Sinais e finais

OPINIÃO06.08.201901:06

1 - O Benfica compatibilizou-se com a chamada Supertaça. Nas mais recentes 4 edições, ganhou 3 e nas 6 últimas, ganhou 4. Particularmente significativa foi a retumbante vitória no domingo passado. Que se juntou à vitória na International Champions Cup, sendo o primeiro clube fora das 5 ligas principais da Europa a fazê-lo. Excelente começo de época, não haja dúvidas. Equipa entrosada, superiormente orientada por Bruno Lage, com estabilidade do plantel e serenidade emocional, com boas aquisições e fácil adaptação, com a garantia de profícua competição na maioria das posições. Assim se confirmem as boas expectativas ao longo da época. Na final algarvia, Vlachodimos voltou a mostrar, com classe, por que razão é um excelente guardião. Rafa e Pizzi combinam de olhos fechados. Grimaldo cada vez mais influente. Gabriel joga e faz jogar. Florentino é já um experimentado veterano de 19 anos. Raul de Tomas é brilhante como a brilhantina do seu penteado. Nuno Tavares promete muito.

2 - O balanço de uma pré-época é o que quisermos. Se os jogos efectuados foram ganhos ou bem conseguidos, os mais prosélitos logo pré-determinam o que vai ser a época: avassaladora, dominadora e triunfante. Outros mais prudentes, ainda que satisfeitos,  pensarão que se trata um bom indício, mas não mais do que isso. No entanto, se a coisa correu mal, dirão os habituais chavões de que ainda não é a doer e o que interessa é preparar os jogos a sério (curiosa esta expressão de jogos a sério, que se ouve amiúde). Seja como for, mais vale uma boa pré-época resultadista do que o seu inverso, sem que daí, porém, se possa tirar qualquer relação directa e estatística para as competições que se irão iniciar. Já vi, por exemplo, o Benfica ter más entradas e excelentes saídas e até me lembro, há uns anos, de o Porto ter praticamente perdido todos os desafios de preparação e depois ter ganho importantes títulos. Em qualquer caso, há jogos e jogos. Há os que se ganham ou perdem com relativa normalidade e sem dramas, como, excepcionalmente, há os encontros cuja vitória e, principalmente, desaire podem constituir um desalento e ter sequelas para memória futura.
Por cá (ainda que, em boa parte, lá), o Benfica teve uma boa pré-época, culminada agora com os 5-0 ao SCP. Na prestigiada International Champions Cup venceu os 3 jogos, quando, em edições anteriores, nem uma vez havia ganho. Se exceptuarmos o primeiro jogo na Luz contra o Anderlecht, num relvado impróprio, nos cinco jogos seguintes (já contando com a Supertaça) marcou 18 golos e sofreu 1. Quanto ao Porto, houve sinais indesmentíveis de algum alvoroço e desorientação, que vão ser postos à prova na eliminatória de apuramento para a Liga dos Campeões. Evidentemente que a saída de importantes atletas terá tido impacto, mas há a ideia - certa ou errada - que o plantel não terá ainda digerido a vitória encarnada num campeonato que Sérgio Conceição e os adeptos deram antes por quase assegurado. A saga do guarda-redes para substituir Casillas - finalmente concluída - é um sinal de que a ida do FCP ao mercado já não é o que era. E o caso de Fábio Coentrão que esteve para entrar, mas já não entrou porque uma claque tornava pública uma ‘fatwa’ contra o ex-benfiquista e ex-sportinguista, é sintomático. Finalmente, o Sporting:  não venceu uma única partida e - observado de fora - ficou atrelado a Bruno Fernandes, mais parecendo que era o clube dependente do jogador que o jogador dependente do clube. O ‘fica, não fica’ não tem deixado de se reflectir na equipa e, aparentemente, no trabalho da equipa técnica. Em suma, se o futebol fosse seguramente lógico, o Benfica seria quase campeão em 2019/2020. Simplesmente, essa aparente vantagem tem de ser comprovada constantemente numa prova de estabilidade, competência e regularidade.
Houve alguns aspectos curiosos, neste defeso dos principais clubes portugueses. Receio que o Benfica, lá pelas Américas, tenha esgotado o seu pecúlio de bolas na trave e na barra na sua baliza, porque no futebol a sorte também é inerente ao sucesso em qualquer prova. O jogador encarnado que, em boa tese de psicologia, deveria estar mais condicionado pelos acontecimentos envolventes (refiro-me a Odysseas Vlachodimos) fez grandes exibições e mostrou merecer a confiança que nele deve ser depositada. Obrigado a Bruno Lage por ter devolvido ao bom mundo do futebol o marroquino Adel Taarabt, a mais recente aquisição na Luz. Os 3 grandes perderam o jogo que realizaram em casa, ainda que no caso do Benfica tal tenha acontecido no primeiro jogo e no caso dos portistas e leões tenha sido na última partida da pré-época. O Sporting sofreu sempre 2 golos em cada partida, mais os 5 contra o Benfica (ao todo 17), tendo, curiosamente,  feito o melhor resultado com o actual campeão europeu.

