A Champions dos portugueses

OPINIÃO07.09.202206:30

Há a dos nossos três grandes, remediada, e a Champions dos emigrantes de luxo (no Liverpool, PSG, City…): esses vão lutar pelo título europeu

A 30.ª edição da Champions League começou ontem com duas surpresas - a derrota do Chelsea em Zagreb e o triunfo categórico do Shakhtar em Leipzig, Slava Ukraini! - mas não é preciso ser bruxo para adivinhar que o vencedor (final a 10 junho de 2023, em Istambul) vai sair de uma liga big five. Os candidatos são os de sempre: Real Madrid, Liverpool, Bayern, City, Barcelona, Chelsea e PSG, não necessariamente por esta ordem; mas algo me diz que este ano podemos ter finalmente uma das equipas sustentadas por estados árabes (City-Abu Dhabi ou PSG-Catar) no rol de campeões. Este algo tem nome: Erling Haaland no caso do Manchester City - o goleador norueguês, que ontem bisou em Sevilha (3-0), parece ser a peça que faltava ao puzzle meticulosamente construído por Guardiola, a julgar pela carrada de golos que tem marcado (vai com 12 em 8 jogos!); Luís Campos no caso do PSG - o português homem forte do futebol, em sintonia com o treinador Galtier (um disciplinador), mudou as regras do jogo, viciadas há demasiados anos. Injetou sangue fresco na equipa, desfez-se de vários jogadores aparentemente acomodados (não esquecer que Neymar estava na lista) e instituiu um código comportamental mais duro e exigente do que aquele que vigorava no Parc e que parecia importado de um estúdio de Hollywood.
O resultado do safanão está à vista: o PSG, mesmo com uma ou outra birra das divas (Mbappé à cabeça, o novo estatuto ter-lhe-á insuflado o ego…), está mais focado e competitivo e surge mais perigoso que nunca com Neymar a jogar de raiva (fabuloso o passe para o primeiro golo do PSG, ontem), Messi mais próximo do nível habitual e Mbapeé (mais um bis!) a mostrar por que é considerado o melhor futebolista do planeta. O que a Juventus sofreu ontem (o 2-1 final é enganoso, a Signora podia ter sido goleada), muito mais equipas vão sofrer. Se este trio se mantiver unido e focado até ao final da época (vamos ver o que acontece no Mundial), Paris pode finalmente reinar na Europa e deixar de olhar para Marselha com a azia de saber que veio dali o único campeão europeu francês (1993, Munique).
Tanto no caso do City como no do PSG, há uma forte componente portuguesa na época que pode vir a ser a tal. Bernardo, Cancelo e Rúben Dias em Manchester; Nuno Mendes, Danilo, Vitinha e Renato em Paris (além de Campos e de Antero Henriques, o homem do mercado). Estes, ao contrário dos que integram os plantéis do FCP, SCP e SLB, são os portugueses que, juntamente com Diogo Jota e Fábio Carvalho (Liverpool), vão assumidamente lutar pelo título europeu. Bernardo queria sair do City para jogar em Barcelona, mas já deve ter percebido que a equipa, com Haaland, fica muito mais perto de ganhar a orelhuda. O gigante norueguês tem golo que nunca mais acaba e até obrigou Guardiola a simplificar um esquema quiçá excessivamente barroco para o perfil da Champions (tanto passe, tanta triangulação…), onde a verticalidade, o poder atlético e a eficácia na zona de definição continuam a valer mais que a sofisticação tática.    
Na jornada de ontem, o Benfica demorou mas cumpriu a sua obrigação de vencer em casa o adversário mais fraco do grupo, o aguerrido e incipiente Maccabi. 2-0, golão de Grimaldo e aí estão dez triunfos seguidos (golos: 27-3) para Roger Schmidt, uma bela proeza! O Benfica quase garante um lugar na Liga Europa antes dos quatro jogos de dificuldade elevada com Juventus e PSG.
Quanto aos jogos de hoje. O FC Porto não está mais forte do que na época passada, quando foi ao Metropolitano jogar para ganhar (ficou 0-0), mas espera-se que mantenha a forte personalidade europeia que lhe permite entrar em qualquer estádio com a convicção de que vai conseguir impor o seu jogo (algo que demora muitos anos a construir e consolidar). Sérgio e Simeone, antigos colegas na Lazio, são ambos híper competitivos e emotivos, mas o treinador argentino claramente estagnou. O Atlético não cresce, incapaz de sair do mesmo registo há anos. Luta muito, joga aos solavancos e o seu futebol não entusiasma ninguém. Há em Espanha equipas muito mais interessantes.    
O Sporting tem um jogo difícil na Alemanha, onde só por uma vez em 14 visitas não saiu derrotado (Bayern, 0-0 a 31 outubro de 2006). O Frankfurt, pelo que se tem visto (4-0 ao Leipzig…), está em boa forma e quererá festejar a estreia na Champions com uma vitória em casa. Coesão, espírito de entreajuda e lucidez é o que os jogadores do Sporting precisam de ter quando o bombardeamento alemão começar. Se conseguirem ter bola, podem refrear, quiçá estancar o ímpeto dos panzers. Começar a perder é que não pode voltar acontecer - alguma coisa o Sporting deve ter aprendido com a campanha passada.
 

Bernardo Silva, João Cancelo e Rúben Dias (marcou um golo), trio português do City que ontem venceu (4-0) no terreno do Sevilha


FC PORTO, NAVIO ALMIRANTE

O FC Porto disputa a sua 26.ª Champions em trinta edições, o que faz da equipa portuguesa um clássico da prova. Veja-se o desempenho portista nas diversas fases da Champions e compare-se com o registo dos parceiros de grupo - e faça-se o mesmo exercício nos grupos do Sporting e do Benfica; também por ser, com o Ajax, o único clube fora das big five que ganhou a Champions (2004), o FCP continua a ser a referência indiscutível do futebol português na competição, apesar de na época passada ter sido o único dos três portugueses que se quedou pela fase inicial.
Com um saldo largamente positivo entre qualificações e eliminações na fase de grupos (16/9), ao contrário de Benfica (6-10) e Sporting (2-7), a equipa portista é, no conjunto das doze que integram os três grupos dos portugueses, uma das três com finais vitoriosas. Há um estreante absoluto no grupo do Sporting (Frankfurt) e dois que nunca passaram da fase de grupos: Brugge (grupo do FCP) e Maccabi Haifa (SLB). Águias, leões, Brugge e Maccabi Haifa são os quatro que nunca chegaram às meias-finais (os leões nunca passaram dos oitavos), mas não há mal que dure sempre. Felicidades para os três!