes (Campeonatos do Mundo e da Europa, seis participações em cada uma) desde a viragem do milénio. Um registo que nos coloca à frente de potências como a Itália (já dois Mundiais falhados!) e a Inglaterra (ausente no Europeu de 2008 e em duas Ligas das Nações). A derrota com a Roja representa para Portugal o segundo falhanço em seis apuramentos conduzidos por Fernando Santos. O anterior aconteceu perante a campeã mundial França, que venceu na Luz por 1-0 o jogo que definia um lugar na final four de 2021. Ontem foi um filme idêntico. Esfumada a final four de 2023, segue-se o Catar, onde o engenheiro comandará Portugal pela sexta vez numa fase final, depois do Europeu de 2016 (vitória), Taça das Confederações de 2017 (3.º lugar), Mundial de 2018 (oitavos de final), Liga das Nações de 2019 (vitória) e Europeu de 2020 (oitavos de final). Para Cristiano Ronaldo, o futebolista europeu com mais presenças em fases finais (doze), a Liga das Nações de 2023 deixou de constar no mapa de objetivos, ele que há dias manifestou o desejo de ir ao Europeu de 2024. Ronaldo tem no currículo cinco Europeus, quatro Mundiais, uma Taça das Confederações, uma Liga das Nações e um Torneio Olímpico, tendo apontado golos em todas essas competições, um recorde dificilmente superável.