Bombardeamento à vista

OPINIÃO09.03.202205:30

O City de Pep é uma equipa extraordinária à procura de estatuto europeu. O Sporting está a aprender a competir (e a ganhar dinheiro) na Champions

TERMINA hoje salvo surpresa de maior (por exemplo: o Sporting ganhar por 6-0, 7-1 ou mesmo 8-2) a participação do campeão nacional na Champions, quatro anos depois da última presença na prova e treze anos depois da última (e única) presença nos oitavos de final. Apesar das terríveis goleadas caseiras sofridas com Ajax (1-5) e Manchester City (0-5), o balanço da campanha tem de ser considerado positivo. O Sporting passou surpreendentemente da fase de grupos depois de eliminar uma equipa alemã bem mais poderosa - o Dortmund -com um triunfo enfático (3-1) no jogo do tudo ou nada em Lisboa; ganhou calo e experiência (que não tinha e continua longe de ter) e mostrou jogadores/ativos no palco mais importante de todos. A Champions opera milagres na cotação dos que nela sobressaem e há pelo menos um leão que sai muito reforçado desta campanha: o médio Matheus Nunes, de quem Pep Guardiola disse ser «um dos melhores do Mundo naquela posição» (se tivesse sido o treinador qualquer coisa Smith a dizer isso era uma coisa. Só que Guardiola é o melhor treinador do Mundo).

Para o estreante Rúben Amorim, goleadas à parte, a coisa não correu mal de todo: conseguiu logo à primeira tentativa o que alguns treinadores mais experientes e consagrados demoraram anos a conseguir - passar da fase de grupos - e contribuiu com encaixe de largos milhões para a depauperada tesouraria sportinguista. O discurso foi sempre no sentido de reconhecer as limitações e falta de experiência da equipa nesta competição e de projectar uma participação mais constante na prova que lhe trará inevitavelmente outro estofo competitivo. Ontem, na conferência de Imprensa, Ruben frisou isso mais uma vez… e sublinhou [dando o exemplo de Klopp no Liverpool] que é preciso paciência e persistência. Creio que fez bem. O Sporting nunca foi um clube com peso na Champions (até este ano, apenas uma presença na fase eliminatória, com Paulo Bento) e só poderá aspirar a dar o salto competitivo (que lhe permita, por exemplo, não ser fatalmente goleado pelos tubarões) quando conseguir ser passageiro frequente da fase de grupos e dos milhões que ela garante -Frederico Varandas compreendeu isso rapidamente e não precisou de tirar um curso: bastou-lhe compreender o que o FC Porto faz há mais de trinta anos.
 

Rúben Amorim, Rúben Dias, Ederson e Coates no final do jogo em Alvalade


Dito isto, numa altura em que o Sporting se encontra bem posicionado para garantir a qualificação automática pelo segunda época consecutiva, era importante que a equipa, desfalcada de várias unidades no meio campo - Matheus Nunes, Palhinha, Daniel Bragança e Pedro Gonçalves - conseguisse evitar uma nova goleada do City. Bombardeamento acontecerá  certamente, tamanha a vertigem ofensiva dos blues, mas a este nível os leões não podem encolher-se e ter medo. O adversário é uma equipa extraordinária mas não é um colosso. Não obstante os mais de mil milhões investidos na era Guardiola, a verdade é que o City continua longe do estatuto de grande europeu exibido pelos rivais domésticos Liverpool, Chelsea e Manchester United. Com excepção da final perdida da época passada no Porto, os blues não tem por hábito passar dos quartos de final. Um pouco como o primo árabe PSG.

Em 2009, o Sporting foi eliminado pelo Bayern (esse sim, um colosso) com um total de 1-12 em dois jogos (0-5 em Lisboa; 1-7 em Munique). Não pode voltar a acontecer.
… ou pode?
 

