Mais do que treinador
Amorim pensa o presente a olhar para o futuro, Jesus pensa o presente com saudades do passado: eis a diferença!...
R RÚBEN Amorim é o treinador do momento, não só pela extraordinária carreira do Sporting, o grande favorito à conquista do título nacional, proeza que não festeja desde 2002, mas também pelo ar fresco que trouxe ao futebol luso, com uma retórica clara, simples e bem recebida. Diz o que quer, mas fá-lo de uma forma despretensiosa que estávamos pouco habituados em ouvir.
Tenho a ideia de que nunca fugiu a alguma questão, mas revela a capacidade de catalogá-las em níveis de interesse mentalmente estabelecidos e dar as respostas em conformidade com a importância que do seu ponto de vista merecem, deixando de ser o treinador que apenas se sente seguro a falar sobre bola, para se assumir como um diplomata do próprio clube, ao enaltecer-lhe as virtudes e convidar os jovens a aderirem ao novo projeto e a entrarem na casa do leão.
Entrarem, na certeza de serem bem recebidos e de beneficiarem de oportunidades de aprendizagem e de progressão que a concorrência não lhes oferece.
Quando, a propósito da estreia na equipa principal do jovem Dário Essugo (16 anos), Rúben Amorim profere uma mensagem de otimismo, dirigida a quantos sonham ser candidatos a sucessores de CR7, informando-os de que no Sporting não interessa a idade e que todos, no momento de decidirem, sabem que há «uma porta aberta» para os acolher, está a dar um inequívoco sinal de confiança para o exterior, em geral, e, talvez, para o vizinho do outro lado da Segunda Circular, em particular, no qual, por força da mentalidade do seu atual treinador, que pensa o presente com saudades do passado, o investimento na formação encerrou para obras.
Para mim, é uma evidência, refletida em dois exemplos que têm merecido alguma atenção noticiosa nos últimos dias:
Gonçalo Ramos (19 anos), despromovido a segunda opção na seleção de sub-21, devido a desaceleração grosseira no seu processo evolutivo. Não foi emprestado, nem é utilizado no Benfica com o mínimo de regularidade. Está a ser desvalorizado, tendo sido preterido por Tiago Tomás (18 anos), habitual titular no Sporting.
Nuno Mendes (18 anos), convocado para a Seleção A, sem surpresa, sim, mas agradecido por ter encontrado no seu caminho um treinador que pensa o presente a olhar para o futuro, motivo pelo qual, enxergando-lhe qualidades, apostou nele com a convicção de quem acabara de descobrir um diamante em bruto. Com uma personalidade incrível, é, seguramente, a mais agradável revelação na presente temporada.
É de mais, senhores!...
OS incidentes de Portimão estavam anunciados. Aliás, horas antes, em Ponta Delgada, na sequência do excesso de nervosismo que caracterizou o final do Santa Clara-Tondela, embora sem nada de comparável ao acorrido no Portimonense-FC Porto, o treinador do emblema beirão, o espanhol Pako Ayestarán, questionado sobre o assunto, respondeu que, nesta fase pandémica sem adeptos nos jogos de futebol, parece haver gente autorizada a sentar-se nos bancos de suplentes e predisposta a desempenhar esse papel, transformando os bancos de técnicos em bancos de adeptos.
Paulo Sérgio pediu desculpa aos jogadores e a todas as pessoas, afirmando ter sido a primeira vez que foi expulso na sua carreira, talvez em circunstâncias tão vergonhosas, na medida em que já não tinha o cadastro limpo. «Falo sempre aos meus jogadores para não se deixarem ir pela emoção, e eu cometi esse erro (…), o resto são imagens esclarecedoras», sublinhou.
Sérgio Conceição lamentou a situação e, no resto, disse serem coisas de «quem vive o jogo de uma forma apaixonada, às vezes exagerada», esquecendo-se de aceitar, porém, que, no caso dele, são demasiado frequentes as ocasiões em que viola a fronteira do tolerável, em prejuízo próprio e do emblema que representa, porque, nos tempos de hoje, as imagens, além de não mentirem, dão a volta ao mundo em minutos.
Acredito, mesmo assim, que se oiçam palmas a condutas deste jaez, porque, como dizia o enorme Raul Solnado, se a estupidez pagasse imposto havia pessoas que andavam todas carimbadas.
Senhores treinadores, santa paciência, isto não tem a ver com emoção ou paixão, como indecorosamente argumentam. Tem a ver com impreparação para respeitar as regras do jogo e saber lidar com os resultados, quer nas vitórias, quer nas derrotas. Tem a ver com educação, ou falta dela. Tem a ver com a pressão com que procuram influenciar os árbitros. O resto é conversa fiada.
Nas nossas vidas, sem exceção, já fizemos coisas que não devíamos, das quais nos arrependemos. Mas isso não é a regra, como parecem fazer crer os treinadores de cada vez que passam das marcas.
Meus senhores, ou moderam-se, e entendem que um jogo não é mais do que isso, um jogo, por mais importante que seja em função do respetivo resultado, ou mudam de vida.
O respeito é muito bonito e cada qual luta com as armas que tem: neste caso concreto, se trocássemos os treinadores de bancos, muito provavelmente seria Paulo Sérgio a lamentar a tática fechadinha escolhida por Sérgio Conceição para lutar pelo pontinho que tanto jeito lhe daria…
O futebol é assim mesmo, em que a probabilidade de o mais fraco suplantar o mais forte será maior do que em qualquer outra modalidade coletiva. Não estou a inventar nada, apenas a recordar a teoria de reputado treinador brasileiro que trabalhou em Guimarães e justificava com essa particularidade o fascínio que só ele contém.