VAR-dade
A chegada da videotecnologia levantou novas questões em torno da essência do jogo e da verdade desportiva. Passou a falar-se de erros da dupla árbitro/VAR, de quebra de ritmo de jogo e de esfriar de emoções. Fala-se também de boa ou má aplicação do protocolo, de (in)coerência de algumas intervenções e de maior ou menor sensibilidade para a função. Discurso diferente, sinal de que os tempos mudaram e de que as coisas evoluíram.
No caso concreto, percebe-se a efervescência da novidade. Esta é, de longe, a mais significativa alteração alguma vez introduzida no futebol. Gera desconforto e desconfiança, dúvidas e interrogações, críticas e divisão de opiniões. Há menos tolerância ao erro porque há mais meios para o evitar. É uma questão de expectativa, que se aceita e entende.
No que diz respeito à sua utilização, é inegável (e já aqui o dissemos várias vezes) que tem havido falhas, umas mais desculpáveis, outras menos compreensíveis. Mas é também inegável que isso não acontece apenas em Portugal. Se têm dúvidas, passem os olhos pela liga alemã, espanhola ou italiana e vejam algumas das decisões tomadas. Ouçam algumas das vozes que se levantam e as reações indignadas dos vários intervenientes no jogo. Tem sido, de facto, muito duro.
Esta constatação - da transversalidade do erro - não afasta a necessidade de tentar corrigir ou evitar equívocos, mas reforça a ideia de que não há premeditação nem favorecimentos. Não há maldade nem intencionalidade. Não há malandragem nem perseguição. O que há é muito trabalho pela frente. Cá como lá. Lá como cá.
Vendo a coisa com a devida distância e pragmatismo, é indiscutível que o recurso à tecnologia veio mudar tudo para melhor. Não é apenas uma opinião. É uma certeza, corroborada pelas várias dezenas de erros evitados, só na presente época.
Uma comparação: se todos testemunhámos, de forma quase unânime, os muitos lapsos cometidos nas meias-finais da Allianz Cup, é justo que agora tomemos como exemplo o que aconteceu no Sporting-Benfica de domingo.
Soares Dias, o mais categorizado árbitro português da atualidade (cuja qualidade e integridade estão acima de qualquer suspeita) realizou um bom trabalho, mas provou o que todos sabemos: que, em campo e entregue a si próprio, é muito difícil ver tudo e acertar sempre. Até para ele. Também para ele.
Valeu, em alguns momentos, a cumplicidade e competência de toda a sua equipa, nomeadamente do seu videoárbitro, no caso o internacional João Pinheiro: é que, se o jogo de Alvalade não tivesse tido VAR, o mais certo é que os golos de João Félix e Diaby teriam sido validados, Vlachodimos teria escapado à expulsão e o Benfica não teria sido penalizado com um pontapé de penálti.
No contexto atual e face à estratégia macificada de empolar drasticamente o trabalho das equipas de arbitragem... imaginam bem o que estaria agora a acontecer? Do que estaríamos todos a falar? E o aproveitamento que isso estaria a ter, aqui e ali, acolá e além? É preferível nem pensarmos nisso, certo?
Importante mesmo é não confundirmos a árvore com a floresta. Há, de facto, um longo caminho a percorrer, porque o diamante está em bruto, mas não duvidem: é valioso e importante para a imagem do futebol e para a justiça no jogo. Vai valer a espera. Confiem em mim.