Ameaça ambiental!...
NESTES tempos de hoje, interrogo-me muitas vezes, para não dizer quase todos os dias, e por diversos motivos e comportamentos, que vão da política à religião, do desporto à justiça, das pessoas singulares às colectivas, se valerá realmente a pena lutar por um ideal, assumir uma atitude coerente, manter a independência no praticar e no agir, respeitar a ética e a moral, ser solidário e cultivar a amizade.
Durante muitos e muitos anos entendi, sobretudo por influencia da educação que recebi, dever ser esse o padrão da minha vida e do meu comportamento. Habituei-me a ter referências, as primeiras das quais foram, desde sempre os meus Pais e as minhas irmãs. Mas tive outras fora do meio familiar mais próximo.
Desde menino e moço que sempre quis ser advogado. Acreditava na Justiça de olhos vendados e tinha um enorme desejo de um dia a servir. E cheguei a sentir o orgulho de a servir e contribuir para que ela chegasse a todos os cidadãos independentemente da sua condição social. Já num dos meus artigos referi que o meu Pai fez uns versos para um não realizado livro de curso em que ele me dizia que quando chegasse a prática da profissão confiasse na ilusão. Não só confiei nela, como vivi nela com algumas desilusões. Hoje vivo na desilusão completa, porque a Justiça é toda ela ilusão, e o pior de tudo é que tirou a venda dos olhos e olha apenas para um lado!...
Na politica o mesmo. Estudante, e, sobretudo, universitário, vivia na ditadura sob o ideal da democracia e da liberdade de expressão e pensamento. Estive sempre ao lado dos grandes combatentes da minha geração, sendo certo que muitos eles sofreram as torturas das prisões. A liberdade trouxe depois à democracia os que eram seus inimigos, e, por isso, do oportunismo à corrupção foi um passo que já atingiu níveis escandalosos. Hoje, na Europa e particularmente em Portugal, contam-se pelos dedos das mãos os homens verticais, sérios e independentes, estadistas de rasgos e competentes, servidores do Estado e das nações. Pelo contrário, nascem e evoluem como cogumelos, os burocratas, os idiotas, os desonestos, numa palavra, os medíocres.
No desporto e, particularmente, no futebol é então um fartar vilanagem, ao nível sobretudo dos dirigentes, onde a mediocridade grassa.
Nunca vi tanta a gente a falar, nas rádios e nas televisões, e a escrever nos jornais, nos que são dignos desse nome e nos que não são, a dar sentenças sobre todas as coisas, desde as mais ridículas até àquelas que não têm qualquer interesse. Há os que se insultam e agridem, os que gritam e os que berram, os que correm num determinado sentido e depois se afastam aos coices. Mas, pergunto: e ideias? Nas palavras, nos escritos, nas atitudes, nos comportamentos, nada se constrói, não há um ensinamento prático, não há uma opinião que se aproveite. Fala-se e escreve-se muito, mas de substância nada.
E ideais e convicções? E princípios éticos e morais? E referências. Pois é, mas por muito que custe a engolir são estes, sem ideais, sem convicções, sem princípios que são consideradas referências, líderes, de elevada estatura ética.
Liga Portugal e Special Olympics
O Special Olympics é uma das minhas convicções mais profundas dos últimos dez anos, e por esse ideal de inclusão das pessoas deficientes através do desporto me continuarei a bater, agora com a preciosa colaboração dos Presidentes da AG e Conselho Fiscal, respectivamente, Eduardo Barroso e Fernando Seara.
A Liga Portuguesa de Futebol Profissional, ou mais concretamente a sua Fundação, celebrou um protocolo com o Special Olympics Portugal por iniciativa do seu Presidente, Pedro Proença, pronta e gratamente por mim aceite.
A cerimónia de assinatura é algo que não devemos esquecer, como exemplo daquilo que o futebol tem de bom que é unir em vez de desunir e se transformar em violência. E por ironia da vida juntou à mesa três críticos duros da arbitragem e muitas vezes de Pedro Proença, uma vezes com justiça e outras sem razão. Não deixamos de o considerar um dos melhores árbitros do mundo, que agora noutras funções, difíceis e absorventes, não esqueceu quem precisa do afecto de todos. Obrigado Pedro Proença e a final da Taça da Liga será certamente um momento da pureza de alma que o futebol também tem.
Futebol, fado e Fátima
ESTES eram popularmente referidos como os três pilares da ditadura de António de Oliveira Salazar para a pacificação da população e alienação da mesma no que concerne a política do país na altura. Esta expressão é ainda hoje usada quando se refere a pouca participação da população portuguesa nos assuntos da sociedade.
Mas, pondo de lado Fátima, que neste tempo novo me diz muito, e, portanto, não misturo nem com o fado, nem com o futebol, é sobre estes que produzo apenas uma consideração porque gosto muito do fado e gosto muito do futebol, naquilo que ambos têm de bom, como são os seus intérpretes.
Saí das instalações de uma das maiores sociedades de advogados portuguesas - a Miranda - depois de ter assistido à apresentação de um disco do seu sócio fundador, o meu querido amigo e Colega, Agostinho Pereira Miranda, com fados por ele cantados. Com alma cheia pela sua grande voz, pelos fados cantados e o convívio com muitos dos colegas da minha geração, fui para o futebol d´A Quinta da Bola, onde os intérpretes foram, sob a moderação do José Manuel Delgado, o Director Vitor Serpa, Fernando Seara, eu e José Peseiro.
Não se cantou o fado, designadamente, o rigoroso. Mas disseram-se coisas rigorosas, não em verso, mas em prosa, sem guitarra, nem violas. Mas falou-se de futebol, em tom bastante afinado, e de alguns fadistas que andam desafinados!...
Uma nota triste
PARA terminar e lamentar o falecimento do António Tavares Telles, um jornalista amigo de longa data, com quem há muito tempo não falava, talvez mais de cinco anos que é o tempo em que deixei de ir passar férias para o Algarve.
Ficam para trás os copos que bebemos juntos, os almoços que prolongámos com conversas e um bom charuto, designadamente, os almoços de bacalhau cozido no Chagão às sextas-feiras onde tanta gente do futebol se encontrava.
Depois o António foi viver para o Algarve - ele gostava de viver junto do mar - e os nossos encontros espaçaram-se e tinham lugar nuns longos jantares de Vilamoura onde se punha a conversa em dia.
Sabia que estava doente e por isso há muito que não falávamos. Tenho muitas saudades do seu humor, das críticas que me fazia no sentido construtivo, e de alguns elogios. Não tive oportunidade de lhe dar um último abraço, de ter uma última conversa. Talvez um dia voltemos a encontrar-nos para pôr a conversa em dia, sobretudo, sobre este tempo que não tem o sabor do tempo em que tantas ideias trocámos!
Os meus sentidos pêsames à família, designadamente, à sua esposa, e, particularmente, à sua filha Alexandra, a quem me liga muita estima pelos inesquecíveis tempos do Independente!...