3 - Nem só de futebol vive o desporto. Já passado o clamor do nosso mundial de hóquei em patins, volto a esta competição. A minha geração é talvez a última que teve neste desporto uma das suas bases emocionais para ‘conquistar o mundo desportivo’ e ‘subjugar Espanha’ que, na escola, havíamos aprendido ser o nosso eterno inimigo ao longo da História. Curioso que, se para esta, a Espanha era sobretudo Castela, no hóquei é a Catalunha. Transporto na memória campeonatos a fio vividos com fervor e dedicação, talvez mais que no futebol. Lembro-me perfeitamente de, em 1960, ver a final entre Portugal e Espanha jogada em Madrid, na televisão a preto-e-branco, onde vencemos categoricamente, com a nossa equipa ‘moçambicana’ que, aliás, ganhou 4 mundiais seguidos. Foram precisos 59 anos na minha vida para voltar a ver Portugal conquistar um Mundial em Espanha, agora em Barcelona! Um título saborosíssimo e conquistado sempre in extremis. Fez-me até lembrar o Europeu 2016 de futebol, ganho também desta maneira, no qual e nos 90 minutos, empatámos 6 dos 7 jogos (ganhámos apenas ao País de Gales), com vantagem, ou no prolongamento, ou nos penáltis. Salvaguardadas as distâncias, no hóquei também não ganhámos nenhum jogo com os principais rivais no tempo regulamentar: eliminámos os espanhóis no prolongamento, os italianos nos penáltis e os argentinos também nos penáltis na final (já havíamos empatado com eles, na fase de grupos). E, evidentemente, tivemos um guarda-redes Ângelo Girão, absolutamente notável.
Uma última referência na distância entre o mundial de 1960 e o deste ano. Hoje, a ‘aldeia global’ chegou a este desporto, ao contrário de antanho. Vejamos, alguns traços dessa irreversível tendência. Por exemplo, na final, Portugal tinha apenas  um jogador do Benfica (Vieirinha) menos do que no adversário, a Argentina, onde jogaram dois atletas encarnados (Nicolia e Ordoñez). Na selecção espanhola, nos 10 hoquistas,  havia 6 ‘portugueses’: Casanovas e Adroher (Benfica), Edu Lamas (que vai também jogar na Luz), Ferran Fon e Toní Perez (Sporting), Xavi Málian (FC Porto)! E o seleccionador espanhol, Alejandro Domínguez, é o treinador do… Benfica. Já no vice-campeão, Argentina, jogaram outros 6 ‘portugueses’: Nicolia e Ordoñez (Benfica), Platero e G. Romero (Sporting). Reinaldo Garcia (FC Porto) e C. Acevedo (HC Braga). Aliás, na equipa sul-americana, só um dos 10 jogadores está actualmente a jogar no seu país natal (David Páez). A Itália tem dois atletas que jogam ou vão jogar cá: Cocco (Porto) e A. Verona (Sporting). No Chile, Nicolás Carmona e Angel Vera (Marinhense), na equipa francesa, Carlo Di Benedetto (Porto), Keven Correia (Física), Remi Herman (Juventude de Viana). No total 19 hoquistas de outras selecções estão a jogar em Portugal. Já na selecção portuguesa houve dois ‘estrangeirados’: João Rodrigues (ex-SLB) e agora Hélder Nunes (ex-FCP) a jogar no Barcelona.

4 - A Volta à França em bicicleta já terminou há mais de uma semana, agora que está rolando a nossa Volta a Portugal, ou melhor a Portugal apenas acima do Tejo. Registo aqui apenas uma etapa épica do Tour que nos evidenciou não só a superação do homem na montanha sublime, como a expressão surpreendente dos caprichos da Natureza. Uma das mais notáveis etapas que a televisão alguma vez me proporcionou. Refiro-me à que subiu a 2770 metros no alpino col de l’Iseran, a seguir interrompida porque não lá, mas mais abaixo, a 22 quilómetros da meta, houve uma tempestade de granizo e neve (ao mesmo tempo que Paris sufocava de calor!). Naquela mítica subida, o então camisola amarela viu esfumar-se a vantagem, ao mesmo tempo que o vencedor da Volta do ano passado G. Thomas não teve pernas para o seu colega de equipa Egan Bernal,  que o venceu categoricamente. Trata-se do mais jovem ciclista vencedor desde 1909 (!) e o primeiro colombiano e sul-americano a ganhar o Tour.