A testosterona de Semenya
A atleta sul-africana Caster Semenya poderá voltar a competir provisoriamente sem restrição na categoria feminina depois de o Supremo Tribunal Suíço ter suspendido regra da Federação Internacional de Atletismo que a obrigava a regular a testosterona com medicamentos. Para ser menos masculina. O assunto é fundamental: se no desporto admiramos o especial até que ponto podemos demarcar o que Semenya tem de exclusivo, sobretudo tratando-se de algo congénito?
A questão é científica e por isso compartilho explicação do professor Robert Sapolsky, autor do aconselhável livro Behave (2017), que elucida sobre o fundamento dos nossos comportamentos, das reações químicas e neurológicas às culturais. Diz ele sobre testosterona: «É a testosterona que faz despertar os neurónios para que conduzam impulsos de agressividade? Não. Se - e apenas se - esses impulsos já estiverem em ação faz com que atuem mais depressa. A testosterona não toca em nós a música militar, tão-só aumenta o volume se ela já estiver a tocar. Por exemplo: na Índia e no estado americano do Texas já houve ordens judiciais para castrar quimicamente criminosos sexuais, precisamente bloqueando os recetores cerebrais da testosterona, na amígdala. Acontece que, dizem os resultados, pegar num macho, de qualquer espécie, e castrá-lo - quimicamente ou por mutilação - reduzirá, sim, a testosterona, porém nunca a zero, não a elimina. Mais: quanto mais agressivo o macho tiver sido antes da castração mais agressivo continuará a ser, por comparação. Noutras palavras, quando mais agressivo se é menos essa agressividade fica dependente de questões hormonais e mais dependente fica de efeitos ambientais, culturais.»
Reduzam ou não agora a testosterona a Caster Semenya, ela continuará a ser a Caster Semenya que é.