Luxemburgo, 58 anos depois...
1961 foi um ano terrível para Portugal, pelo início da guerra em Angola, que levou Salazar a ordenar uma partida das tropas portuguesas «rapidamente e em força». O país vivia no cinzentismo dos dias de outubro e tinha poucas coisas que o alegrassem. Uma dessas coisas, era o futebol. O Benfica tinha-se sagrado, pela primeira vez, campeão europeu e na equipa de Béla Guttmann, o feiticeiro, despontava um jovem moçambicano, de 19 anos, de nome Eusébio da Silva Ferreira.
A Seleção Nacional disputava os jogos das eliminatórias para o Mundial de 1962. O selecionador era a antiga glória sportinguista, Fernando Peyroteo, e o jogo no Luxemburgo prestava-se a anedotas de café. Portugal tinha vencido o jogo anterior por 6-0 e a seleção luxemburguesa era composta por rapazes esforçados, mas amadores.
Foi o jogo de estreia de Eusébio na Seleção e Portugal perdeu estrondosamente por 4-2, com Costa Pereira a sofrer um hat trick de um serralheiro, de nome Schmit, e que nesse dia se tornou num herói nacional do Luxemburgo.
A derrota afastou, de imediato, Portugal de qualquer hipótese de se qualificar para a fase final, entregando esse privilégio à Inglaterra, que venceu o grupo.
O jogo foi traumatizante para o futebol português, mas, felizmente, não foi nada traumatizante para Eusébio, que se tornaria num dos melhores jogadores do mundo, no seu tempo.
Trinta anos mais tarde, Portugal teve outro dissabor no Luxemburgo, embora o empate a um golo fosse em jogo particular e por isso menos grave.
Isto para dizer, ou escrever, que o Luxemburgo não tem sido o que se poderá chamar um compincha para a Seleção Nacional. Muito menos o será num tempo em que a equipa ganhou outra maturidade e outra qualidade competitiva, muito bem trabalhada por um selecionador, Luc Holtz, que está há nove anos no desempenho do cargo, o que significa ter feito um trabalho de sucesso e, ao mesmo tempo, explica que a sua seleção seja uma equipa personalizada e capaz de driblar as suas próprias e naturais deficiências.
Não serão, pois, favas contadas. Portugal terá de ganhar amanhã, no Luxemburgo, para se apurar diretamente para o europeu, precisamente a prova em que defende o título histórico alcançado em França, há pouco mais de três anos. Mas, convém dizer, também não será propriamente uma missão do outro mundo. Portugal tem obrigação de ganhar e, mais do que isso, tem obrigação de chegar e impor-se, sem direito a contraditório, que é a maneira antipática, mas normalmente indiscutível como as grandes equipas tratam as mais pequenas no universo exclusivo da competição.
Um jogo de futebol, para mais um jogo que é decisivo para um apuramento, não é um jogo de dúvidas existenciais ou de contemplações sobre os grandes mistérios da vida. É um jogo para seres intratáveis, quais novos romanos que chegam, veem e vencem.
Portugal tem uma equipa formada por jogadores de qualidade superior e a única maneira de não serem melhores em campo seria a de correrem e suarem menos do que o adversário, algo que, de todo, não é admissível. Por isso, se os jogadores de Portugal correrem e suarem como é seu dever profissional, como são técnica e taticamente melhores, estarão obrigados a ganhar e a passar à fase final sem dramas, nem inquietações.
É verdade que o futebol nem sempre é lógico, como aconteceu naquele jogo, no Luxemburgo, em 1961. Porém, o facto de nem sempre ser lógico não quer significar que seja inexplicável. Em 1961, a Seleção foi indolente e desleixada; em 2019 sabe que não o pode ser.