Sonhos encarnados

OPINIÃO23.01.201901:12

1 - Perguntava-me como é que o Benfica que tinha visto fazer um miserável jogo em Guimarães, onde venceu por milagre quando já só se batia desesperadamente para evitar a derrota, conseguiria fazer frente ao FC Porto. A resposta começou por ser dada por um nome: Carlos Xistra. Nomear Xistra para um Benfica-Porto parece e é provocação. E ele não fez por menos, os seus primeiros quinze minutos foram de catálogo: aos 2, perdoou um aparente penalty ao Benfica; aos 5, avisou Felipe por uma falta que este não cometeu; aos 8, perdoou um penalty descarado a Rúben Dias (quem viu o penalty assinalado contra o Porto em Chaves, só pode ter sorrido); por uma falta banal mostrou o cartão amarelo a Alex Telles, aos 13; e por uma falta igual perdoou o cartão a Pizzi, aos 15. Depois, o Porto marcou e Xistra acalmou. Graças ao VAR, não atendeu aos protestos de Gabriel para anular o golo do Porto e também, e bem, não anulou o golo do Benfica, após sugestão do VAR. E graças ao VAR também, anulou por off-side, já assinalado pelo juiz de linha, que seria o segundo do Benfica, aliás completamente fortuito e resultado de um tremendo erro de marcação portista, deixando apenas Óliver recuado após um canto a favor. Daí até final, só algumas trivialidades: segundo amarelo por mostrar a Jardel e a Seferovic, 6 minutos absurdos de descontos dados ao Benfica. Tirando isso, o Porto foi bem melhor na segunda parte apenas diminuído pela fatal incapacidade de Felipe para os passes longos (aliás, passes de mais de dez metros), que deram o primeiro golo ao Benfica, pelas brincadeiras de Óliver a meio-campo e pela histeria do director do futebol, Luís Gonçalves, proporcionando uma cena única, que foi um jogador (Brahimi) a pedir-lhe que se fosse embora e deixasse a equipa jogar...e marcar. Segunda parte com mais pressão do Benfica até ao cheque-mate, mas com mais oportunidades do Porto, a matar o jogo com um golo do mais improvável dos jogadores: Fernando Andrade, que eu ia jurar ser incapaz de marcar um golo, mesmo sem guarda-redes pela frente. Bom e será que à terceira final é de vez?

