A forma(ta)ção dos plantéis
1 - Este tempo de pousio futebolístico é tempo de renovada esperança e de algum optimismo nos adeptos de qualquer clube. Não tanto pelas certezas - melhores ou piores -do plantel que continua, mas muito mais pelas incertezas dos que chegam aureolados de craques. São as fantasias de defeso, período no qual se pode dar azo a todos os sonhos no próximo futuro, pois que não se trata de ganhar ou perder, mas tão somente de gerir uma conta pessoal das expectativas do (ainda) desconhecido.
Cada vez mais global, o período de compras e vendas e de achados e perdidos no futebol alimenta-se da ilusão casada com a esperança. E o que vemos e observamos? Um ilustre desconhecido alcandorado a atleta de eleição, um jogador que passou por n clubes nos últimos tempos sedentarizado por uma aquisição prometedora, um qualquer cartomante opinativo a discorrer sobre a magia do pé esquerdo ou direito de um rapaz que acaba de assinar, uma chegada a um qualquer aeroporto em apoteose de penteados e tatuagens, com declaração de amor eterno ao novo clube, uma promessa adiada noutras paragens mas que agora vai aproveitar uma nova fase para definitivamente explodir. Etc.
Por cá, entre os adeptos de clubes mais rivais, fazem-se contas (não financeiras) entre os meus craques anunciados e os dos outros. Umas vezes, em modo de euforia, outras em sistema de alerta, e tantas vezes não disfarçando o temor ou a inveja de um negócio perdido para os outros.
Tenho evitado escrever sobre o vaivém das últimas semanas e que ainda deve estar para durar. Primeiro, porque não acompanho tanta descoberta ou achamento de jogadores transferíveis. Depois, porque nestas questões sou como São Tomé: ver para crer, ainda que, em dias de melhor disposição, seja tentado a crer sem ter visto.
2 - No Sporting, há a saga em torno de Bruno Fernandes, com os constantes alertas televisivos de que num «amanhã» chegará a proposta tão anunciada. Acontece que o «amanhã» ainda não foi hoje, nem ontem, passando até para «depois de amanhã» ou «o mais tardar, dentro de dias», numa corrida contra o tempo, já que o mercado britânico fecha em 8 de Agosto. Informam os media que, depois de uma primeira sondagem do Man. United em redor de pouco mais de 30 milhões de euros, estará iminente uma subida dos valores para mais de 50 milhões (o que, descontando a parte destinada à redução de passivo bancário, as comissões e a pequena percentagem de direitos económicos da Sampdoria, ficariam, em termos de tesouraria líquida, reduzidos a cerca de metade). Valor que ainda não chegou aos 70 milhões que Varandas assumiu publicamente como a linha vermelha (apesar da cor da linha). Se eu fosse sportinguista, desejaria que o atleta permanecesse na equipa, pois sem ele perde-se desportivamente mais do que, financeiramente, adiando por um ano o dinheiro a encaixar da transferência. Evidentemente, tudo isto na minha ignorância do aperto financeiro dos leões que paira nas notícias. Nestas coisas, parto de um princípio: só os resultados desportivos dão retorno sustentável. Que o diga o acesso directo à Champions.
No respeitante ao FC Porto, na minha opinião, há dois pontos mais significativos, depois da debandada de Herrera, Brahimi, Óliver, Felipe e Militão, para além da impossibilidade de Casillas: uma boa aquisição desportiva, a do japonês Nakajima (que sempre desejei para o Benfica), mas com lógica financeira pouco compreensível, e as peripécias em torno de um novo guarda-redes titular. Não as contei, mas devem andar por volta de uma dezena, as possibilidades goradas, aventadas ou faladas. Aguarda-se o próximo capítulo ou o capítulo a seguir ao próximo.
3 - Quanto ao meu Benfica, detenho-me um pouco mais, evidentemente. Duas saídas de tombo, e que saídas! Sobre Jonas, já aqui escrevi quanto lamento o fim da sua carreira e a falta (mesmo que jogando menos) que, em melhores condições físicas, ainda faz à equipa. Quanto a João Félix, reitero a pena em vê-lo partir, depois de 4 meses na principal equipa. Os valores financeiros atingidos a isso obrigaram. E há o adeus de Salvio, um jogador campeão que sempre apreciei e que deixa saudades.
