Em frente, obviamente

OPINIÃO23.06.202107:00

Não existem atenuantes para um eventual fracasso, nem o eng.º Fernando Santos quer ficar na história por passar do oitenta para o oito

SERÁ muito difícil Portugal não se apurar para os oitavos de final, tendo em conta os resultados dos outros grupos e o atual figurino do torneio. Só uma desgraça ainda pior com França (o ainda alude ao jogo de Munique) deixará de fora o campeão europeu. Se repararem bem, das 24 seleções finalistas só oito ficam eliminadas na fase de grupos: são as piores, as que não mostraram argumentos mínimos ao fim de três jogos. É claro que o nosso grupo não pode ser considerado um grupo normal, dada a invulgaridade de se juntarem na mesma poule três seleções tão fortes mas, mesmo assim, temos de sublinhar que Portugal não pertence ao lote dos que se ficam pela fase inicial. Pelo contrário. A nossa seleção é, entre as grandes seleções europeias, a ÚNICA que NUNCA foi eliminada na fase de grupos (sete participações, sete qualificações!), o que quer dizer muita coisa. Alemanha, França, Itália, Espanha, Inglaterra e Holanda, por exemplo, não podem dizer o mesmo. Por esta razão, e porque Portugal não precisa propriamente de um trabalho de Hércules para seguir em frente (empate ou derrota suave chegam), não existem atenuantes para um eventual fracasso. Que não vai acontecer. O eng.º Fernando Santos não quererá ficar na história por passar do oitenta para o oito.  
Que onze teremos? Haverá mudanças, certamente. Renato Sanches, João Palhinha e João Moutinho são os nomes mais falados para «refrescarem» a equipa, utilizando o eufemismo de Fernando Santos na conversa com os jornalistas pós-Munique (chama-se a isto controlo de danos). O engenheiro fez questão de sublinhar, falando para o interior do grupo, que as alterações não significam um «castigo» [para os substituídos]. É claro que o selecionador tem de proteger os seus, sobretudo os que não estiveram à altura, mas não é pecado reconhecer que há unidades em claro sub-rendimento - Danilo, William, Bernardo Silva e Bruno Fernandes, para citar os mais evidentes - e que o nosso meio campo continua a não funcionar. Seja por causa do sistema idealizado pelo treinador; seja por causa do desconforto de jogadores cujas melhores características não estarão, porventura, a ser devidamente aproveitadas; seja por causa de um excessivo conservadorismo que parece inibir a aposta em jogadores que representem uma injeção de ímpeto e irreverência num onze quiçá demasiado amarrado aos sacrossantos equilíbrios; a verdade é que o engenheiro tem mesmo de mudar alguma coisa porque a França é do patamar da Alemanha e um campeão europeu não pode, como aconteceu em Munique, entrar no jogo a pensar pequeno e de calculadora na mão.
O facto de as substituições em Munique terem sido exatamente as mesmas do jogo inicial (Renato, Rafa Silva, André Silva e João Moutinho…) não é encorajador e certamente desanima quem fica de fora. Entre outras perplexidades, custa-nos entender que o melhor médio posicional do campeonato, talvez do País (Palhinha), não tenha sequer um minuto de utilização num meio campo marcado, até ao momento, pela macieza, lentidão e reduzido raio de ação da dupla Danilo-William - ainda por cima sendo Palhinha um médio de grande dimensão atlética, bravura competitiva e rapidez sobre a bola; custa-me entender que Rafa Silva (23 internacionalizações, zero golos) seja mais aposta que Gonçalo Guedes (23-6), esse sim, jogador com faro de Seleção; e custa-me entender que o segundo melhor marcador da Bundesliga, André Silva, esteja reduzido a cameos, e que o melhor marcador do campeonato português, o talentoso e atrevido Pedro Gonçalves, não entre sequer nas contas. Bem sei que há sempre um núcleo duro nas seleções mais ou menos intocável (antes de Santos também havia com Bento, Queiroz, Scolari…), bem sei que há jogadores-fétiches, bem sei que há hierarquias e prioridades não escritas, mas também sei que negar evidências nunca é bom caminho.
Força, Seleção!

OS ANTÓNIOS OLIVEIRAS

Éum nome com imensa história no futebol português. O senhor do lado  esquerdo foi um avançado genial, para mim o jogador português mais parecido com Cruyff. Não o conheço pessoalmente mas assisti a grandes jogos dele, tanto no FC Porto como no Sporting. Que talento, que irreverência, que imenso descaramento tinha Oliveira, o único que vi marcar um livre de trivela (!), o único, antes de Cristiano, que vi decidir sozinho (com um hat trick ao Dínamo Zagreb em Alvalade) um jogo de Champions, que na altura se chamava Taça dos Campeões. Continua em jogo e a dar nas vistas: ainda agora exerceu o direito mais saboroso de um homem livre: o poder dizer não. Outro António Oliveira é ‘Toni’, grande jogador das décadas de 60 e 70 (Académica e Benfica), e o treinador que levou o Benfica à final dos Campeões de 1988 (Estugarda) com uma equipa medianamente apetrechada e ao título nacional (segundo para ele como treinador) no célebre 6-3 de Alvalade (maio de 1994), quiçá o dérbi mais intenso, espetacular e memorável da história. O mais recente António Oliveira, de 38 anos, é filho de Toni e treinador como o pai: lidera, com grande surpresa, o campeonato brasileiro (4 vitórias em 4 jogos!) à frente do improvável Athletico Paranaense. Conheço o pai, que faz parte da minha carreira, conheço o filho (foi comentador na BOLA TV, cruzei-me várias vezes com ele em estúdio) e posso dizer que gosto muito de ambos. Ouço António Oliveira filho a falar e reconheço automaticamente no discurso dele a gentileza, bondade e humanidade do pai. Gente boa.