Eu vi o espírito do brasão abençoado e desta vez estava a jogar andebol

OPINIÃO30.11.201803:16

ESTÁ feito. Com a melhor exibição da época, o FC Porto não só atingiu a fase a eliminar da Liga dos Campeões como ficou em primeiro lugar no seu grupo. É a décima quinta vez que atingimos os oitavos de final desde que este formato está em vigor.

Não valeria a pena repetir o óbvio, mas como há muita gente que prefere assobiar para o lado convém lembrar que há só uma equipa de futebol em Portugal com verdadeiro prestígio internacional e essa é o FC Porto. É lidar... E não seria necessária mais esta prova, o André Pipa, aliás, explicou-o de forma excelente e cabal na edição de quarta-feira deste jornal.

Foi uma semana gloriosa para o brasão abençoado. No sábado, o FC Porto fez um muito bom jogo contra o coiso codecity e outro fantástico com o Schalke 04. Os tais alemães fraquitos a quem só nós conseguimos marcar golos na Europa, que está no campeonato alemão, depois de um mau começo, a ter um desempenho notável e que só conseguiu ficar em segundo lugar num dos mais competitivos campeonatos do mundo. O campeão português marcou, na quarta-feira, três golos e deixou por marcar outros tantos, tantas foram as oportunidades soberanas. Os alemães nem uma hipótese de marcar tiveram, tendo-lhes valido um penalty caído do céu aos trambolhões.

Já aqui o escrevi, mas é notável ver a capacidade que a equipa tem de se transformar em diferentes modelos táticos sem que o seu desempenho sofra. Isto só se consegue com muito trabalho e só está ao alcance de um treinador extraordinário e de jogadores empenhados, disciplinados e com muita vontade de alcançar metas importantes. Haja dinheiro, alguma sorte, e com uns pequeníssimos acertos no plantel, em janeiro, esta equipa pode ir muito longe. Como é evidente, tenho garantido que ninguém sairá na janela de transferências, seria inimaginável que isso acontecesse.

Vale a pena lembrar que o FC Porto alcança o primeiro lugar do seu grupo na Champions sem um ponta de lança de raiz e mesmo assim, a par do Barcelona e do Bayern, tem o maior número de pontos conquistados e um ratio de golos marcados vs sofridos ao nível do Bayern, Real Madrid,  Manchester City e Barcelona. Estamos com a gente da nossa igualha, portanto. Lá para os quartos de final encontramo-nos.

O brasão abençoado, já se sabe, não se resume ao futebol. É, mais que tudo, uma ideia, um sentimento, uma forma de estar. E isso reflete-se nas equipas que têm o símbolo da nossa gente ao peito. O feito do nosso futebol é notável e deve ser cantado, mas como diria o nosso querido Artur Jorge não é nada de anormal. Não há dúvida nenhuma que a equipa do Sérgio Conceição é a imagem do nosso espírito mas isso não é novidade para ninguém. Do que, confesso, não estava à espera era de o ver de uma forma tão espetacular num jogo de andebol.

Não percebo nada de andebol, mas sei ver quando uma equipa em qualquer desporto se transcende e foi o que vi no último domingo do Dragão Caixa. Sei que temos bons jogadores e um bom treinador, mas vencer uma das melhores equipas do mundo de uma forma brilhante e inequívoca não se consegue só com trabalho, atitude e talento.  Aquela garra a defender, aquela fúria de tudo vencer, aquela coragem vem de algo que nós portistas conhecemos. Mais uma vez vi o espírito de brasão abençoado e desta vez estava a jogar andebol. 

Foi uma grande semana, venham as próximas.

Deixe-os falar, mister Sérgio

O Sérgio Conceição, na conferência de imprensa antes do jogo com o Schalke 04, veio confessar a sua irritação com alguns comentários que tentam minimizar os feitos do FC Porto - não é o primeiro, ainda aqui há atrasado o grande Jesualdo Ferreira queixava-se do mesmo. Como não quero que o nosso treinador ande enervado, não só porque o quero bem concentrado nas suas tarefas profissionais mas também pela enorme estima que tenho por ele, aconselho-o a passar a ver e a ler alguns comentários como se fizessem parte de rubricas humorísticas. É um rapaz mais velho do que ele que o aconselha, um que viveu boa parte da sua vida a ter de aturar essas desconsiderações e em vez de estar constantemente em estado de revolta decidiu, pura e simplesmente, rir da pequenez e do ressabiamento de quem as repete.

Eu percebo a estratégia destas tentativas constantes de apoucamento. Conjugada com a permanente venda da imaginária enorme grandeza de outro clube visa criar um clima de permanente condicionamento. É simples: se um clube é tão grande, tem tantos adeptos e as suas derrotas são acidentais e as vitórias, por pirrónicas que sejam, esmagadoras, não se pode ir contra os seus interesses. Quem for vai contra o que, em tese, sente a maioria da opinião pública. Ninguém, claro está, quer fazer isso. Os meios de comunicação social não querem perder mercado (logo nesta altura tão difícil) e os vários decisores, tanto do futebol como da política, não querem ir contra aquilo que lhes é vendido como o sentir da maioria.

Já os feitos de um clube que não tem esse construído peso não devem ser enaltecidos, pelo contrário, é obrigatório serem relativizados, reduzidos à quase insignificância. Ninguém quer comprar jornais e ver televisões com celebrações de clubes que ganham o que era suposto o tal grande vencer.

Claro que tudo isto é mania da perseguição. A nossa hegemonia dos últimos 30 anos não tem sido sistematicamente difamada, as nossas retumbantes vitórias internacionais não são secundarizadas, os nossos adversários não são sempre fraquitos, as primeiras páginas dos jornais e os destaques das televisões não são sempre dedicadas ao nosso adversário e o poder não é subserviente ao nosso principal adversário. Entretanto, vou comer um geladinho com a testa.

Mais vale, meu caro Sérgio Conceição, rir de tudo isto. Bem sei, oh se sei, que há alturas em que ver o nosso trabalho desconsiderado aborrece e não nego que às vezes renego a minha jura de não ligar, mas o melhor mesmo é mostrar o que valemos onde realmente importa: no campo. De preferência num campo onde padres não celebrem missas. O registo das nossas vitórias não pode ser alterado. Mas, acredite, com o desespero que para aí vejo qualquer dia até isso vão querer alterar.

Nada que espante

QUANDO os nossos adversários estão a cometer erros devemos deixá-los em paz. No entanto, cumpre registar o brilhante desempenho do presidente do Benfica na novela Vitória. Vendo bem, não há nada de  surpreendente, se Vieira não sabia o que Paulo Gonçalves fazia também não admira que não saiba o que Rui Vitória anda a fazer.