Uma questão de ambição
JORGE JESUS disse, no final do encontro para a Taça de Portugal com o Paredes, aquilo que todos vimos. O Benfica fez um jogo demasiado fraco mesmo tendo em conta que se apresentou na partida com uma espécie de equipa B e se a ideia era, conforme assumiu, comparar os jogadores que habitualmente são titulares com aqueles que ficam, quase sempre, à espera de uma oportunidade, «muitos deles não conseguiram fazer a diferença». Fez bem, convém dizê-lo antes de mais nada, o treinador encarnado em apresentar o onze que apresentou. Não só para poupar aqueles que mais desgaste acumulam entre jogos pelo Benfica e viagens e partidas pelas seleções nacionais, mas também para procurar soluções (como também assumiu) para os cada vez mais imprevisíveis problemas que afetam qualquer plantel, e que estão, agora, a afetar o plantel encarnado, com os testes positivos de Darwin Núñez e Weigl. Jesus fez, em suma, o que lhe competia. Quem não fez o que lhe competia foram, em boa verdade, os jogadores em quem Jesus apostou.
Todos sabemos que defrontar o Paredes, ou qualquer outra equipa que compete no Campeonato de Portugal, não constitui um verdadeiro aliciante para um jogador que representa o Benfica e que sonha, natural e legitimamente, jogar de início no Campeonato, na Champions ou na Liga Europa. Percebe-se até que para a maioria defrontar o Paredes seja quase um frete. Mas, não querendo colocar em causa o profissionalismo, até porque o problema do Benfica na noite de sábado não foi a atitude em campo, para os jogadores que Jesus fez alinhar de início o encontro com o Paredes deveria ter sido encarado como se de uma partida de Liga dos Campeões se tratasse. Porque se tratava, para eles, de uma oportunidade (quase única para alguns, como já se percebeu) para mostrarem ao treinador, e aos adeptos, que merecem um lugar no onze noutros patamares, ainda por cima quando, na Liga ou na Europa, a equipa-tipo de Jorge Jesus não tem estado à altura das expectativas.
Sejamos francos. Daqueles que jogaram de início em Paredes, quantos merecem, pelo que mostraram, constar no onze que Jorge Jesus pensará para apresentar na Escócia? Um? Dois? Nenhum? É isso, a falta de ambição - bem mais do que a falta de inspiração... - que mais deve preocupar os benfiquistas. Olhemos para a forma como Toni Martínez festejou o golo que marcou pelo FC Porto no Barreiro, contra o Fabril - que também é uma equipa do Campeonato de Portugal... - e percebamos a diferença entre um jogador que vai à luta por uma oportunidade e jogadores que se limitam a ficar à espera que a oportunidade lhes caia do céu. E, apesar de o objetivo ter sido atingido, esse é um detalhe que deve preocupar, tanto Jesus como todos os que fazem parte da estrutura do Benfica. Porque, numa época tão longa e tão marcada pela incerteza exponenciada pelo Covid-19, o Benfica (e todos os clubes) precisam de todos. E precisa de todos motivados. Seja contra o Paredes ou contra o Liverpool.
Jesus tinha, portanto, razões para não estar satisfeito no final do encontro, como deixou evidente, mesmo que não de forma tão clara como, se calhar, ele próprio teria vontade de fazer. A única crítica que se pode fazer ao discurso do treinador encarnado é que terá, talvez, centrado a sua frustração para os alvos errados. Sim, é verdade que todos esperavam mais de Gonçalo Ramos, provavelmente o jogador que os adeptos encarnados mais aguardavam ver em ação. Mas dizer que foram «os mais velhos a segurar a equipa» é desculpar aqueles que, no fundo, mais culpas têm. Porque, sendo essa a obrigação dos mais velhos, deveriam ser eles, também, a levar a equipa para patamares mais altos, retirando pressão aos mais novos e permitindo-lhes, com isso, mostrarem, ou não, as qualidades que se lhes apontam. Foi sempre assim no futebol. E não o contrário.