A UEFA ao serviço (abjecto) dos poderosos

OPINIÃO08.08.201801:48

Escrevo este texto, horas antes do primeiro jogo oficial do Benfica. Quando for lido, já se saberá o desfecho do encontro contra o Fenerbahçe e as expectativas quanto à 3.ª pré-eliminatória para acesso ao play-off para a fase de grupos da Champions.

1 - Começo por analisar a absurda e cada vez mais elitista formulação desta competição. Em 2018/19, teremos 32 equipas na fase de grupos, assim divididas:
- O campeão da Liga dos Campeões (1)
- O campeão da Liga Europa (1)
- Os 4 primeiros classificados das federações do 1.º ao 4.º lugar no ranking da UEFA: Espanha, Alemanha, Inglaterra e Itália (16).
- Os 2 primeiros classificados das federações no 5.º e 6.º lugar: França e Rússia (4).
- Os campeões das federações classificadas do 7.º ao 10.º lugar: Portugal, Ucrânia, Bélgica e Turquia (4).
- Os 4 sobreviventes do chamado e penoso ‘caminho dos campeões’ das federações desde a 11.º do ranking (Áustria) até à última 55.ª (Kosovo) que disputam 4 eliminatórias prévias!
- Os 2 sobreviventes do estranhamente apelidado ‘caminho da liga’, que resultarão de 3 eliminatórias, nas quais 6 equipas jogam a primeira delas e as vencedoras se encontram depois com os vice-campeões de Portugal, Ucrânia e Bélgica e os 3.ºs classificados da França e Rússia.

Ou seja, da Espanha, Alemanha, Inglaterra e Itália teremos 17 clubes (se acrescentarmos a forte probabilidade do vencedor da Liga Europa ser de um destes países), o que corresponde a 53% das presenças. A alteração produzida permite que um lugar secundário numa destas ligas (a 4.ª posição) tenha entrada imediata, ao mesmo tempo que o vice-campeão de Portugal (país campeão europeu) tenha de disputar duas eliminatórias com equipas de igual calibre. Em termos de planeamento de uma época, imagina-se o que, já com a bola a correr, significará estar dependente de poder ou não alcançar 40 ou mais milhões de euros, que é a inexplicável diferença entre estar na Liga dos Campeões ou ir competir na mísera Liga Europa. E, evidentemente, há os clubes que aguardam o desfecho destas duas eliminatórias para depenar os relegados para a Liga Europa que se veem obrigados a vender atletas a preços bem mais convidativos para os ‘abutres’.


Bela e justa UEFA: já não basta a desigualdade no dinheiro distribuído que torna as diferenças crescentemente não reversíveis, o subtil (às vezes, nem isso) favorecimento dos tubarões, as ‘migalhas’ distribuídas a 49 das 55 federações, o fechar de olhos aos poderosos quanto a negócios obscenos e de duvidosa legitimidade, e eis que agora se reforça a Europa do futebol dividindo-a categoricamente em anéis e velocidades estanques e intransponíveis.


Assim, lenta, mas inexoravelmente, deixámos de ter boas equipas holandesas, checas, escocesas, romenas, búlgaras, sérvias e de outros países que estão condenados ao degredo uefeiro. Entretanto, Portugal, com as costumeiras guerras do alecrim e manjerona, deixou de estar na pegada dos grandes e não se vê como lá poderá voltar. Assunto que, só por si, deveria pôr os clubes - sobretudo os chamados grandes - a redefinir estratégias porque o ‘bodo aos pobres’ tem os dias contados, a não ser para o campeão. Na Liga Europa, até tento perceber o entusiasmo nas últimas jornadas do nosso campeonato para ver quem fica num lugar pomposamente chamado ‘europeu’. E depois? Gasta-se dinheiro com uma ou duas eliminatórias e acabou-se o ‘sonho europeu’. Ainda agora vimos o que aconteceu ao Rio Ave perante uma equipa ignota e de difícil memorização.

