Proteger quem não é tolerante

OPINIÃO19.09.202206:30

Os estádios não devem ter guetos e há muito que não somos animais

VIVEMOS tempos difíceis e o futebol, como sempre, é reflexo do que se respira fora de campo. Se a crise que atravessamos, avisam-nos há semanas, irá certamente (e infelizmente) acentuar convulsões sociais, intolerância e até o crescimento ideológico da extrema direita, e isto já depois de nunca termos imaginado ser possível voltar a haver guerra na Europa, diria que podemos esperar que as manifestações de racismo, xenofobia e violência disparem e o civismo diminua de forma extrema. Cabe-nos individualmente, seja ou não lirismo da minha parte, combatê-lo.

Nos últimos dias, temos assistido a cenas degradantes nas bancadas dos estádios da Primeira Liga. Quem não costuma estar presente em encontros de modalidades coletivas, dos benjamins aos seniores, terá ficado surpreendido, porém casos de intolerância são regra e não exceção. Não vou aqui comparar Famalicão a Estoril, que não são semelhantes, mas atrevo-me a dizer que ambos sublinham o quão errado estamos: os regulamentos ou as regras, escritas ou de boca, não existem para o bem do espectáculo. Com a salvaguarda de que é para proteção do próprio protege-se sim quem não é tolerante, não se sabe comportar, não consegue conviver com o outro, se esse outro pensa de forma diferente.

Qualquer adepto tem direito a vestir a camisola do seu clube, a sentar-se no lugar para o qual comprou bilhete e a, pasme-se, festejar golos e vitórias, desde que de forma não provocatória. É nesse sentido que federações e ligas devem trabalhar. Para que a exceção seja o mau comportamento e não o contrário. Sei que a nossa cultura desportiva assenta, estupidamente, em gostar de ganhar para ter arma de arremesso para as habituais picardias no café e no escritório, mais do que do clube e do próprio futebol, todavia os estádios não devem ter guetos e há muito que não somos animais.