Ultraconservador?!
Deveria corar de vergonha quem andou a reclamar que ultraconservadorismo de Fernando Santos o impedia de renovar a Seleção. Há meses, antes do Mundial, veementemente me insurgi contra o raio de tal tese (opiniões debitadas nem as pensando!…). Já nessa altura, a renovação foi tão forte quanto isto: dos 23 campeões da Europa, 2 anos antes, ficaram fora do Mundial nada menos do que 10! Relembro: Eduardo (entrou Beto), Vieirinha (Ricardo), Ricardo Carvalho (Rúben Dias), Eliseu (Mário Rui), Danilo, por lesão (Manuel Fernandes), Renato Sanches (Bruno Fernandes), Nani (Gonçalo Guedes), Éder (André Silva), Rafa (Gelson), André Gomes (Bernardo Silva, que só por lesão não estivera no Euro). Conservadorismo alterar quase metade do plantel?!
Claro que, para mudar, é preciso ter com quem o fazer… Foi o tempo necessário para aparecerem Ricardo Pereira (FC Porto), Mário Rui (Nápoles), Bruno Fernandes (Sporting), Gonçalo Guedes (Valência), André Silva (FC Porto e Milan), Gelson (Sporting), Rúben Dias (Benfica). Face à veterania dos centrais Pepe, José Fonte, Bruno Alves - todos largamente trintões, macroproblema na Seleção! -, o caso de Rúben Dias é bem marcante: mal se fixou na 1.ª equipa do Benfica, na ponta final da época, logo foi convocado para o Mundial. Ninguém mais haveria para renovar em tão crucial setor - eis cristalina verdade.
Agora, nas convocatórias para defrontar (e vencer) Itália, Polónia e Escócia, só 3 meses pós-Mundial, desses 23 saíram… 12!!! Anthony Lopes (grande enigma, pois mantém-se titular no Lyon…), Ricardo Pereira (solavancos pós-transferência para Leicester), José Fonte (aos 34 anos, mudou-se para França, no Lille), Bruno Alves (36 anos, ainda titular no regresso ao Parma), Raphael Guerreiro (lesões travam-no no Borussia Dortmund), Adrien (Leicester tão longe de quando foi campeão…), João Moutinho (saiu do Mónaco, mas prossegue como titular, agora no surpreendente Wolverhampton muito mais português do que qualquer dos nossos maiores clubes), João Mário (talento estagnado no Inter e no West Ham), Manuel Fernandes (campeão na Rússia, com Éder, aos 32 anos), Gelson (em adaptação ao Atlético de Madrid), Quaresma (35 anos, parcial eclipse no Besiktas) e… Cristiano Ronaldo (pausa na Seleção, tal como se verifica com… Messi).
E eis 2.ª onda de novidades (insisto: 10 na 1.ª!; 12 na 2.ª!): João Cancelo, Rúben Dias, Kevin Rodrigues, Rúben Neves, Sérgio Oliveira, Pizzi, Bruma, Hélder Costa, Gedson, Cláudio Ramos… - mais os prometedores regressos de Renato e Éder.
Glória no Europeu há tão-só 2 anos. Desde o Mundial, passaram escassos 3 meses. Em 4 anos com Fernando Santos ao leme, estreantes já somam 38. Líder ultraconservador?! Óbvio: sucessivas, e tão vastas, renovações não seriam possíveis se no nosso futebol não jorrassem talentos - mérito dos jogadores e do trabalho nas camadas jovens (técnicos nos clubes e na Federação), provocando intensa cobiça estrangeira.
Equando Ronaldo voltar? Híper evidente: ótimo ter o goleador n.º 1 de todos os tempos (na era do king Eusébio, havia muitíssimo menos jogos da Seleção). Implicará mudar tática e estratégia? Talvez - não necessariamente. Com Ronaldo, Fernando Santos tem privilegiado 4x4x2; nestes jogos sem ele, alterou para 4x3x3 (extremos bem abertos). Ronaldo nunca será excelente ponta de lança fixo; e há muito deixou de ser puro extremo - adora partir do flanco esquerdo rumo ao centro e… à baliza; e deve estar substancialmente liberto de tarefas defensivas (daí o anterior 4x4x2). Porém, no seu desejado regresso, não vejo assim tão difícil manter o recente, e bem profícuo, 4x3x3. Já houve quem se me antecipasse na ideia de poder apontar para aí - não só, mas também - o novo posicionamento do médio William: mais à frente e sobre a esquerda, protegendo defesa e extremo desse lado. Muito bem visto, quando a função de n.º 6 passa a estar tão bem preenchida com regresso de Danilo e imposição do grande talento de Rúben Neves. Em 4x4x2, tem havido este problema: inexistência de médio esquerdino, ou com características para se encostar à linha na esquerda, em dupla função defesa-ataque (adaptação de André Gomes no Europeu). Com licença de Fernando Santos, arrisco ideia para 4x4x2: esse homem poderá ser… Raphael Guerreiro. Tirá-lo da defesa, avançando para o meio campo (já jogou assim no Dortmund). Em normal condição física, tem tudo para ser resolução de problema… que, no Europeu e no Mundial, afastou a nossa equipa de exibir futebol com mais firme qualidade.