Permaneçamos incómodos

OPINIÃO23.11.201803:00

Não ofenderei a inteligência de ninguém expondo as razões da importância do Futebol Clube do Porto para a nossa comunidade. Pode-se assim concluir, através de um processo dedutivo muito simples, que alguém que não a perceba é muito estúpido.
Os processos dedutivos dão muito jeito para percebermos as coisas. Por exemplo, um governo tem como missão central, diria mesmo que única, a prossecução do bem-comum. Instituições como o FC Porto ou muitas outras relacionadas com o desporto ou não, ajudam muito nessa tarefa.


Segundo passo. As instituições têm história e precisam de cultivar a memória.  Celebrar datas importantes é, aliás, uma tarefa essencial das pessoas que dirigem conjunturalmente o seu destino. A comemoração dessas datas é um momento em que não só a instituição lembra a sua história, como os órgãos representativos da comunidade, onde está inserida, aproveitam para publicamente reconhecer o papel de quem os ajuda na construção do referido bem-comum. Isto é feito em função da instituição em causa, mas também para que todas as outras percebam que o seu papel é e será promovido e enaltecido.


Ora, um governo que não tem este tipo de cuidado com as instituições do país que governa está, no mínimo, a ser incompetente na sua função. Um governo que não faz uma homenagem pública a um clube que faz 125 anos e que é uma referência em Portugal e das instituições portuguesas mais prestigiadas no mundo, além de ser incompetente, despreza todos os seus sócios e adeptos. Um governo que, pela ocasião, não se digna sequer mandar uma carta ao clube, fazer um telefonema a um dirigente ofende gravemente o clube e quem faz parte dele.


Ficámos a saber pela boca do Presidente do FC Porto numa entrevista ao Porto Canal que sim, o governo português ignorou o clube pela passagem dos seus 125 anos de existência. Melhor, o governo português decidiu que uma instituição que leva o nome de Portugal aos quatro cantos da Terra, que trouxe para o nosso país os mais prestigiados troféus internacionais, que promove o desporto e cumpre tarefas que deviam ser prosseguidas pelo Estado, que é amada por milhões de homens e mulheres não merece receber os parabéns por uma comemoração com tanto significado.


O meu primeiro impulso foi dizer, digamos, umas palavras pouco elogiosas sobre este governo. Um insulto destes não é coisa pouca, não deve ser tratado com um encolher de ombros. Uma atitude destas não tem perdão e foi este e não outro governo a tê-la. Mas será que isto é muito surpreendente? Será que outro governo faria diferente? Será que, pensando bem e mais friamente, esta conduta surpreende?
Afinal, este é o país onde o poder central detesta tudo o que sejam realidades que não consegue controlar desde o Terreiro do Paço; o país que não convive bem com o facto de organizações atingirem sucessos fora do colinho do poder; o país onde ainda não se digere bem que um clube tenha chegado ao topo do mundo sem a bênção de um regime. É também um país que continua a conviver mal com a liberdade, que permanece saudosista do tempo em que a ditadura decretava quem podia ou não contratar jogadores, quem podia ou não ser presidente da Federação Portuguesa de Futebol, quem devia ou não ser campeão.


Não, eu não tenho ilusões: esta ofensa feita ao brasão abençoado seria feita por outro governo qualquer - há que agradar ao sistema. Mas, como tudo na vida, aprende-se sempre qualquer coisa. Este caso serve para nos lembrar que estamos longe, muito longe de sermos vistos como iguais.  Não convivem bem com a nossa realidade, não gostam que não sejamos submissos, não suportam que não fiquemos calados, odeiam que denunciemos as poucas-vergonhas. Gostavam de nós simpáticos, atentos e venerandos, subjugados a uma maioria que se acha dona de tudo mas que se esquece que o trabalho, a vontade, o empenho e a força que nos vem do brasão abençoado é maior e mais forte que todos os exércitos. Continuamos incómodos. Permaneçamos incómodos. A luta continua.
 
A morte da galinha dos ovos de ouro

ESSA coisa chamada Liga das Nações interessa-me tanto como o torneio de malha e chinquilho promovido pela Festa do Avante. Mas tem um significado que está longe de me ser indiferente.


Esta espécie de competição mais não é que uma batalha numa guerra em que o perdedor vai ser o futebol. De um lado os interesses financeiros das federações (como aqui bem destacava o meu irmão de fé, Miguel Sousa Tavares), do outro os dos clubes europeus. A questão, claro, é que os clubes europeus gastam o seu dinheiro e as federações brincam com o dinheiro dos outros.


É verdade que o dinheiro cega, mas o que as federações parecem esquecer é que forçando a nota com estas competições extravagantes mais não fazem do que atalhar caminho para a fuga dos principais clubes europeus para uma Super Liga europeia. E não vale a pena comparar a Liga das Nações com os particulares de seleções, esta competição desgasta muitíssimo mais os jogadores, aliás, é elogiada por, aparentemente, ser competitiva.


Forçando os jogadores a fazer demasiados jogos numa época e expondo-os a lesões e ao cansaço faz com que os clubes pensem se não será melhor ideia saírem das organizações a que pertencem (o caso do PSG que se arrisca a jogar uma partida decisiva sem dois jogadores que lhe custaram a módica quantia de 400 milhões de euros é um exemplo gritante). Melhor dito, sendo os clubes obrigados a dispensar os jogadores sob a pena de não poderem disputar as competições é normal que pensem se faz sentido fazer parte delas. E, claro, são os principais clubes que são mais prejudicados, como são também eles os que mais incentivos têm a fazer uma prova paralela - o que aconteceu no basquetebol europeu é um exemplo claro do que pode estar para acontecer no futebol.
Já se sabe: foi a ganância que matou a galinha dos ovos de ouro.

A responsabilidade dos órgãos de comunicação social

NÃO o incluo esgotos a céu aberto que difundem interrogatórios judiciais na categoria de órgãos de comunicação social.
Os que considero verdadeiros órgãos de comunicação social são entidades que, errando muitas vezes e curvando-se outras tantas a interesses de mercado,  ainda exercem as suas funções segundo os cânones jornalísticos.

Dentro desses parâmetros está o filtro que têm de aplicar para não divulgar poucas-vergonhas ou, simplesmente, patetices.
Vem isto a propósito do destaque que a TVI24 deu a um pateta que resolveu dizer que ia pedir a reabertura de um processo que já foi julgado há muitos anos e que qualquer advogado estagiário sabe não ser possível reabrir.

Não desconheço que a amizade com o presidente do Benfica pode abrir portas que qualquer decência impõe que estejam fechadas, mas o que é demais é demasiado.