2 - Um frémito de emoção, de incontida alegria, de indisfarçável alívio, percorreu todo o universo benfiquista quando a Policia Judiciária anunciou que, a seu pedido, as autoridades húngaras tinham detido em Budapeste o hacker português Rui Pinto, principal e único suspeito pela divulgação dos célebres mails do Benfica, que tantos e tão demolidores danos têm causado à sua imagem de clube impoluto, instituição de bem, exemplo de acabado desportivismo competitivo.
Como uma mola, levantaram-se todos  os cartilheiros de serviço para proclamarem aos quatro ventos que a «Justiça» tardara mas chegara, que o «crime» não passaria impune e a sugerir que em breve o «criminoso» estaria atrás das grades na Penitenciária de Lisboa a vomitar o nome de Pinto da Costa como mandante e financiador do infame crime de violação da correspondência privada. Tamanha euforia nem que o Benfica acabasse de ganhar ao FC Porto por 5-0 e tivesse passado para a frente do campeonato! E, todavia...
Todavia, primeiro que tudo, interrogo-me sobre o zelo demonstrado pela PJ na captura deste perigoso criminoso: o solene comunicado lido à hora dos jornais televisivos, o envio de homens seus a Budapeste, a expensas dos contribuintes, acompanhar a captura, não fosse a polícia húngara falhá-la, a própria emissão de um mandado de captura internacional com base numa simples queixa de tentativa de extorsão por parte de uma empresa privada. Tanto empenho, tanto zelo em não largar este osso, leva-me a uma pergunta óbvia: será que o mesmo esforço posto em perseguir o mensageiro está a ser posto em perseguir a mensagem? Ou seja, estarão a PJ e o MP, mais de um ano decorrido, a fazer progressos decisivos relativamente às informações conhecidas através dos mails do Benfica? E as denúncias de tentativa de aliciamento de jogadores do Marítimo, relatadas por uma reportagem da SIC, avançaram ou estão à espera que os envolvidos partam para os seus países de origem e não possam testemunhar? Já se apurou para que serviu o saco azul constituído pela SAD do Benfica e denunciado pelo próprio MP em comunicado? É que esses são os verdadeiros crimes GRAVES que importa apurar se aconteceram ou não, e não é para daqui a cinco anos.
Quanto à violação da correspondência privada, tem e terá sempre a minha firme condenação, muito embora assista a ela todos os dias e muitas vezes promovida por quem deveria guardar o seu segredo como matéria explosiva. E perante a conivência dos jornalistas e a indiferença geral. Mas não deixo de achar o cúmulo da hipocrisia que quem teve um director - braço-direito do presidente, com funções do maior relevo e na área jurídica - que vai ser julgado por violação continuada e organizada de processos em segredo de justiça, venha agora, qual virgem ofendida, queixar-se da violação da sua correspondência. Sim, eu sei, o Benfica não foi pronunciado - pelo menos, por enquanto. Mas não o foi porque teve a sorte de encontrar uma juíza que, ao contrário do que sucedeu por exemplo com Armando Vara ou José Sócrates, não aceita a prova indirecta com que o MP costuma contentar-se, dispensando-se de mais investigações. E eu, não discordando dela, constato, todavia, que tal equivale a termos de acreditar que Paulo Gonçalves, a quem a SAD do Benfica louvou pela sua «dedicação e lealdade», fez o que fez sem qualquer intuito de beneficiar o Benfica, que daí não retirou proveito algum nem informação valiosa alguma, e sem que ninguém do Benfica, nem mesmo o seu presidente, tivesse o menor conhecimento do que ele andava a fazer. Era mera curiosidade irreprimível ou assim uma espécie de hobby: divertia-se a ver processos em segredo de justiça, mas sem quaisquer segundas intenções. De qualquer maneira, quem tal director tinha, carece de qualquer autoridade moral para se armar em vítima de violação da correspondência.
Enfim, há violações e violações da correspondência, não são todas iguais. E se os fins não justificam os meios (uma eterna discussão ético-jurídica), não é indiferente ponderar os fins e os meios utilizados. Este pirata informático fez o mesmo que os do Wikileaks e dos Panamapappers, que prestaram um imenso serviço à informação e à justiça. Rui Pinto denunciou negócios duvidosos do meu próprio clube (e espero que continue a fazê-lo e tudo o que for nebuloso), do Sporting, da Doyen, as fugas ao fisco de grandes vedetas do futebol, de agentes e de clubes, as negociações secretas entre Infantino e o Manchester City para contornar as regras do fair play financeiro da UEFA, e mais uma série de traficâncias obscuras do mundo submerso do futebol onde a imprensa não chega. Se em Portugal a polícia o persegue, em França e na Suíça é o contrário: usam as suas informações. Por isso, o grande objectivo nem é a sua detenção em Budapeste e a sua extradição para Portugal. O grande objectivo é deitar mão aos seus computadores, às suas disquetes, às suas pens. O objectivo é SILENCIÁ-LO. A pergunta é: quem tem medo de Rui Pinto?

3 - Pepe tem sido para mim uma agradável surpresa: não o supunha em tão boa condição. A sua contratação permitiu desviar Militão para o lado direito da defesa (até Junho) e finalmente passámos a jogar com 11, o que faz toda a diferença. Manafá, pelo que lhe vi em Portimão, contra o Benfica, foi também uma boa contratação e pode dar algum descanso ao incansável Alex Telles. Já Fernando Andrade, apesar do golo de ontem, hum…