Só o Benfica resiste 

OPINIÃO28.04.202003:45

O comité executivo da UEFA, na reunião da última quinta-feira, anunciou uma mão cheia de nada em termos de medidas concretas para combater a influência da pandemia no negócio do futebol. Pelo contrário, assumiu a derrota e, no limite, reconheceu às  federações  liberdade para decidirem em função das orientações recebidas das autoridades de saúde dos respetivos países.


Por cá,  o Sporting  chegou a um entendimento com o plantel para a redução dos vencimentos em 40 por cento nos meses de abril, maio e junho, no caso de não haver mais competição esta época, com promessa de devolução de  20 por cento se o campeonato recomeçar, paga em duas prestações de dez por cento, a primeira em dezembro deste ano e a segunda em 2021. Entretanto, ficou a saber-se ainda que, por causa do coronavírus, a administração leonina está a trabalhar na revisão do orçamento 2020/2021, que deverá baixar  dos 70 milhões inicialmente previstos  devido à contratação do Ruben Amorim.  Em concreto, haverá menos dinheiro para «aplicar noutras aquisições ou noutro investimento», conforme esclareceu o administrador Salgado Zenha (A BOLA de 22 de abril).

Nesse mesmo dia soube-se que a equipa técnica do FC Porto aceitara  o corte nas remunerações,  já partir deste mês, em 40 por cento, enquanto as competições não forem retomadas.  No sábado, A BOLA noticiou que idêntico acordo fora alcançado com o plantel e que o atraso no entendimento com os jogadores ficara a dever-se  a divergências  sobre o recebimento da diferença, que deverá ser feito assim que  for garantida a entrada na Liga dos Campeões.  

Nesta última semana, de terça a terça,  o Benfica também foi notícia, mas em contramão  ao sentido de leões e dragões.  Na quarta feira (dia 22), foi divulgada o teor de uma carta de Luís  Filipe Vieira às casas e associados do clube. No essencial, o presidente encarnado quis dirigir uma palavra de conforto aos sócios («a alma deste clube») e expressar o  reconhecimento pela ação das Casas do Benfica («exemplo de solidariedade com as suas comunidades locais»).

Vieira apelou à união do universo benfiquista em momento particularmente severo através de uma mensagem de confiança e de esperança, mensagem confirmada no dia seguinte com a notícia do pagamento na totalidade à estrutura profissional  do futebol e  com a informação de que eventual revisão salarial  apenas será colocada em cima da mesa a partir da altura em que não se vislumbrar outra solução, o que, por ora,  não é o caso. E não é porque, como explicou  Domingos Soares Oliveira, o administrador executivo da SAD e CEO do grupo Benfica, mesmo em tempo de muitas sombras,  a marca  está bem preparada e só por isso lhe foi possível  reembolsar os investidores do empréstimo obrigacionista 2017-2020, no valor de cerca de 50 milhões de euros, «no meio da maior crise que cada um de nós já viveu».

Domingos Soares Oliveira comunicou ainda que o Benfica reduziu a dívida bancária para «valores quase históricos» e tem em caixa 50 milhões de euros,  o que lhe permite olhar em frente com «uma confiança moderada»,  confiança essa que é sustentada pela condição económico-financeira da águia, com suas disponibilidades de tesouraria, mas, paralelamente,  com as reservas  que se impõem na medida em que ninguém sabe o que «o futuro nos reserva».

O Benfica é o único que mostra capacidade para resistir aos efeitos da pandemia e é essa estabilidade que irrita os seus adversários por verem nele, mesmo não o querendo admitir em voz alta, o mais forte de todos.  É o maior dos grandes e,  devido a essa evidência, a figura de Luís Filipe Vieira é tão massacrada:  pelos rivais externos, por terem percebido há muito que enquanto ele tiver saúde e vontade será muito difícil travar a ascensão da águia, e também pelos internos, os quais, sentindo uma irreprimível atração pelo seu lugar, mas não podendo ignorar a magnífica obra edificada, se agarram à demora do futebol profissional em recuperar a hegemonia que o FC Porto lhe roubou.

É o único argumento, embora falacioso, que poderá gerar incómodo entre  família encarnada, apesar de na última década se ter vindo a consolidar essa recuperação: Benfica, seis campeonatos e  FC Porto, quatro, nos últimos dez anos,  e Benfica cinco e FC Porto um, nos últimos  seis.  

Pode parecer pouco aos mais agitados, mas é um inequívoco sinal de mudança, além de não ter sido por falta de condições de trabalho ou de défice de qualidade dos plantéis que o Benfica falhou os títulos de 2012 e 2013, no tempo de Jorge Jesus (excesso de vaidade), de 2018, com Rui Vitória ( fraca ambição), e, muito provavelmente, o de 2020, com Bruno Lage (falta de tarimba).  No total foram três campeonatos deitados à rua e um quarto em vias disso.  Dizia o professor Medeiros Ferreira que todos os treinadores são caprichosos,  o problema é que esses caprichos, geralmente, saem caro aos clubes.

Fez agora três anos que  Luís Filipe Vieira teve uma afirmação muita polémica e que foi manchete na edição de  A BOLA  de dois de março de 2017. Afirmou ele: «Estamos dez anos à frente da concorrência».
Não sei se os anos serão tantos, mas o Benfica está muito à frente. Sobre isso não tenho dúvidas.