Uma despedida na relva
Uma cerimónia simbólica e discreta, própria da sua personalidade humilde, mas Chalana teve o que mais desejaria: um reconhecimento nacional
FAZ sentido. A melhor maneira de dizer adeus a Chalana, tal como já tinha acontecido com Eusébio, foi na relva do Estádio da Luz. Foi a sua casa, o seu palco, ali deixou lágrimas de tristeza e de alegria e muito, muito suor nas camisolas vermelhas. Alguma dor, não raro sofrimento, angústia, mas, também, o deslumbramento de um sonho único, que só aos grandes artistas é permitido.
Alguns milhares de adeptos, não os suficientes, mas o mês de agosto é pouco dado a grandes mobilizações de massas, aplaudiram, pela última vez, Fernando Chalana numa urna coberta pela bandeira do seu clube de coração, transportada aos ombros por antigos companheiros de equipa e amigos para sempre.
Não foi uma cerimónia grandiosa, mas foi uma cerimónia digna e, sobretudo, simbólica. Sim, pode dizer-se que um tanto discreta, mas também isso condiz com a personalidade tímida, humilde, algo solitária do artista homenageado. Teve o que mais gostaria de ter: o reconhecimento transversal de um povo que tantas vezes vive separado pelas cores dos clubes e que desta vez se juntou num luto absolutamente consensual.
Pode falar-se na consolação de que os ídolos não morrem, pelo menos enquanto a memória dos homens os mantiver vivos. Mas nada é eterno. Muito menos num mundo que precisa de renovar as suas maiores referências e torná-las vendáveis. Se possível, de uma forma universal. Por isso, há espanto em quase todos os rostos que ouvem um velho dizer que o maior foi Di Stefano, que houve um goleador francês excecional de nome Raymond Kopa, que os cinco violinos jogavam como a orquestra de Viena, que o Matateu e o Vicente ajudaram muito à grandeza do Belenenses, que no FC Porto, o Pinga, de seu nome Artur Soares de Sousa, um dia, marcou nove golos ao Sporting, que o Eusébio fez uma das maiores exibições que um futebolista alguma vez tinha conseguido num jogo do Campeonato do Mundo, vestindo a camisola da Seleção Portuguesa e num jogo contra a Coreia do Norte.
O último adeus de Chalana na Luz
Dentro de umas décadas, alguns ficarão admirados por ouvirem falar em jogadores únicos e admiráveis como Cruyff, Platini ou Diego Maradona. E no final do século, haverá quem abra a boca de espanto ao saberem por qualquer tipo de conhecimento digital, os inimagináveis feitos de Messi ou de Cristiano Ronaldo.
É também por isso que nós devemos festejar, honrar, admirar e agradecer os ídolos do nosso tempo. Aqueles que nos proporcionaram, pessoalmente, alegrias e emoções muito especiais, aqueles que nos levaram a acreditar nos sonhos e que há formas de imortalidade humana.
Chalana não chegou a ser, sequer, um ídolo universal. Faltou-lhe palco, transmissões televisivos, dimensão mediática. Teve as primeiras páginas de muitos jornais portugueses e uma pequena nota em alto de primeira página no velho e tradicional L’Équipe.
Mas foi, de facto, um ídolo nacional. Não apenas do Benfica e dos benfiquistas, mas de todos os portugueses, espalhados por esse mundo, e que têm paixão por futebol e admiração por quem o transforma num jogo divino.
Para ele, recatado, apesar de genial, era o suficiente. Que o seu povo o admirasse e o não esquecesse em vida e que os seus amigos não o deixassem em solidão, mesmo que já não os distinguisse de uma forma óbvia e clara.
A verdade é que o pano já tinha corrido há muitos anos e que se tinham apagado as luzes fortes do palco. Foi esta despedida que fez, de novo, brilhar essa luz e que deu a Fernando Chalana um lugar mais firme na galeria daqueles que foram portugueses especiais.
QUE SE PASSA NO JUDO NACIONAL?
O presidente da Federação de Judo, Jorge Fernandes, respondeu a uma longa carta aberta subscrita por sete atletas em preparação olímpica, considerando que não achava o grupo representativo. Não tanto pelo número porque sete atletas pré-olímpicos não são desvalorizáveis, mas porque, dos sete, cinco são do Benfica. Para aqueles que não seguem as coscuvilhices dos bastidores da modalidade, não sabem o que isso possa significar. Ser atleta do Benfica é um anátema? Deve justificar uma purga em nova alínea da carta olímpica?
QUATRO HORAS COM O PRESIDENTE
Quatro horas no carro com Marcelo Rebelo de Sousa proporcionaram à jornalista Anabela Neves uma entrevista exclusiva, íntima e diferente. Muitos, mais ortodoxos de um jornalismo de distância, dirão que é pecado entrevistar informalmente o Presidente da República. Mas a questão é que o Presidente é mais genuíno na sua reconhecida informalidade. Daí que a conversa se tenha revelado particularmente útil aos cidadãos. Um grande momento de televisão e, por muito que custe a alguns, um grande momento de jornalismo.