Saídas cirúrgicas
No final da época, o mínimo que vai exigir-se a Nélson Veríssimo será a entrada direta na Champions, o que o obriga a ficar em segundo lugar no Campeonato
Adoença do Benfica não vai lá com aspirinas, alertou Vítor Serpa, com sábia oportunidade, no seu espaço de opinião, no último sábado, em A BOLA, advertindo ainda que, se há grupos e grupinhos na equipa, informadores clandestinos ou gente que pensa mais no seu umbigo do que no interesse do emblema que representam, a resposta, seja qual for, «só pode ser firme e intransigente e não se limitar aos habituais lugares comuns que afirmam que a culpa é de todos e que a atitude profissional nunca foi posta em causa».
O remédio também não está nas táticas, nem nas opções técnicas, isso é uma ilusão que tem servido para os acomodados e bem pagos se esconderem atrás de desempenhos medíocres, disfarçados aqui e acolá com toques de genialidade sem, no entanto, ao longo dos tempos recentes, terem contribuído para uma significativa mudança de paradigma exibicional e recolocarem o Benfica nos palcos dos principais teatros europeus.
Por mais que se tente iludir o problema, a verdade é que, apesar dos volumosos investimentos na contratação de melhores profissionais, o futebol da águia tem perdido entusiasmo, ambição, coragem e a classe que diferencia as grandes equipas, em que a regra impõe elevados padrões exibicionais, em contraposição ao que oferece o atual Benfica: sucessivas atuações pardacentas, embora se perceba a indignação de jogadores que não se sentem bem no ambiente de balneário, a pedir urgente arejamento ao nível de mentalidades.
FOI a ansiedade com o Paços de Ferreira, depois a desilusão diante do Moreirense e, na última sexta-feira, a pobreza observada no campo do Arouca. Três jogos, e qual deles o mais sofrido, de um Benfica indiferente, desinteressado e a trabalhar em serviços mínimos. Assim, não há treinador que resista a este estado de espírito abúlico, motivo pelo qual Rui Costa terá de intervir com a firmeza que sugere Vítor Serpa para separar as águas.
Talvez hesite na estratégia: decidir depressa e com ruído, se necessário for, ou, pelo contrário, avançar por etapas, fazendo o que tem de ser feito com o mínimo de turbulência, sendo certo, porém, que em ambas as situações a medida prioritária a tomar, em nome da disciplina, da estabilidade e até do bom senso, aconselha a separação de companhias pouco saudáveis de quantos continuam a acreditar que o sucesso da equipa é o objetivo supremo que aglutina as sensibilidades do grupo e pelo qual todos devem lutar até à exaustão.
Em período de mercado aberto, é normal ouvir dizer-se que os clubes a ele recorrem para contratações cirúrgicas a meio da temporada, mas, na opinião do benfiquista e comentador de A BOLA TV Pedro Ferreira, num misto de fina sagacidade e notória preocupação, aquilo que neste momento o Benfica mais precisa é de fazer saídas cirúrgicas.
A expressão é curiosa e suscetível de provocar diversas interpretações e desencontradas opiniões. Que se deve emagrecer o plantel está à vista de todos. Nélson Veríssimo já disso deu conta à Administração. É evidente o excesso de gorduras que nada acrescentam, a não ser no peso da massa salarial. É estranha a quantidade de gente vulgar que foi engrossando o plantel encarnado e que não vale o que custa. Só atrapalha, preenchendo vagas que poderiam ser atribuídas aos jovens da formação, e destroça qualquer projeto de futuro.
Por razões que não são da minha conta, a águia resolveu abrir as portas a jogadores mais de passado, a falsas promessas ou a quem foge de uma grande carreira, simpáticos eufemismos para sublinhar que há uma distância enorme entre quem tem jeito para dar pontapés numa bola e um verdadeiro futebolista profissional.
SAÍDAS normais são aquelas que A BOLA anunciou na sua edição de 21 de janeiro, as cirúrgicas têm outro envolvimento e, em concreto, sinalizo duas: André Almeida e Pizzi, por serem capitães e, como é público, por representarem mais a divisão do que a união. Quer queiram ou não, os seus nomes ficam associados aos despedimentos de Bruno Lage e Jorge Jesus. Por outro lado, com as suas eventuais dispensas Rafa Silva ficará com liberdade para ganhar outro protagonismo e fazer o que ainda não conseguiu: assumir-se como jogador de corpo inteiro, de nível superior, desejado nas principais ligas europeias, enfim, um jogador de eleição e titular de seleção. E deixar suscitar dúvidas apenas compreensíveis em relação a talentos em início de carreira. Já não há explicações para dar e, ontem, Nélson Veríssimo, confrontado com uma questão incómoda, defendeu-se e defendeu-o ao responder que continua a fazer o caminho dele.
Hoje, o Benfica defronta o Boavista na primeira meia-final da Taça da Liga. Tem o dever de ganhar, mas pelo andar da carruagem, aos solavancos, nunca se sabe. É um troféu para erguer, embora de relativo significado. Os adeptos exigem sempre a vitória, mas na última temporada nenhum título foi conquistado, foi um zero total e sobreveio a ideia de ninguém se ter zangado: foi obra da Covid, do azar e do acaso. No final da presente época, o mínimo que vai exigir-se a Nélson Veríssimo será a entrada direta na Liga dos Campeões, o que o obriga, para já, a ficar em segundo lugar no Campeonato. Sem jamais esquecer o título, enquanto houver uma réstia de esperança. Qual Taça da Liga!...