Talvez agora se perceba o trabalho feito no Sporting...

OPINIÃO20.02.202001:00

DESTA vez até António Costa e o Presidente da República falaram. Foi interessante. Também Pinto da Costa, Luís Filipe Vieira, António Salvador, o Conselho de Disciplina da FPF, a polícia, a Comunicação Social e sei lá mais quem, se pronunciaram; todos no mesmo sentido, e todos bem. Por isso fico contente.
No entanto, há uma pequena mágoa que não posso deixar de registar. No Verão de 2018, quando se tratou de afastar Bruno de Carvalho, depois do miserável ataque a Alcochete, muita gente não percebeu (ou não quis perceber) o ninho da víbora que ali estava. Pessoas insuspeitas de quererem ser mais do que adeptos do Sporting (como eu e tantos que se envolveram) entraram numa autêntica batalha que foi afastar o ex-presidente. Com o apoio e decisão esmagadora dos sócios isso foi conseguido. Mas até à AG que o destituiu, e mesmo depois disso, Bruno de Carvalho era quem mais tempo de antena tinha. Ninguém percebeu o que se passava? Ninguém entendeu que as claques eram guardas pretorianas de presidentes que pretendiam perpetuar-se no poder? Ninguém reparou que a violência e tudo o que de mau traz a violência, se estava a instalar? Na altura, tirando sportinguistas ilustres, como o presidente do Parlamento, Ferro Rodrigues, reinou o silêncio… era um problema do Sporting.
A análise estava errada. Não era, nem é um problema do Sporting; é um problema do futebol e do país! Mas, de todos, foi o Sporting o primeiro a atacá-lo.
A Direção eleita e presidida por Frederico Varandas terá todos os defeitos do mundo. Mas teve a qualidade - e essa tem um valor incalculável - de continuar a luta. Algumas pessoas, de algumas claques (porque, como em tudo, não são todos iguais), invetivam e insultam os dirigentes. O veneno ainda lá está, o bullying constante. Como o bullying que fizeram a Marega, da forma racista e nojenta a que assistimos. Mas aqui o racismo, creiam, é a ponta do icebergue, a face visível do ódio. Podia ser homofobia ou qualquer outra coisa. Boa parte das claques servem, não para ajudar e puxar pelo clube, mas para atacar, odiar, desestabilizar os adversários. E enquanto tal se permitir, nem se combate o racismo nem a violência. O bullying far-se-á sobre a característica que mais pode ofender o visado.

CD, quem compreende?

TENDO o maior respeito pelo Conselho de Disciplina da Federação Portuguesa de Futebol, e correndo o risco de dizer disparates por falta de conhecimentos, estou baralhado com o que li ontem neste mesmo jornal. Vejamos: na página 5, José Manuel Meirim, líder do CD explica que está limitado à aplicação de regulamentos vigentes. Compreendo. Acrescenta que precisa de prova para aplicar eventuais castigos ao Vitória de Guimarães, devido ao mesmo caso Marega. Entendo. A questão é, pois, provar como (e se) o Vitória permitiu ou deu o beneplácito para que os adeptos insultassem o avançado do FC Porto. Percebo.
Na página 14, ou seja, nove páginas depois, leio que o mesmo Conselho de Disciplina, após analisar relatórios e ouvir todos os envolvidos, decidiu aplicar uma multa ao Sporting devido à utilização de engenhos pirotécnicos nas bancadas de Alvalade, bem como - e sublinho esta parte, que me parece deliciosa -, «cânticos contra o presidente dos leões, Frederico Varandas».
Portanto, e se bem entendi, os cânticos contra o presidente do Sporting entoados por uma claque que está manifestamente em guerra com a maioria do clube, que aplaude golos do adversário, que insulta os corpos sociais e o seu presidente são motivo de multa a esse mesmo clube. E não carece de saber se o clube instigou ou deu o beneplácito. Aliás, neste caso do Sporting é tão óbvio que não deu o beneplácito nem instigou, que a questão não se põe.
Naturalmente, o mal não estará nem no presidente do CD nem no próprio organismo. Haverá provavelmente um regulamento esconso mal feito que obriga a que assim seja. E desse regulamento fica claro que sai mais barato a um clube ter os seus sócios com atitudes racistas repugnantes contra um jogador, do que ter meia dúzia a chamar nomes e a dizer palavrões contra o próprio presidente.

Onde anda a lei?

MAS se os regulamentos e leis da FPF são maus, a lei do país é ausente. Eu sei que o Presidente, o Governo, todos estão preocupados e que o Parlamento vai ouvir imensa gente sobre o caso Marega. Mas não entendo por que motivo nada se fez e, confesso, tenho receio que tudo fique na mesma.
A Direção do Sporting, como ontem reconhecia Miguel Sousa Tavares, tem sido uma voz isolada na luta contra este aumento da violência e do desbragamento nos estádios. No Sporting tem, ainda assim apoio: basta ouvir as assobiadelas que leva a pequena minoria ruidosa que insulta Varandas e que tenta desestabilizar o plantel do clube como vingança contra o que perderam de benesses.  Assobios que vêm mesmo dos que criticam abertamente a atual gestão de Varandas. Porém, infelizmente, até agora a tentativa de colocar na ordem a Juve Leo e o Directivo Ultras no Sporting tem sido um caso à parte. Com o Benfica a insistir que não tem Grupos Organizados de Adeptos (GOA), com os Super Dragões a fazer o que querem e ainda os White Angels do Guimarães e alguns do Braga a tornarem-se, progressivamente, tão ou mais agressivos e violentos do que os GOA dos grandes, são as próprias claques do Sporting que sentem as costas quentes (as multas são pagas pelo clube, claro).
Por isso mesmo, o Estado, que tem por dever manter a ordem em todos os locais públicos, incluindo os estádios e arredores, teria de exigir variadíssimas coisas. Desde logo, que qualquer GOA tenha registado quem são os seus adeptos e, sobretudo os seus dirigentes. Aqueles líderes de claque com alcunhas estranhas, como Macaco ou Mustafá, bem como os grupos que lideram, têm de ser diretamente responsabilizados. Como todos os grupos legais, têm de ter eleições regulares e estar autorizados.
E há mais. Não lhes devia ser permitido ocupar zonas dos estádios e aqueles que a polícia identifica a cometer atos ilegais deveriam ficar anos impedidos de ir aos jogos e apresentar-se em esquadras de polícia, como fizeram em Inglaterra.  Aliás, o sucesso que no Reino Unido houve no combate ao hooliganismo devia ser inspirador.
E por que razão o combate às claques é importante? Porque muitos dirigentes de clubes têm-nos como seu seguro, alicerces do seu próprio poder. E dão-lhes benesses e permitem-lhes, tacitamente, fazer negócios (desde a venda de bilhetes no mercado negro a outros menos confessáveis). E porque tudo isto acaba por tornar o mundo do futebol irrespirável; um ambiente onde se cruzam adeptos saudáveis, com delinquentes, dirigentes corruptos, árbitros manhosos, juízes a soldo, polícias comprados e sei lá mais o quê. Pior: quando um clube se tenta libertar disto, e assim volto ao princípio, acaba a lutar contra todos, desgastando-se e perdendo. Como nota final, não se pense que afirmo não terem os maus resultados do Sporting origem, também, em más escolhas dos seus dirigentes. O que afirmo é que parte desses maus resultados, bem como a desestabilização permanente da equipa, advém do facto de não haver o mínimo entendimento de que o ovo da serpente mora em todos os clubes de futebol e da falta de solidariedade e de compreensão quando se decide o combate.