Um grande senhor, um grande dirigente, um grande amigo!
A estrondosa vitória do Sporting não conseguiu apagar o profundo desgosto que me causou a morte de Fernando Pedrosa
POR regra deixo sempre para o fim as notas tristes, designadamente o meu comentário sobre as figuras que desaparecem do nosso convívio. Esta semana, com a estrondosa vitória do Sporting Clube de Portugal na segunda jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões, seria expectável que tal vitória tivesse a primazia neste meu escrito semanal. Acontece que a vitória do Sporting me causou grande alegria e felicidade, mas não conseguiu apagar o profundo desgosto que me causou a morte do meu querido amigo Fernando Pedrosa, ocorrida no domingo passado e cujo funeral ocorreu na manhã desse jogo, sem ser dada a possibilidade aos amigos de dele se despedirem, por decisão dos filhos. Acresce que na comemoração dessa vitória faltou justamente o habitual telefonema (ou mensagem) de Fernando Pedrosa, que, nestas ocasiões, sempre fazia (ou enviava), para manifestar a sua satisfação por saber que me encontrava feliz. São assim os amigos. Sentem-se felizes com a nossa felicidade. Fernando Pedrosa fazia isso com outros dirigentes de outros clubes, porque essa era a sua imagem de marca. Por outro lado, era um leitor assíduo das minhas crónicas e telespectador da Quinta da Bola, comentando as minhas intervenções com generosidade e amizade. Por tudo isto, resolvi colocar a minha humilde homenagem a Fernando Pedrosa como tema principal (e quase único) desta crónica.
Eu tinha uma grande admiração por Fernando Pedrosa e pelo seu Vitória dos seus tempos áureos, nas décadas 60 e 70, com conquistas da Taça de Portugal, e vitórias importantes em jogos da Taça das Taças e da Taça UEFA, alguns disputados no antigo Estádio José de Alvalade por empréstimo do Sporting - jogos a que assisti com prazer e alegria, porque o Vitória tinha uma excelente equipa e jogava bom futebol. E equipava de verde o que - não sei porquê - ainda me provocava maior simpatia!
Conheci-o, pessoalmente, por apresentação de João Rocha, quando em 1980 assumi uma vice-presidência no Sporting. Aliás, a ida de João Rocha para o Sporting está intimamente ligada a Fernando Pedrosa, porque este promoveu um jantar para convencer João Rocha para ir para presidente do Vitória de Setúbal, onde estavam várias pessoas ligadas ao Sporting que, no fim, o desviaram para o Sporting. De resto, a minha amizade com Fernando Pedrosa, e vice-versa, cresceu muito, pois, como tantas vezes me confidenciou, João Rocha dava boas referências de mim, que eu, aliás, julgo imerecidas.
Nos anos 80 e 90, convivemos e trabalhámos muito em prol do futebol e dos seus clubes, no Movimento dos Presidentes, na Associação Nacional de Clubes e na revitalização da Liga. Fizemos muitas viagens juntos, com João Rocha e Fernando Martins, outra das suas fiéis amizades. Fernando Pedrosa tinha um papel preponderante nessas reuniões de trabalho e de convívio, e um papel fundamental para a conciliação dos interesses, porque era muito respeitado e fazia questão de se dar bem com todos os dirigentes. Sensato e com um trato sempre fino.
Em 1991, quando comemorei os meus 44 anos, convidei-o para um jantar com a família e os amigos. E convidei-o com a convicção de que convidava um amigo, relativamente recente, mas para o resto da vida. E durou mais de quarenta anos, e para continuar. Ele fez um discurso com generosas afirmações a meu respeito que deixou a minha mãe particularmente comovida. Viria a discursar por ocasião dos meus 60 anos, em nome dos meus amigos.
Fui seu advogado por uma ocasião, e recebi dele uns dos honorários mais saborosos da minha vida profissional - uma ida a Londres para uma final da Taça de Inglaterra entre o Arsenal e o Newcastle, em 1998, a qual aliás já referi num artigo escrito neste jornal, que incluía a minha fotografia com Fernando Pedrosa no Estádio do Wembley, ele com as cores do Newcastle e eu do Arsenal.
Do seu curriculum, vasto e importante, além do futebol, consta a de Comendador da Real Ordem de Isabel a Católica, de Espanha. Tal condecoração teve lugar na Embaixada de Espanha, em Portugal, e, não obstante a cerimónia, por imposição do protocolo, não poder ter muitos convidados, Fernando Pedrosa fez questão de que eu estivesse presente, com minha mulher, o que muito me honrou e me fez sentir que era realmente muito meu amigo.