2 - Embora muitos negócios ainda venham a passar pela ponte do defeso, absurdamente prolongado por cá (lá fora já há federações que os reduziram, como a inglesa) e já com 3 ou 4 jornadas do campeonato disputadas, escrevo, sobre as primeiras impressões do Benfica 2018/19.
Uma pré-época - como se convencionou chamar aos jogos que são antes de serem a ‘sério’ - que me pareceu positiva. Desde logo, porque não se jogou contra equipas do Luxemburgo ou da terceira divisão, mas sim contra formações de valia em torneios prestigiados. Depois, porque no seu início já foram integrados novos jogadores, quer contratados, quer promovidos. Terceiro, porque o planeamento das viagens e dos estágios foi adequado. Pena, no entanto, que para a ‘Eusébio Cup’, depois de uma época em que absurdamente não teve lugar e uma anterior jogada em Monterrey no México, tenha sido inventada uma absurda sobreposição com a última ronda da competição que o Benfica disputava. Tenho para mim que a Taça em honra desse grande jogador e benfiquista que foi Eusébio da Silva Ferreira deveria ser todos os anos disputada no seu Estádio da Luz, com todas as honras e simbolismo. Assim é lamentável…


Como já afirmei, escrevo antes do primeiro jogo a doer. E, também, diante da saga Jonas que vai para as Arábias, de manhã sem dores nas costas e fica na Luz, de tarde com as costas doridas.  Por favor, decidam-se!
Do que gostei mais e do que mais dúvidas me suscita?


Em primeiro lugar, quanto ao titular da baliza, acho que as dúvidas foram dissipadas: o alemão de nome grego Odisseias Vlachodimos é o que mais garantias parece dar, ainda que tenha de provar poder aproximar-se de um tipo de guarda-redes que dá mesmo pontos. Uma equipa com a ambição do Benfica precisa de um guardião que faça a diferença. Infelizmente, depois de Oblak, Júlio César e Ederson (ainda hoje não ‘engulo’ a sua prematura saída com retorno financeiro relativamente reduzido), a equipa anda à procura de um substituto à altura. Svilar tem boas características, mas ainda um longo caminho a percorrer. Quanto ao greco-alemão, a ver vamos…


As principais boas surpresas acabaram por vir de quem menos se esperaria: Alfa Semedo e Gedson Fernandes. Dois jovens que não enganam e que, se não se deslumbrarem, podem ser muito úteis, como titulares ou suplentes, ao longo de uma extensa temporada.


Dos que vieram de fora, o mais rotulado Facundo Ferreyra ainda está longe do que dele se espera, embora o sistema de jogo mais usado não o tenha ajudado até agora. O chileno Nicolas Castillo pode ser um bom elemento, sobretudo em jogos de ataque constante e de intensidade física mais prevalecente. Com ou sem Jonas? Sinceramente receio que, sem ele, não haja, de imediato, sucedâneo para o toque de classe (e inteligência) do melhor jogador encarnado dos últimos anos.


Quanto aos defesas-centrais, Lema nunca o vi jogar, Conti tem ‘pinta’, mas é ainda algo ingénuo para o ritmo deste lado do planeta. Por tudo isto, Rúben Dias é fundamental ao lado de Jardel e, espero, que a sua quase obrigatória transferência para outros voos, aguarde pelo menos um ou dois anos.


Em boa e promissora forma estão André Almeida (que, todavia, continua a ser pouco valorizado), Salvio (se não sair), Pizzi e Fejsa. Aguardo uma maior integração de João Félix que, estranhamente, foi ainda pouco utilizado e de Jota que merece ser gradualmente integrado na equipa principal. Zivkovic tem tido o problema de poder fazer várias posições, o que não é a melhor solução para o atleta. E falta um dos melhores reforços que é o croata Krovinovic que, em condições normais, terá lugar no onze inicial.


Uma nota final para referir quanto me continuam a intrigar situações de jogadores contratados que nem sequer uma vez passaram pelos balneários da Luz. Que é feito, por exemplo, de um sueco de nome Erdal Rakip contratado em Janeiro e logo remetido para um clube inglês e que, neste início de época, ‘ninguém’ sabe dele? Ou do atleta vindo do V. Setúbal, João Amaral, que foi contratado num dia e vendido no outro para a Polónia, sem que nada de bom (ou de mau) tivesse provado? E outros que me dispenso aqui de citar. Que razões ou justificações para estas transumâncias e que racional para este tipo de scouting?