Mais Portugal nas ‘big five’

OPINIÃO29.06.202206:30

Portugal passa a ser o único país com treinadores em três das cinco principais ligas europeias

P AULO FONSECA, 49 anos, estava ontem em Lille para fechar contrato com o clube local, onde jogam vários portugueses. É uma boa notícia para Fonseca, que estava parado desde que foi substituído por José Mourinho na Roma, e mais uma achega à boa reputação dos treinadores portugueses no contexto europeu. A confirmar-se a contratação de Fonseca, Portugal passa a ser o país com mais treinadores (4) no conjunto das cinco principais ligas europeias (as big five) e o único representado em três ligas: Inglaterra (Bruno Lage e Marco Silva), Itália (José Mourinho) e agora França. É um facto que nenhum deles treina equipas com aspirações elevadas - mesmo Mourinho não pode dizer que vai lutar pelo scudetto italiano -  mas por alguma razão os treinadores produzidos pelo nosso país continuam a ter boa imagem e a serem requisitados nos quatro cantos do planeta. Vejam o caso do desconhecido (em termos internacionais) Ricardo Soares que, por ter levado o Gil Vicente ao quinto lugar da liga portuguesa a jogar bom futebol, acaba de ser contratado pelo colosso egípcio Al Ahly, um dos clubes mais titulados do Mundo (onde Manuel José se elevou à categoria de faraó e máximo conquistador africano).
O regresso à atividade de Paulo Fonseca numa big five, sendo ele um treinador com provas dadas no exigente futebol italiano (há um ano conduziu a Roma às meias-finais da Liga Europa…), é uma notícia tão normal como a onda de entusiasmo que Jorge Jesus está a provocar nas páginas desportivas da Imprensa turca. A linguagem corporal e a energia aparentemente inesgotável do sessentão (quem diria..?) JJ nas sessões de treino do Fenerbahçe têm cativado os jornalistas turcos a ponto de lhe dedicarem títulos laudatórios como: «Jesus faz a diferença com a sua energia»; «Sensual e entusiasta».
A aura dos portugueses é global. Apesar de uns quantos reveses (Paulo Sousa, Jesualdo Ferreira, Sá Pinto, Paulo Bento, Augusto Inácio...), o futebol brasileiro neste momento vive um clima de confiança/admiração pelo trabalho dos nossos técnicos, muito por força do incrível sucesso de Jesus no ano e meio que treinou o poderoso Flamengo, e pelo não menos extraordinário sucesso de Abel Ferreira, que transformou o bem menos apetrechado Palmeiras na melhor equipa sul-americana - tem duas Libertadores no bolso e vai a caminho de uma terceira.
Quem acompanha o campeonato português sabe que Sérgio Conceição e Rúben Amorim, por aquilo que têm mostrado, são treinadores destinados a uma liga de topo (no caso de Sérgio será um regresso, pois ele treinava, e bem, o francês Nantes antes de ser seduzido pelo FC Porto). Creio que a saída deles é apenas uma questão de tempo e do tamanho da ambição de cada um - que parece elevada, em qualquer dos casos. Assim como não tenho grandes dúvidas de que Nuno Espírito Santo (parado desde que foi despedido pelo Tottenham) continuará o seu percurso numa equipa big five - não pela ligação privilegiada com Jorge Mendes (também ajuda, claro), mas pela qualidade do seu trabalho em Wolverhampton. E que o discreto e muito competente Pedro Martins não ficará toda a vida confinado ao grego gigantismo do Olympiakos. A única estranheza, se assim se pode dizer, é a situação de Leonardo Jardim e André Villas-Boas, dois treinadores portugueses com forte impacto europeu na última década. AVB ganhou uma Liga Europa com o FC Porto de forma imperial e (parte de) uma Champions com o Chelsea, além de ter vivido etapas muito interessantes na Rússia (foi campeão com o Zenit), na China (foi vice-campeão com o Shangai SIPG) e em França (foi vice campeão com o Marselha). Putativo candidato à presidência do FC Porto, Villas-Boas neste momento parece olhar para o futebol mais como um hobby. Jardim derrotou o imbatível PSG em 2017, ano em que chegou às meias-finais da Champions, e deu 500 milhões a ganhar ao Mónaco em transferências. Mais recentemente, ganhou a Champions da Ásia com o Al Hilal (onde Jesus esteve sete meses)… e quando se esperava que voltasse ao seu habitat natural - a Europa das big five -, ei-lo a aceitar uma proposta certamente irrecusável do Shabab Al Ahli (Dubai), um dos participantes na modestíssima Liga dos Emirados Árabes Unidos.  
Se consultarem o quadro em anexo, constatarão que uma escola de treino tão importante como a francesa tem apenas um técnico nas  big five (Patrick Vieira, no Crystal Palace) e que não há um único treinador brasileiro (!) nas 98 equipas que compõem as primeiras divisões das ligas inglesa, espanhola, alemã, italiana e francesa. Nem um do país que elevou o futebol à categoria de arte… 


