Mais do que treinador

OPINIÃO23.03.202106:00

Amorim pensa o presente a olhar para o futuro, Jesus pensa o presente com saudades do passado: eis a diferença!...

R RÚBEN Amorim é o treinador do momento, não só pela extraordinária carreira do Sporting, o grande favorito à conquista do título nacional, proeza que não festeja desde 2002, mas também pelo ar fresco que trouxe ao futebol luso, com uma retórica clara, simples e bem recebida. Diz o que quer, mas fá-lo de uma forma despretensiosa que estávamos pouco habituados em ouvir.  
Tenho a ideia de que nunca fugiu a alguma questão, mas revela a capacidade de catalogá-las em níveis de interesse mentalmente estabelecidos e dar as respostas em conformidade com a importância que do seu ponto de vista merecem,  deixando de ser o treinador que apenas se sente seguro a falar sobre bola, para se assumir como um diplomata do próprio clube, ao enaltecer-lhe as virtudes e convidar os jovens a aderirem ao novo projeto e a entrarem na casa do leão.
Entrarem, na certeza de serem bem recebidos e de  beneficiarem de oportunidades de aprendizagem e de progressão que a concorrência não lhes oferece.
Quando, a propósito da estreia na equipa principal do jovem Dário Essugo (16 anos), Rúben Amorim profere uma mensagem de otimismo, dirigida a quantos sonham ser  candidatos a sucessores de CR7, informando-os de que no Sporting não interessa a idade e que todos,  no momento de decidirem, sabem que há  «uma porta aberta» para os acolher, está a dar um inequívoco sinal de confiança para o exterior,  em geral, e, talvez, para o vizinho do outro lado da Segunda Circular, em particular, no qual, por força da mentalidade do  seu atual treinador, que pensa o presente com saudades do passado, o investimento na formação encerrou para obras.  
Para mim, é  uma evidência,  refletida em dois exemplos que têm merecido alguma atenção noticiosa nos últimos dias:
Gonçalo Ramos (19 anos), despromovido  a  segunda opção na seleção de sub-21, devido a desaceleração grosseira no seu  processo evolutivo. Não foi emprestado, nem  é utilizado no Benfica com o mínimo de regularidade. Está a ser desvalorizado, tendo sido preterido por Tiago Tomás (18 anos), habitual titular no Sporting.
Nuno Mendes (18 anos), convocado para a Seleção A, sem surpresa, sim, mas agradecido por ter encontrado no seu caminho um treinador que pensa o presente a olhar para o futuro, motivo pelo qual, enxergando-lhe qualidades, apostou nele com a convicção de quem acabara de descobrir um diamante em bruto. Com uma personalidade incrível, é, seguramente, a mais agradável revelação na presente temporada.
 

É de mais, senhores!... 

OS incidentes de Portimão  estavam anunciados. Aliás, horas antes, em Ponta Delgada, na sequência do excesso de nervosismo que caracterizou o final do Santa Clara-Tondela, embora sem nada de comparável ao acorrido no Portimonense-FC Porto, o treinador do emblema beirão, o espanhol Pako Ayestarán, questionado sobre o assunto, respondeu que, nesta fase pandémica sem adeptos nos jogos de futebol, parece haver gente autorizada a sentar-se nos bancos de suplentes e predisposta a  desempenhar esse papel, transformando os bancos de técnicos em bancos de adeptos.
Paulo Sérgio pediu desculpa aos jogadores e a todas as pessoas, afirmando ter sido a primeira vez que foi expulso na sua carreira, talvez em circunstâncias tão vergonhosas, na medida em que já  não tinha o cadastro limpo. «Falo sempre aos meus jogadores para não se deixarem ir pela emoção, e eu cometi esse erro (…), o resto são imagens esclarecedoras», sublinhou.
Sérgio Conceição lamentou a situação e, no resto, disse serem coisas de «quem vive o jogo de uma forma apaixonada, às vezes exagerada», esquecendo-se de aceitar, porém, que,  no caso dele, são demasiado frequentes  as ocasiões em que viola a fronteira do tolerável, em prejuízo próprio e do emblema que representa, porque, nos tempos de hoje, as imagens, além de não mentirem, dão a volta ao mundo em minutos.
Acredito, mesmo assim, que se oiçam palmas a condutas deste jaez, porque, como dizia o enorme  Raul Solnado, se a estupidez pagasse imposto havia pessoas que andavam todas carimbadas.
Senhores treinadores, santa paciência, isto não tem a ver com emoção ou paixão, como indecorosamente argumentam. Tem a ver  com impreparação para respeitar as regras do jogo e saber lidar com os resultados, quer nas vitórias, quer nas derrotas. Tem a ver com  educação, ou falta dela. Tem a ver com a pressão com que procuram influenciar os árbitros. O resto é conversa fiada.  
Nas nossas vidas, sem exceção,  já fizemos coisas que não devíamos,  das quais nos arrependemos. Mas isso não é a regra, como parecem fazer crer os treinadores de cada vez que passam das marcas.
Meus senhores, ou moderam-se,  e entendem que um jogo não é mais do que isso, um jogo, por mais importante que seja em função do respetivo resultado, ou mudam de vida.
O respeito é muito bonito e cada qual luta com as armas que tem:  neste caso concreto, se trocássemos os treinadores de bancos, muito provavelmente seria Paulo Sérgio a lamentar a tática fechadinha escolhida por Sérgio Conceição para lutar pelo pontinho que tanto jeito lhe daria…
 O futebol é assim mesmo, em que a probabilidade de o mais fraco suplantar o mais forte será maior do que em qualquer outra modalidade coletiva. Não estou a inventar nada, apenas a recordar a teoria de reputado treinador brasileiro que trabalhou em Guimarães e justificava com essa particularidade o fascínio que só ele contém.