2.ª circular e margem sul

OPINIÃO13.06.202003:00

Já não sei se o problema está na 2.ª circular, onde as claques dos respectivos clubes se confrontam, ou na margem sul, onde as claques dos clubes atacam os seus próprios jogadores. Pouco mais de dois anos separam os ataques aos jogadores do Sporting e do Benfica na margem sul do Tejo!  No caso do Sporting, o ataque foi dirigido aos jogadores e treinadores que se encontravam em 15 de Maio de 2018, na academia de Alcochete; no caso do Benfica, o ataque foi perpetrado contra a camioneta que levava os jogadores para o Seixal. Há quem diga que o ataque à academia do Sporting não tem nada a ver com o ataque à camioneta do Benfica à pedrada quando ia a caminho do Seixal. Parece realmente que não, mas só para as entidades mais altas deste País, que antes se indignaram e agora se confinaram ao silêncio!
Mas eu, como muitos outros, perguntamos onde está a diferença? Não é preciso ser muito inteligente para responder que a diferença está na maior gravidade do ataque à camioneta que transportava os jogadores e treinadores do Benfica. Na verdade, o ataque de Alcochete visou a integridade física dos jogadores e treinadores, mas nem de longe, nem de perto, houve intenção de matar quem quer que seja; no caso da A2, o arremesso daquela pedra visando o vidro da frente da camioneta, podia atingir o motorista e, em consequência, o despiste do veículo e, provavelmente, a morte de alguns dos seus ocupantes. Isto é, enquanto o acto de Alcochete visou molestar, no caso da A2 não se quis apenas molestar e admitiu-se matar! Senhores analistas e comentadores, sejam objetivos e rigorosos, e não queiram pôr o negro todo em Alcochete e branquear o acontecido na A2, como que a pensar apenas na diferença dos calções do equipamento tradicional dos dois clubes. Não há grande diferença nestes ataques: ambos são um acto criminoso praticado contra jogadores e treinadores do Sporting e do Benfica, profissionais e chefes de família.
Fazendo algum exercício de memória, mais recente ou mais remota, recordo que no dia do ataque à academia, em Maio de 2018, o então presidente do Sporting, ora absolvido da acusação de autor moral, reagia em declarações prestadas algum tempo depois, dizendo que foi chato, mas no dia seguinte seria outro dia e era preciso perceber que o crime faz parte do dia a dia. Não me passou pela cabeça que tivesse sido o autor moral, mas nesse momento deixou de ser o meu presidente, depois de nele ter votado em 2017! O presidente do Benfica não reagiu dizendo que era chato e que no dia seguinte seria outro dia. Quem estava chateado era ele, mas com o empate com o Tondela. E como não se deve guardar para amanhã o que se pode fazer hoje, indiferente ao estado psíquico dos jogadores, vai de os desancar pelo dito empate que estragou o gozo que lhe havia causado a derrota do Porto em Famalicão! A pedrada no seu ego foi muito mais importante e doeu mais que a pedrada que atingiu o vidro da frente da camionete. Manda-se pôr um novo, que dinheiro não falta! Recuando algum tempo, veio-me à memória aquela célebre tentativa de fazer piada perante a morte de um adepto do Sporting: «Sendo adeptos do Sporting, o que estavam a fazer na Luz às três da manhã? Não seria certamente para tirar fotos ao Cosme Damião ou ao Eusébio.» A mesma indiferença com que sempre encarou os sons a imitar o very-light que foram a causa da morte de um adepto do Sporting, que não estava na Luz às três da manhã, mas assistindo pacificamente, no Jamor, a uma final da Taça de Portugal, em 1996!
Mas avançando de 1996 para 2009, lembro-me de uma notícia que vinha no Diário de Notícias, sob o título:  «Vieira protege cabecilhas dos No Name Boys, diz PSP.» E nessa notícia fazia-se menção a um relatório da PSP, que aliás foi presente ao Conselho Nacional de Desporto, de que eu então fazia parte. «De acordo com este relatório, Vieira reuniu-se, a 18 de Junho de 2008, com Zé Gago, elemento dos No Name Boys, oferecendo-lhes total apoio», afirmando que iria devolver a sede à claque, despedir o chefe de segurança Paulo Dias por ajudar a PSP e autorizar o uso de tochas dentro do estádio. A ocorrência deste encontro foi detectada através das escutas a Hugo Caturno, elemento «extremamente violento» da claque. Numa conversa gravada entre Caturno e Zé Gago, este disse que Vieira lhe prometera que na época seguinte não haveria polícia na zona da claque, que autorizaria o uso de tochas, que iria devolver a sede à claque, com obras custeadas pelo clube, e que iria «tratar da polícia em três tempos» e «correr com Paulo Dias». Paulo Dias é o chefe de segurança que auxiliou a PSP a identificar vários dos 31 alegados criminosos detidos pela Divisão de Investigação Criminal da PSP de Lisboa, em Novembro do ano passado. Segundo o relatório da PSP, Vieira tentou cumprir uma das promessas ao pedir a Diamantino Gaspar, comandante da PSP de Benfica, para «aliviar» a presença policial junto dos No Name Boys. A questão não é da 2.ª Circular na margem norte ou de Alcochete e Seixal na margem sul. A questão não é de margens, mas de marginalidade e da indiferença com que é encarada em Belém, em S. Bento ou no Terreiro do Paço. Fernando Gomes escreveu há dias que as pessoas podem viver sem o futebol e, na sequência, eu acrescentei que viveria melhor sem certas pessoas. Com estas, dificilmente o futebol sobreviverá!