TREINADORES ESTRANGEIROS NAS ‘BIG FIVE’

Há 34 treinadores estrangeiros no conjunto das 98 equipas que compõem as Ligas inglesa, espanhola, italiana, alemã e francesa. O quadro não está completo porque os italianos Salernitana e Spezia ainda não escolheram técnico para 2022/2023. Dos 34 estrangeiros, 27 são europeus e sete americanos - nenhum destes brasileiro. 

PORTUGAL (4)
Inglaterra (2): Bruno Lage (Wolverhampton) e Marco Silva (Fulham)
Itália (1); José Mourinho (Roma)
França (1): Paulo Fonseca (Lille)
ITÁLIA (3)
Inglaterra (1): Antonio Conte (Tottenham)
Espanha (2): Carlo Ancelotti (Real Madrid) e Gennaro Gattuso (Valência)
ESPANHA (3)
Inglaterra (2): Pep Guardiola (Man. City) e Mikel Arteta (Arsenal)
França (1): Óscar García (Nantes)
ARGENTINA (3)
Espanha (2): Diego Simeone (Atlético Madrid) e Eduardo Coudet (Celta)
França (1): Jorge Sampaoli (Marselha)
SUÍÇA (3)
Alemanha (2): Gerardo Seoane (Leverkusen) e Urs Fischer (Union Berlim)
França (1): Lucien Favre (Nice)
ALEMANHA (2)
Inglaterra (2): Jurgen Klopp (Liverpool) e Thomas Tuchel (Chelsea)
PAÍSES BAIXOS (2)
Inglaterra (1): Erik ten Haag (Man. United)
França (1): Peter Bosz (Lyon)
DINAMARCA (2)
Inglaterra (1): Thomas Frank (Brentford)
Alemanha (1): Bo Svensson (Mainz)
CROÁCIA (2)
Itália (1): Ivan Juric (Torino)
Alemanha (1): Niko Kovac (Wolfsburg)
ÁUSTRIA (2)
Inglaterra (1): Ralph Hasenhittl (Southampton)
Alemanha (1): Oliver Glasner (Frankfurt)
ESTADOS UNIDOS (2)
Inglaterra (1): Jesse Marsch (Leeds)
Alemanha (1): Pellegrino Mattarazzo (Stuttgart)

Há mais seis treinadores das seguintes nacionalidades: França, Bélgica, Arménia, Sérvia, México e Chile. 
 

 


ABEL, RUMO À ETERNIDADE

COMEÇOU (de madrugada) a fase eliminatória da Taça dos Libertadores, a Champions sul-americana, com a 1.ª mão dos oitavos de final. Há três treinadores portugueses envolvidos: Abel Ferreira (Palmeiras), que joga mais logo em casa do Cerro Porteño; Pedro Caixinha (Talleres), que recebe o Colón à mesma hora; e Vítor Pereira (Corinthians), que recebeu nesta madrugada o Boca Juniors. O Palmeiras, bicampeão em título, é o favorito máximo da competição, à frente do River Plate de Marcelo Gallardo, que foi amputado do seu goleador Julián Álvarez (a caminho do Man. City). Abel luta pelo tri que lhe dará um lugar na galeria dos mitos do futebol brasileiro e sul-americano: só um treinador conseguiu ganhar três Libertadores seguidas, o argentino Osvaldo Zubeldia, à frente dos Estudiantes de la Plata (1968, 1969 e 1970). Lendário treinador da era dourada dos Estudiantes (onde jogava o futuro campeão mundial Carlos Bilardo, que sempre se considerou discípulo de mestre Osvaldo), Zubeldia tem de ser a referência de Abel no caminho para a final de Guayaquil, Equador, a 29 outubro. A eternidade à espera dele.