A arbitragem vai nua!...

OPINIÃO20.05.202223:46

Árbitros portugueses não têm capacidade para estar no Mundial, porque não estão realmente a um alto nível, bem pelo contrário

Acomunicação social deu conta neste final de semana que os árbitros portugueses estão fora do Mundial de 2022 que terá lugar no Catar. Surpresa? Só para alguém que viva em Marte e não tenha nada a ver com o futebol nacional!...
E respondo à sondagem deste jornal - de quem é a culpa e por que razão não foi chamado qualquer árbitro português para o Catar - não com a colocação de uma simples cruz nas várias opções que são dadas, mas com uma resposta curta e directa: a arbitragem portuguesa não presta, não é independente e isenta e a culpa é do Conselho de Arbitragem da FPF e da APAF, que são uma e a mesma coisa, e ambas sem qualidade. Até um cego vê isto, mas, como todos sabemos, o pior cego é aquele que não quer ver. E ponto final parágrafo!

Foi há mais de 20 anos que o Sporting decretou o «luto pelo futebol nacional», em consequência de uma série de erros de arbitragem, mais ou menos negligentes e sobretudo, mais do que menos, intencionais, que subtraíram 10 pontos à equipa leonina e feriram de morte a verdade desportiva do campeonato. Então como agora, e pelo meio, o sector enfrentou, enfrentava e enfrentará, se não alterar esta mentalidade medíocre, um período de grande contestação. O Sporting colocou mesmo a bandeira a meia haste. Essa tomada de decisão inédita ganhou forma na jornada seguinte, frente à Académica (5-0), a 31 de janeiro de 1999. Os jogadores sportinguistas entraram em campo com braçadeiras negras; os estudantes envergaram as tradicionais capas negras de Coimbra. «Burlesco» foi a expressão usada pela imprensa alemã para a situação vivida. Vale e Azevedo, então presidindo ao Benfica, e ainda gozando a liberdade para poder dizer disparates (e não só), considerou a iniciativa «ridícula», o que também não admira, porque certamente se via ao espelho todos os dias quando se levantava da cama. Como disse então o presidente do Sporting, José Roquette, «não contem comigo para desgastar a imagem desse senhor, ele próprio o faz sempre que abre a boca».
 

Mundial do Catar sem árbitros portugueses? Surpresa? Só para alguém que viva em Marte


Recordo, aqui e agora, esse momento de luto nacional pela arbitragem apenas para dizer aos senhores do Conselho de Arbitragem e da APAF que se deveriam inspirar nesse gesto simbólico do Sporting, para agora decretarem para si próprios o luto na arbitragem, fechando a porta das suas instalações, comunicando o sucedido na porta e, de seguida, finalmente, num gesto de humildade e dignidade, porem o lugar à disposição, isto é, demitirem-se. Estão ainda à venda muitas canas de pesca, baralhos de cartas ou simplesmente lindas paisagens em Portugal com que se podem entreter, dando lugar a uma outra geração de dirigentes da arbitragem e de árbitros.

Mas não acredito que larguem o poder para que melhor se possa vir a arbitrar, porque o seu objetivo é continuar a controlar e condicionar a verdade desportiva, num exercício corporativo em que se protegem uns aos outros, incluindo os que comentam.
Para verem que tenho razão basta atentar naquilo que disse Pierluigi Collina, presidente do Comité de Árbitros da FIFA, no seguimento do anúncio dos 36 árbitros principais, 69 assistentes e 24 que estarão presentes no VAR escolhidos para ajuizar no Mundial no Catar, esclarecendo que o critério utilizado foi, como sempre, e em primeiro lugar, o da qualidade pelo que os árbitros selecionados representam o sector ao mais alto nível à volta do Mundo. Ora, sendo a qualidade o primeiro fator de escolha, é evidente que nenhum árbitro, VAR ou assistente português iria estar no Mundial do Catar. Nem vale a pena percorrer os outros factores de escolha, porque nenhum dos árbitros portugueses tem capacidade para estar no Mundial, porque não estão realmente a um alto nível, mas, bem pelo contrário, e por culpa própria, num nível muito baixo, em termos de qualidade e credibilidade.

