Da paciência e da falta dela
José Peseiro voltou a referir-se, anteontem, ao facto de o Sporting estar, neste momento, atrás dos adversários no que à preparação da nova época diz respeito. Pediu, por isso, paciência aos adeptos. Há quem não goste - e entende-se, porque paciência é coisa que os sportinguistas tiveram de mais nos últimos tempos. Há quem veja nas palavras de Peseiro uma desculpa antecipada para o fracasso. Há quem olhe para o discurso do novo treinador leonino como um regresso ao passado, quando o leão partia sempre, aos olhos de quase toda a gente, como uma espécie de outsider em relação a Benfica e FC Porto - alguém se esquece do célebre a partir de hoje não há dois candidatos em Portugal, há três imortalizado por Jorge Jesus na sua apresentação?
Não acho que seja nem uma coisa nem outra. O que é, de facto, é uma constatação da realidade. É verdade que Sousa Cintra tem feito tudo ao seu alcance para dar a Peseiro soluções para fazer uma equipa competitiva. Segurou Bruno Fernandes, Battaglia e Bas Dost (talvez as principais figuras do Sporting da última época) e fez regressar Nani, que em condições normais será uma mais-valia. Mas isso não invalida que pelo meio tenha perdido Rui Patrício, Piccini, William Carvalho e Gelson Martins, sem que se veja, no atual grupo, quem os possa substituir à altura. Por outras palavras, o plantel continua a ter gente de muita qualidade mas não é - por muito que tentem dizer o contrário - tão forte como o da época passada. Percebe-se (ou pelo menos percebe quem quiser perceber...) as cautelas de Peseiro, que ainda assim nunca disse ser o facto de partir atrás um obstáculo intransponível para lutar pelo título. Era, parece-me, um aviso que se referia mais ao presente do que ao futuro. Uma espécie de havemos de lá chegar, mas não tenham pressa.
Ninguém pode levar a mal. No fundo, o que Peseiro fez foi o mesmo que Sérgio Conceição fizera há uns dias: dizer que as coisas estão longe de serem perfeitas. Elogiar um e criticar outro só por causa do estilo é pernicioso. E injusto.
AO que parece o futebol português está, afinal, cheio de santos. Ou pelo menos cheio de gente que não se importará de ser, num futuro próximo, elevado a essa categoria por um qualquer papa do futebol. É quase sempre assim no início de todas as épocas: alguém se coloca no papel de beato e clama a necessidade de pacificar o futebol e logo outro, que de beato também tem pouco, vem apontar-lhe pecados e chamar à colação princípios que lhe foram ensinados desde pequenino e dos quais nunca se desviou um milímetro. É, convém que percebamos, conversa para enganar tolos. Há muito que o futebol português deixou de ter santos. São - sempre foram - muitos mais os pecadores. Com boa conversa, é verdade, como convém a quem só sobrevive juntando em seu redor uma multidão de fiéis que lhes perdoam tudo. Mas só fecha os olhos quem quer. Esta época, já se percebeu, será igual (rezemos para que não seja pior...) à anterior. Até porque ninguém se importa muito em ganhar lugar no céu.
JÁ não há paciência para quem tenta encontrar razões para dizer que deixar Cristiano Ronaldo para a Juventus se tratou, afinal, de um bom negócio para o Real Madrid. Ou é a idade, ou é o facto de ter Florentino tirado rendimento da melhor fase de CR7 e ter conseguido, ainda assim, vendê-lo por mais do que o comprou. É, também esta, conversa para enganar tolos. Na entrevista ontem publicada em A BOLA, Mijatovic sintetizou a Pereira Ramos aquela que é a realidade: «É impossível que voltemos a ver aqui um jogador como ele porque, simplesmente, não existe.» O resto é blá-blá-blá. A Juventus, já todos perceberam, saiu a ganhar. Em Madrid, pelo contrário, irão sentir saudades de Ronaldo, mesmo que ainda não o consigam perceber. Mas é sempre assim na vida: só sentimos realmente falta de alguém quando essa pessoa está longe. E só damos o devido valor às coisas quando elas já nos escaparam entre os dedos. É humano. E somos todos humanos. Até Florentino Pérez...