Durante estes anos todos, sempre que o Sporting jogava em Setúbal, logo recebia o convite de Fernando Pedrosa para assistir ao jogo com minha mulher e de seguida para jantar com outros sportinguistas seus convidados. Um verdadeiro cavalheiro, que tinha prazer em receber bem os seus amigos.
Nos últimos anos, com amigos comuns, almoçávamos em Setúbal às sextas-feiras, no Verde Branco, aquele peixe maravilhoso que por lá servem. Reuniões sempre muito agradáveis, onde Fernando Pedrosa fazia alarde da sua excelente memória, que conservou até ao fim, na contagem de histórias e anedotas, e na declamação de poesias de género variado. E sempre muito lúcido e sensato nas suas análises e observações. Além disso, não passávamos um almoço sem recordar o nosso tempo de dirigentes e dos dirigentes do nosso tempo, sempre com saudade das relações estabelecidas para lá das rivalidades. Estava na nossa ideia, a que se associou entusiasmado José Maria Pinho, a realização de um almoço entre os dirigentes desse tempo, e que o Covid-19 foi adiando. Foi aliás este quem me comunicou a morte «do nosso querido amigo Fernando Pedrosa». Fica o almoço adiado para mais tarde e ... noutro local!...
Pedrosa reunia regularmente com outros dirigentes ou ex-dirigentes do futebol, em almoços de convívio, fossem do Sporting ou do Benfica. A cor clubística não contava, mas sim a amizade e o respeito associado a esse sentimento!
Desapareceu, pois, uma grande figura de Setúbal e de setubalense, amante do seu Vitória. Nas pessoas do presidente da Câmara e do Vitória de Setúbal apresento sentidas condolências à cidade e ao clube, esperando, sinceramente, que o seu exemplo traga rapidamente o Vitória ao lugar a que tem direito no futebol português. Era visível a sua tristeza quando se falava do Vitória, mas era inevitável falar do seu clube, do fundo do coração.
O director do jornal O Setubalense, Francisco Alves Rito, escreveu um artigo sobre a figura de Fernando Pedrosa, intitulado Um Presidente respeitável e respeitado, que terminava assim: «Por tudo isto, Fernando Pedrosa é uma figura de Setúbal e do Vitória FC, a quem não devia ser negada a possibilidade de uma despedida, desejavelmente com velório no Bonfim. A confirmar-se um funeral apenas privado, fica em dívida uma homenagem pública que corresponda à dimensão da sua importância para a comunidade e cumpra aquela que seria certamente a vontade do próprio.»
Assino, por baixo, e espero que essa homenagem seja feita, a começar pela Liga e pela FPF, com um minuto de silêncio na jornada deste fim-de-semana.
Por mim, fico-me, por agora, com a apresentação de sentidas condolências aos seus netos e netas, que ele adorava, como tantas vezes me confidenciou. Fica a saudade do nosso convívio semanal e de outros ocorridos em datas mais longínquas. Os seus amigos, o futebol e a sociedade setubalense ficou mais pobre; ao contrário do local em que acredito estará agora, que ficou mais rico, com um GRANDE SENHOR, UM GRANDE DIRIGENTE e UM GRANDE AMIGO!...
Fernando Pedrosa, antigo presidente do V. Setúbal, morreu no domingo aos 91 anos
GRANDE JOGO, GRANDE TREINADOR, GRANDE EQUIPA
S OBRE o jogo de terça-feira passada não vou dizer mais nada, porque tudo está dito e redito. Tive momentos em que me pareceu estar a assistir a um jogo da Premier League, tal a intensidade posta pelos jogadores e a excelente arbitragem, que me fez comentar que, com uma arbitragem à portuguesa, o Sporting não ganharia o jogo ou, pelo menos, seria contemplado com mão cheia de cartões amarelos.
Além do jogo em si, quero acreditar que esta participação na Liga dos Campeões seja o início do compromisso que temos para com o Visconde de Alvalade de ser um clube tão grande como os maiores da Europa, no que respeita ao futebol.
A gestão desportiva, como se viu de manhã, e, depois, ao fim da tarde, está no bom caminho, não obstante as limitações financeiras que temos. Compete agora aos dirigentes e associados encontrar o caminho para sustentar o desígnio, e para que acabe aquilo que já parece um slogan de muito mau gosto: sempre que emerge um grande jogador, logo se pensa e fala no rendimento que poderá dar aos cofres de Alvalade!...
UMA PEQUENA PERGUNTA
S ERÁ que a fotografia da equipa do Benfica em tronco nu foi para lembrar aquele adepto com a camisola do Sporting que, sentado na bancada dos adeptos deste clube, foi assassinado pela claque do Benfica?
Bom exemplo do que é a falta de autoridade moral!...