De seguida atente-se nas palavras do presidente da APAF: «Estamos tristes.» Tristes? Deviam era estar envergonhados, e não terem a lata de, pela boca do presidente da classe, dizerem que são tão competentes como os que foram nomeados. Se são tão competentes, então porque foram excluídos? Por outros factores? Bem, o melhor é não ir por aí, porque podemos chegar a tristes conclusões - essas sim bem tristes!...
Disse ainda o presidente da Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF), Luciano Gonçalves: «Ficamos tristes por não termos nenhum representante no Mundial, mas também temos de ter a consciência de que não são só questões desportivas a pesar na decisão, são também políticas e todos temos de fazer mais e melhor para inverter essa situação. Não termos um árbitro que esteve nas meias-finais da Liga Europa [Artur Soares Dias] não faz sentido. Quando o critério não se relaciona com meritocracia, não tem a ver com notas, classificações e rendimento, está tudo dito.»

Leio, e não acredito, que o senhor Luciano Gonçalves tenha o desplante de dizer que não são só os aspectos desportivos a pesar neste tipo de decisões, mas também políticos! Tem toda a razão, senhor Luciano Gonçalves: aqui, os senhores da APAF - um organismo de classe - dominam o Conselho de Arbitragem e influenciam-no como e quando querem, numa manobra corporativa de defesa de interesses particulares, à boa maneira de Salazar que também se sustentava nos interesses corporativos; lá fora, se os senhores forem conhecidos, não é certamente pelo que fazem pela arbitragem, que, a meu ver, só prejudicam, mas por outras razões que nem sempre são as melhores. Lá fora, não é relevante que Artur Soares Dias seja o presidente da assembleia geral da APAF; lá fora, para arbitrar, não é necessário nem arrogância, nem vaidade, mas competência. E vaidade e arrogância são normalmente usadas para tentar esconder a incompetência ou outros defeitos de carácter ou personalidade.

Diz ainda o senhor Luciano: «Temos de pensar também no que podemos nós melhorar e fazer de forma diferente...» Porém, não há hipótese de melhorar nada, e, muito menos, mudar o que quer que seja, com esta gente que domina a arbitragem. Esse trabalho de mudança, que se impõe, já não pode ser levado a cabo por gente viciada num sistema incompatível com a alta competição. É preciso uma nova roupagem, um novo sistema, nova gente, credibilidade e transparência, que tire a arbitragem da miséria e mediocridade em que caiu.
A arbitragem, tal como está, vai nua! E foi apenas isto que a FIFA disse!...


DOIS TERÇOS DE UMA VIDA

NÃO tenho Facebook, ou outra forma de comunicar, para partilhar com os meus amigos e leitores aspectos, pelo menos para mim, relevantes da minha vida. Natural é, portanto, que seja num jornal, ainda que desportivo, como este, que exerça o meu direito à liberdade de expressão e opinião. Só tenho de estar grato pelo facto deste jornal me proporcionar essa liberdade e essa independência que tenho procurado manter ao longo dos meus já 75 anos de existência.
Dois terços dessa vida foram dedicados à advocacia, não só por vocação, mas também por influência de uma ascendência que vai até ao meu bisavô votada e devotada à Justiça e ao Direito. Na quinta-feira passada, dia de São Ivo, o santo padroeiro dos advogados, eu e outros advogados fomos agraciados com uma medalha evocativa de 50 anos de advocacia ininterrupta.
Não posso esconder que isso me enche de orgulho e sobretudo satisfação por ter sido essa a profissão que me proporcionou ser um homem livre e independente, sobretudo, no pensamento e na acção.
O meu Pai, que exerceu também esta nobre profissão durante mais de 50 anos, nuns versos que me dirigiu no final do meu curso, em 1970, sabendo da influência que tivera na escolha do curso e da vida profissional futura, terminava assim:

Meti-te neste sarilho,
Tu desculparás, meu filho.
Direito-Legislação
Tem cunho, tem atracção,
Mas quando passar’s à liça
E conhecer’s a Justiça…
Confia na ilusão !


Há 50 anos eu tinha a ilusão da Justiça; hoje, 50 anos depois, a Justiça é uma desilusão. O meu Pai, porém, não me deve um pedido de desculpa. Voltaria a percorrer o mesmo caminho - com liberdade e independência, que foi a grande herança que me deixou.