Quem quebrará?

OPINIÃO17.04.201901:08

1 - Nas conversas com os meus amigos benfiquistas reina o pessimismo mútuo: eles apostam que nesta luta titânica a dois será o Benfica a quebrar, eu aposto, a contragosto, que será o Porto. No fundo, de ambos os lados, o que se quer é não alimentar demasiadas ilusões para depois não ter de enterrar demasiadas desilusões. Porém, no meu caso concreto, não é apenas isso, mas também alguns dados objectivos que a meu ver favorecem o Benfica nos cinco duelos finais que falta disputar. Primeiro, o calendário: o do Benfica é claramente mais fácil. Tem apenas dois jogos teoricamente difíceis - as deslocações a Vila do Conde e a Braga. Mas o Rio Ave só agora quebrou um longo ciclo de resultados negativos em casa que não antecipa grandes dificuldades para a deslocação dos encarnados e, quanto à subida a Braga, enfim, nós, portistas, não temos muito a esperar da estreita amizade que une os dois clubes e presidentes e que nem o roubo dos jovens do Leixões já apalavrados pelo Braga abalou - tendo o presidente do Braga achado mais valente atirar-se ao presidente do Leixões do que ao do Benfica, pois claro. Ou seja: não vejo onde e como o Benfica poderá perder pontos daqui até final, muito embora vá dando sinais de evidente perturbação quando menos se espera. Mas quando escutamos declarações como as de Petit,  não há lugar para grandes expectativas... Em comparação, o FC Porto, além de também ir a Vila do Conde, tem ainda uma tradicionalmente difícil deslocação ao campo do Nacional, agora a lutar pela manutenção, e recebe na última jornada o Sporting em clara subida de qualidade competitiva. Esta é a primeira razão objectiva para o meu pessimismo. A segunda tem que ver com o maior grau de cansaço que eu penso ser detectável nos jogadores do FC Porto do que nos do Benfica. De 30 de Março até à próxima segunda-feira, 22 de Abril, o Benfica terá disputado 7 jogos em 23 dias. E de 30 de Março até ao próximo sábado, 20 de Abril, em 21 dias, o FC Porto terá disputado também 7 jogos - um a cada três dias. Um calendário bem pior do que o do Benfica, porque o Liverpool é bem melhor que o Eintracht, 4 saídas é pior do que 3 e nesse período ir jogar para a Liga a Portimão e a Braga é bem mais puxado do que apenas ir enfrentar o último da tabela a Vila da Feira. Acresce que, como diz Bruno Lage, «o Benfica não tem um onze», e ele tem-no provado, rodando a equipa q.b., enquanto que Sérgio Conceição tem um onze e só mexe nele por necessidade.

2 - O cansaço portista foi bem visível em Portimão, um jogo de resultado enganador que só foi ganho por rasgos individuais e solidez defensiva. Logo à noite, frente ao Liverpool, o FC Porto, como o escrevi a semana passada, está confrontado com o pior dos cenários possíveis: mandam a dignidade e os pergaminhos que a equipa se atire ao jogo como se tivesse fé numa reviravolta na eliminatória que, à partida, todos sabemos ser um milagre quase inalcançável. E mesmo que um golo madrugador dos ingleses desfaça logo qualquer esperança, o mesmo caderno de encargos obrigará a equipa, perante os seus adeptos, a continuar a esforçar-se por dar o melhor de si. Ou seja, vai acumular cansaço inutilmente. Se em Anfield, Marega tivesse levantado a cabeça e passado a bola para o lado, de uma das duas vezes em que se viu isolado e sem ângulo para rematar à baliza, o FC Porto poderia ter chegado ao golo que tornaria diferentes todas as perspectivas. Assim...