Pensar verde e branco (8)

pensar verde e branco não é apenas o título que tenho dado a alguns dos meus artigos de opinião, ou os contributos valiosos que têm dado, em vários jornais, alguns sportinguistas preocupados com o futuro e o rumo do Sporting, como, por exemplo, Henrique Monteiro, em A BOLA, Tomás Froes, Rui Calafate, Carlos Cruz ou Poiares Maduro, no Record, ou Samuel Almeida, no Jogo. Vai ser, a partir de 16 de Junho próximo, a forma de pensar nas jornadas Sporting com rumo, iniciativa aberta aos sportinguistas, para discutir ideias, em vez de discutir pessoas. Discutir pessoas, sem discutir ideias, já sabemos os resultados que tem dado. É altura de ver se discutir ideias traz novo rumo, um novo pensamento sobre o futuro do Sporting, que nos consiga unir nos anos mais próximos. As duas primeiras sessões, 16 e 17 de Junho, versarão sobre a questão da governance, isto é, o modelo de governação do clube e da SAD. No primeiro dia, sob a moderação de Luís Marques veremos o que pensam Ângelo Correia, Carlos Feijó, Diogo Lacerda Machado, Jorge Coelho, Pedro Mourisca e Ricardo Silva Oliveira; no dia seguinte saberemos a opinião de António Pires de Lima, José Brás da Silva, Luís Filipe Meneses, Miguel Relvas e Samuel de Almeida, moderados por José Manuel Barroso.
Directamente ligado com o modelo de governance, mas não só, está o tema da revisão estatutária, essencial para o funcionamento no futuro próximo. Intervirão nesse painel dois antigos presidentes da AG, Sérgio Abrantes Mendes e eu próprio, e, como não podia deixar de ser, o actual, Dr. Rogério Alves. A estes se juntam três juristas: Alexandre Mestre, Alexandre Jesus e Rui Januário. A discussão sobre este tema terá lugar a 23, sob a moderação, em principio, de Nicolau Santos. No dia 24, Agostinho Abade, Carlos Vieira, Eduardo Baptista Correia, Miguel Frasquilho, Ricardo da Silva Oliveira e Sérgio Cintra defenderão os seus pontos de vista no que respeita à sustentabilidade financeira do clube e da SAD. Será moderador Henrique Monteiro, um homem também preocupado com o futuro.
A 30 deste mês, e moderado por Rui Miguel Mendonça, o tema será o futebol e as modalidades, que abordará, obviamente, o ecletismo do clube. Francisco Marcos, Luís Natário, Marco Caneira, Ricardo Pereira, Rui Oliveira e Toni Bessone de Bastos serão os intervenientes.
No mês de Julho, nos dias 7 e 8, os temas em debate serão, respectivamente, estratégia institucional e segurança e marca e comunicação. O primeiro, moderado por Carlos Andrade, terá a participação de António Martins da Cruz, Carlos Anjos, Miguel Poiares Maduro, Miguel Salema Garção, Rui Calafate e Tomás Froes; o segundo dia terá a intervenção de Carlos Miguel, Francisco Louro, Francisco Teixeira, Miguel Almeida Fernandes, Nuno Saraiva e Pedro Paulino, e será moderado por Vítor Cândido.
Creio que os painéis (com excepção da minha pessoa) são garantia de umas jornadas que possam ser benéficas para o rumo do Sporting. Um rumo firme e sustentável, que nos permita, como disse há uns tempos atrás, remar unidos, para dentro e para fora, esquecendo divergências inúteis e querelas desnecessárias. Podemos enfrentar uma difícil situação económica e financeira, mas um debate sério das ideias será certamente enriquecedor. O Sporting não deve, e não pode ter medo de discutir o futuro. O Sporting não pode, e não deve ter medo de definir o seu próprio rumo!...