Vieira, Varandas e … Europa
Quase quarenta mil sócios votaram nas eleições para a presidência do Benfica. Uma vitória da dinâmica popular de um clube que tem, realmente, em Portugal, uma dimensão única.
Luís Filipe Vieira, como se esperava, venceu com mais de sessenta por cento dos votos, o que não merece qualquer tipo de dúvida. No entanto, torna-se interessante olhar para os quase trinta e cinco por cento de sócios do Benfica que concentraram os seus votos em João Noronha Lopes e que o coloca numa das linhas de sucessão.
Tratava-se de um candidato que carecia de apresentação e reconhecimento públicos. Fez uma campanha argumentativa, não populista, e tinha, de facto, com ele, um importante grupo de apoiantes, com fácil acesso mediático.
Desejará Noronha Lopes levar a sério esta recomendação dos sócios para que não fique longe da oportunidade de mudança?
Sendo verdade que uma parte significativa da votação em Luís Filipe Vieira vem do setor mais reconhecido do clube, sobretudo aquele que melhor se lembra da distância do Benfica atual para o desolador e caótico tempo de João Vale e Azevedo, também é certo que a descontinuidade já anunciada, pela sua saída de cena, no final do mandato, quase em termos de uma abdicação para Rui Costa, pode potenciar mais amplas condições de mudança.
Noronha Lopes é, neste momento, a figura para a qual os oposicionistas do regime olham. Ou aceita essa condição e mantém-se um candidato viável, ou desiste e abre caminho para uma sucessão mais institucional e dinástica.
O contra-ataque de Frederico Varandas a Pinto da Costa foi surpreendentemente duro e avassalador. Algo do género de ter saltado a tampa de uma cafeteira a ferver. Ao dizer o que disse, Varandas sabia estar a reafirmar, sem margem para recuo, uma política de distanciamento dos tempos de históricas alianças com o FC Porto contra o poder do Benfica.
A violência das suas afirmações sobre o processo Apito Dourado é definitiva e a sua razão, generalizadamente reconhecida. A escolha feita é, agora, programática. O Sporting de Varandas será autónomo, correrá por fora contra uma velha política de alianças de interesses mais ou menos imediatos, que Pinto da Costa sempre soube controlar para benefício do seu clube.
No entanto, Varandas deverá perceber que o caminho escolhido, feito de independência e autonomia, é o das pedras, o mais duro, o mais complexo. O Sporting terá de o percorrer sozinho, com muita coragem, com muito espírito de sacrifício, com unidade maior e com uma visão larga do futuro.
O campeonato está, até agora, a correr bastante bem. Nada de espetacular, mas desportivamente competente. A oposição, ainda muito dividida entre o grupo dos históricos e o mundo das claques, irá manter-se, como sempre, na expectativa dos resultados. Por enquanto, a pandemia, que assola o mundo e Portugal, ajuda a desenvolver a gestão, num clima de falsas tréguas. Varandas terá de aproveitar muito bem este período para se reafirmar como presidente e, se tiver intuição e sentido estratégico, deverá admitir que está na altura de recuperar muitos dos sportinguistas que a sua inabilidade política afastou. Talvez não definitivamente.
Europa: FC Porto, SC Braga e o Benfica fizeram o pleno de vitórias nos seus jogos europeus. Uma jornada do otimismo que, para já, se deve assinalar e celebrar. Mas é preciso pensar que os principais clubes portugueses vão ter, pela frente, tempos difíceis, marcado pela crise económica que a pandemia irá acentuar no País. Também na Europa, é verdade, mas os meios e condições de recuperação não serão os mesmos. Cada vez se torna mais importante uma gestão rigorosa e responsável, que não pense, apenas, no jogo de amanhã.
Os exemplos e os ídolos
Fez bem a ministra italiana da saúde em recomendar outro sentido de responsabilidade a Cristiano Ronaldo, que colocara nas redes sociais uma mensagem de descrédito dos testes ao Covid-19, em Itália. Cristiano é um dos maiores influencers do mundo e estes são momentos particularmente sensíveis, que exigem de cada cidadão, e sobretudo dos mais famosos e mediáticos, a responsabilidade do estatuto de popularidade que conquistaram. Percebia-se a frustração do atleta, a sua obsessão por regressar, o mais rápido possível, ao futebol, mas teve de esperar… como qualquer comum e anónimo dos mortais.
Estes tempos de incertezas
Há uma decisão generalizada na Europa de não voltar a confinar totalmente… mas confinar parcialmente e, como diria qualquer comentador desportivo, à condição. A natural incoerência que esta opção promove nos decisores políticos, leva a maiores dúvidas, a muitas incertezas, inevitáveis inseguranças, a diferenças incompreendidas e, obviamente, a maior apreensão dos cidadãos. Em Portugal, existe uma nova política do «não se pode, mas…». No entanto, desta vez, não existem boas exceções na Europa. Nesse aspeto, não precisamos de ser alunos de ninguém.