3 - O futebol, até o nosso, às vezes tem coisas pelas quais vale a pena continuarmos apaixonados por ele. Como o abraço de João Félix ao seu irmão/apanha-bolas. Foi coisa bonita de se ver! Como bonito de se ver é o futebol deste miúdo, ao ponto de eu, como portista e como apaixonado por futebol, hesitar em querer que o Benfica o venda ou que não o venda, para poder continuar a vê-lo todas as semanas, numa televisão perto de mim.
Custa-me saber, e mais ainda perceber, como é que houve quem o tivesse deixado ir embora dos escalões jovens do FC Porto, sem dar pelo valor dele. Quem foi essa luminária? Pode saber-se o nome ou nomes dele(s)? Ainda está (estão) ao serviço do clube? Mas também me custa adivinhar que João Félix não é, garantidamente, caso único. Onde estão os talentos do futebol jovem, das escolas do FC Porto que nos últimos anos chegaram à equipa principal? Onde estão os jovens que brilham na Youh League e nos juniores e que depois desaparecem sem deixar rastro ou vão aparecer noutros clubes? Será por vir da equipa B do Benfica e conhecer bem os jovens do clube que Bruno Lage tem lançado mão de vários deles na equipa principal? Como se explica que Bruno Costa tenha jogado duas vezes em dois anos nos quartos de final da Champions em Anfield e só este sábado, contra o Portimonense, tenha beneficiado de uns poucos primeiros minutos na Liga portuguesa? Vai aqui uma critica a Sérgio Conceição? Vai, sim senhor. Eu sei que ele não gosta de criticas, mas eu também não gosto de coisas que às vezes tenho de encaixar: é assim a democracia. E, na verdade, só são admiradores sinceros, como eu sou do trabalho dele, aqueles que nos criticam quando acham que o devem fazer. E eu acho que Sérgio Conceição, pura e simplesmente, olha para a equipa B e para os jovens do clube como se dali não houvesse nada a esperar. Só isso justifica coisas como o Maxi Pereira ou o Fabiano Freitas ainda serem opção por vezes ou o Fernando Andrade ser preferido a jogadores que o clube lá tem infinitamente mais talentosos do que ele e que só esperam uma oportunidade. Porque como disse o Bruno Costa, cheio de razão, é preciso jogar de vez em quando para explodir.

4 - Não é coisa que eu faça muitas vezes, mas no outro dia dei-me ao esforço de assistir a parte do programa do Rui Santos na SIC. E fiquei sinceramente convencido que o rapaz deve ter sido assustado por uma daquelas claques que não existem, de tal maneira ele jorrava um benfiquismo por todos os poros, cuja fonte não lhe conhecia. Primeiro, fazendo o saldo da jornada e as suas contas reais ao campeonato após o controverso Feirense-Benfica, concluiu que o Benfica levava 10 pontos a menos do que devia relativamente ao FC Porto. Ora, como três dias antes o vira falar em 7 pontos, deduzi que, não só achara limpinha, limpinha a vitória do Benfica na Feira, como achara que o Porto deveria ter perdido 3 pontos na sua pacífica vitória de 2-0 sobre o Boavista: notável! Mas o melhor estava para vir : Rui Santos propôs-se demonstrar, com recurso a tecnologia 3D, e graças a «um trabalho que durou quatro horas», que  o golo anulado ao Feirense (e que seria o 2-0), foi mesmo off-side. Um esforço destes, nem a BTV! E, então, foi assim: a tal câmara virtual de Rui Santos sacou uma madeixa de cabelo ou a ponta do nariz de um jogador do Feirense metido na barreira do Benfica e adiantada a esta, a uns dez metros da baliza, no momento em que o livre lateral é batido. Então este jogador vai cabecear a bola e marcar golo, vindo de off-side, pensei eu? Não, o jogador não toca na bola. Mas está off-side porque, explica o mestre, é aquele jogador, exactamente, que juntamente com mais uns seis ou sete de ambas as equipas que correm para a baliza, quem vai obstruir a visão do guarda-redes impedindo-o de ver a bola - que, todavia, não vem daquela direcção, mas de um ângulo lateral de 45 graus. E o juiz-de-linha - que não tem de todo a visão do lance do guarda-redes, mas já tinha tido a genial visão de descortinar a madeixa do jogador do Feirense em off-side - vai concluir que, no meio da molhada é aquele mesmo que obstrói a visão de Vlachodimos, que está a olhar para outro lado. Fiquei estarrecido. E mais ainda porque antes tinha ouvido Rui Santos fazer uma longa e didáctica prédica sobre os malefícios do «futebol televisivo». E com este, se não me engano, já lá vão três golos anulados a adversários do Benfica por obstrução visual ao seu guarda-redes. Quantos mais pontos é que isso dará nas contas reais?