Absolutamente notável a arrecadação monetária das transferências e da entrada directa na Champions (tudo resultado de uma excelência desportiva) que, em termos brutos, não andará longe dos 250 milhões! Mas não há bela (financeira) sem senão (desportivo). Como uma equipa não se reduz a uma folha de Excel, tudo estará centrado no modo como se vão suprir as ausências.
Do meu ponto de vista, há um jogador que, suspeito, vai ser marcante na época que está a começar: Chiquinho. Inteligente, sereno, boa visão de jogo e com plasticidade táctica, fazendo vários lugares. Dos contratados, vindos do exterior, estou positivamente expectante quanto ao espanhol Raul de Tomas e ao brasileiro Vinícius (que custarão em conjunto 1/3 da transferência de João Félix, ainda que pagos em vários anos…). Confio que Bruno Lage vai saber aproveitar o que melhor eles têm e potenciar lacunas que lhes são apontadas. Não esqueço, também, dois magníficos reforços, quando faço a comparação entre o início da época passada e desta: Samaris e Gabriel, para além de Ferro e Florentino (e porque não Taarabt?). Já quanto a Jota vejo-lhe muito potencial, assim ele esteja propenso a pô-lo, com cabeça, ao serviço da equipa. Lembro-me de que apreciei o lateral-direito Ebuehi nos jogos de preparação do ano passado. Depois de um ano sem jogar por grave lesão, aguardo com interesse a sua progressão, para ajudar o titular André Almeida. Quanto aos promovidos da formação, veremos mais tarde.
Um ponto, porém, me intrigou: a novela em torno de um novo guarda-redes. Do italiano que esteve com um pé na Luz (ou estará à condição?, como, com sentido de humor, Vítor Serpa aqui escreveu no domingo), era conhecido o seu cadastro clínico de duas roturas de ligamento e de recente operação a um ombro (zona muito sensível para um guardião). Por isso, melhor seria que os exames médicos feitos em Lisboa tivessem precedido o acordo com a Juventus. Assim, registando embora a exigência e o rigor dos exames feitos pelo Benfica (que importa realçar, não são uma mera formalidade), uma contratação anunciada categoricamente virou uma trapalhada de que ninguém saiu ileso: nem o Benfica, nem o jogador, nem a Juventus, nem o negócio, nem a negociação paralela de João Ferreira. E também Vlachodimos. Primeiro, este keeper passou de titular indiscutível a suplente e até a transferível. Num ápice volta a titular. Nesta girândola, Svilar que ia ser emprestado para rodar, ficaria depois como suplente de Perin, para agora voltar à posição inicial de 2.º ou 3.º guardião. Imagino quão necessário será agora assegurar a estabilidade e confiança psicológicas do homem da selecção grega, agora que volta a titular sob a condição de, em Janeiro, depender do ombro do italiano e ter sempre na cabeça as críticas de «jogar menos bem com os pés» e de «sair dos postes com deficiências», de que é recorrentemente acusado. Em boa verdade, a odisseia de Odysseas na temporada finda foi globalmente muito positiva. Cometeu erros (quem não os comete?), mas foi decisivo em alguns jogos. Em suma, muita confusão e, como dizia o artista, «não havia necessidade».
Quanto ao resto do plantel, ponho uma velinha com muita cera até 31 de Agosto, para que Rúben Dias e Grimaldo, continuem no meu clube.
Por fim - e bem importante - a época começa com a estabilidade de se ter um treinador que deu provas sobejas de que sabe superar obstáculos que sempre se colocam nestas fases. Com o seu avisado, sereno e competente discurso e sem a habitual correcção futebolística, resumiria nas palavras de Bruno Lage, há dias ditas em Stanford, um elemento crucial na estruturação do seu (e meu) plantel: «Como o Benfica oferece tanto conforto, eu quero tirar-lhes o conforto do jogo. A pior coisa que temos é sentirmo-nos confortáveis e pensar ‘estou a jogar, ninguém me vai incomodar, estou confortável’. Conforto é o bem-estar que os atletas querem ter. O outro conforto é o que quero tirar. […] Para ser justo para todos, eles têm de pensar que estão a competir com um colega por um lugar. Nós queremos ser competitivos criar esse desconforto nos jogadores. Eles não podem pensar que estão seguros na posição. Tem de pensar ‘amanhã o meu colega está a fazer a mesma coisa para lutar pelo meu lugar’». Para bom entendedor…