Querer muito é querer quanto?

OPINIÃO07.05.202207:00

O FC Porto quer muito festejar o título na Luz; o Benfica quer muito que isso não aconteça. Quanto valerá, afinal, o que cada um quer?

Atradição ainda é o que era. A rivalidade no futebol continua a estar viva a um certo prazer maquiavélico no sofrimento do outro. Nada que a moral cristã aprove, mas tudo o que o instinto animal do Homem consegue preservar em estado puro.
Sendo o futebol uma arte performativa não virá mal a um mundo, que assiste ao sofrimento humano como se se tratasse de uma banalidade dos tempos, acompanhar e promover estas guerras virtuais, representadas num campo de futebol, entre dois exércitos fardados a rigor, mas que têm apenas uma bola como arma mortífera. E isso é tranquilizador, porque provoca iguais intensidades de sentimentos e emoções nos cidadãos mais respeitáveis e nos menos respeitáveis, alinhando, assim, os humanos por uma raça igual, transversal, unicolorida.

Não me causa transtorno ético ou moral a anunciada ideia de que um título festejado em pleno Estádio da Luz significa, para os portistas, um acontecimento que dá razão a um festejo especial do título. Claro que o importante é mesmo a conquista do campeonato, mas a cereja no topo do bolo é poder festejar esse sucesso no território do maior rival, num desrespeito próprio dos vencedores das ancestrais batalhas.
Também se entende a firmeza com que os adeptos do Benfica anunciam a sua intenção de não consentir essa celebração, que, aliás, consideram humilhante. Em tempos recentes, quando aconteceu algo de semelhante, o Benfica passou as marcas do seu desespero para uma das maiores humilhações da sua História, apagando as luzes do estádio e ligando a rega automática da relva para impedir os festejos portistas, o que, por ironia, tornou esse dia absolutamente inesquecível para todos os adeptos do futebol português.
 

Dragões festejaram na Luz em 2011


Desta vez, já se foi anunciando que, aconteça o que acontecer, em caso de confirmação do título do FC Porto, não haverá boicotes, não haverá censura prévia, não haverá limitações à liberdade de fazer a festa. No entanto, a acreditar nas declarações que antecedem o clássico, o Benfica vai querer chamar  a si toda a dignidade daqueles que sentem o orgulho perdido e, por isso, lutar o mais e o melhor que sabe para ganhar o jogo e afastar de casa a festa alheia.

Acredito que, cada qual por suas razões, FC Porto e Benfica queiram muito ter êxito neste clássico.
É difícil, como compreenderão, avaliar o peso real de cada vontade, de conhecer a medida certa de cada ambição. Limito-me a uma sensação meramente intuitiva de que, em condições de pressão, o FC Porto reage melhor, porque tem uma equipa competitivamente mais sólida e, sobretudo, mentalmente mais forte.

É verdade que em alguns dos momentos mais difíceis da época, em jogos com o Liverpool, o Ajax e o Sporting, em Alvalade, o Benfica deu uma resposta acima das expectativas que surpreendeu tudo e todos habituados a ver o Benfica jogar muitas vezes um futebol preguiçoso e entediante. Também por isso é legítimo acreditar que o Benfica projete um plano especialmente pensado para este jogo e que surpreenda toda a gente. Pode acontecer. No futebol, tal como ainda agora se viu em Madrid, pode sempre tudo acontecer. Porém, não é expectável que aconteça. O mais previsível será o FC Porto, com maior ou menor dificuldade fazer, no mínimo, o ponto que lhe falta para a grande festa. Porque há um histórico recente que lhe é favorável e porque o FC Porto é, de facto, a equipa mais carismática do futebol português, aquela que aguenta mais a solidez impenetrável da sua alma de conquistadores. Além disso, não festejar na Luz tiraria, de facto, o sabor doce que o campeonato deverá ter.
 

O FUTEBOL E O VALOR BRITÂNICO

O governo britânico percebe que o futebol não pode ficar de fora das preocupações governamentais, até porque se trata de uma indústria que tem um peso e valor assinaláveis. Daí que tenha apresentado os novos mandamentos para maior equidade competitiva, maior controlo das finanças dos clubes, maior vigilência sobre potenciais financiadores, maior atenção ao desenvolvimento do futebol jovem e do futebol feminino, maior incentivo à identidade dos clubes de comunidade. O governo britânico não tem medo e respeita o futebol.
 

OS PROFESSORES E OS ENFERMEIROS

Os professores e os enfermeiros continuam a ser das classes mais mal tratadas e menos reconhecidas em Portugal. Não é, apenas, porque o Estado lhes paga demasiado pouco e lhes oferece tão más condições de vida, mas pelo que o Estado transmite, pela sua prática de comportamento e discurso, de desvalorização de dois grupos profissionais que representam pilares essenciais em duas área prioritárias e que definem, por si só, o estado de maturidade e desenvolvimento de um país - a educação e a saúde.