FCP DE OLHO EM SEVILHA

Há dois anos o Lyon, conduzido por Rudi Garcia, vergou o City em Alvalade (3-1) e chegou à meia final da Champions, na qual foi passado a ferro pelo Bayern (0-3). Digamos que dois anos em futebol pode ser uma eternidade (olhem como o Sporting estava e como está agora…) e será difícil reconhecer neste intermitente Lyon, 9.º classificado da Liga francesa, traços dessa equipa que esteve a 90 minutos de jogar uma final europeia inteiramente francesa com o PSG. Saíram Garcia, Memphis Depay (Barcelona), Maxwel Cornet (Burnley) e Bruno Guimarães (Newcastle), mas a verdade é que a maioria dos protagonistas dessa campanha continua lá : o nosso Anthony Lopes, Jason Denayer, Leo Dubois, Maxence Caqueret, Thiago Mendes, Houssem Aouar, Moussa Dembélé, Toko Ekambi, René-Adelaide. Todos bons jogadores.

O Lyon ganhou o seu grupo da Liga Europa (que incluía Rangers, Sparta Praga e Brondby) com cinco vitórias e um empate e venceu com clareza o Rangers no vulcão de Ibrox Park (2-0), onde o FCP há bem pouco tempo caiu com estrépito. Ou seja. Talvez seja melhor os portistas desconfiarem da aparente acessibilidade deste adversário que é treinado pelo homem (Peter Bosz) que há menos de cinco anos levou um jovem e atrevido Ajax à final da Liga Europa. Creio que Sérgio, pela boa resposta que a equipa tem dado à perda de Luis Díaz, estará à espera que o Sporting perca mais dois ou três pontos no campeonato para se focar, então sim, no objetivo Liga Europa, onde o FC Porto, no papel, é um dos candidatos mais credíveis ao lado do Barcelona, do Sevilha e do West Ham (que se defrontam nesta ronda). Sérgio, com os meios que lhe foram dados, tem assinado um percurso (desportivo e financeiro) verdadeiramente notável à frente do FC Porto, a ponto de ser ele, e não Pinto da Costa, o homem que hoje por hoje não suscita qualquer reserva no seio da nação portista. Mas ele sabe que lhe falta qualquer coisa para poder sentar-se ao lado de Artur Jorge e José Mourinho no gotha dos treinadores portistas: uma conquista europeia. Sevilha, dia 18 maio...

Quanto ao SC Braga, pode e deve concentrar todos os esforços na Liga Europa, onde chegou à final numa ocasião (em 2011, com Domingos) e aos quartos de final noutra (em 2016, com Paulo Fonseca). O Mónaco, 8.º da Liga francesa com os mesmos 41 pontos do Lyon, não parece de todo intransponível mas exige o melhor Braga da época. Oportunidade de rever a classe do veterano Fabregas e a irrequietude do nosso Gelson Martins, que tem companheiros de grande qualidade na frente ofensiva - Ben Yedder, Kevin Volland e Myron Boadu. Difícil, difícil…
 

LIVERPOOL CONTRA OS FERROS

UM golo fabuloso do argentino Lautaro Martínez e a consistência defensiva dos postes e da trave da baliza interista (os ferros detiveram três golos feitos de um Liverpool não muito inspirado mas sempre superior) valeram aos italianos um triunfo histórico em Anfield (1-0) que, contudo, não impediu a equipa de Jurgen Klopp de se qualificar para os quartos. Por falar em ferro, em Munique houve impressionante demonstração de poderio do Bayern, sempre um candidato ao trono europeu: hat trick de Lewandowski em onze minutos e o martelo alemão a abater-se com impiedade sobre os austríacos: barrigada de golos (7-1) a acompanhar a missa de réquiem do Salzburgo, que sofreu os horrores da blitzkrieg como antes haviam sofrido Barcelona, Benfica e Kiev. O tanque de Nagelsmann ganha embalagem: vão 30 golos em oito jogos (!).