Palmas para Fernando Gomes
O assunto desportivo mais falado esta semana foi também, ao contrário do que acontece em muitas outras semanas, o mais importante: a reflexão pública de Fernando Gomes, Presidente da Federação Portuguesa de Futebol sobre o futuro do futebol.
As suas conclusões são lineares e só não as entende quem não quiser, o que aliás não terá grande importância, porque essas pessoas não fazem falta ao futebol e, muito provavelmente, a coisa nenhuma - o futuro do futebol não está garantido pois as pessoas conseguem viver sem futebol.
Há muito tempo que não via um dirigente do futebol assumir com tanta coragem e simplicidade uma visão tão realista do futuro da modalidade. Fez jus à sua condição de dirigente máximo do futebol português, que sabe bem fazer uso das competências que a Lei de Bases do Desporto lhe conferiu, após anos de luta contra o conservadorismo, e não só, das Associações Distritais, e dá-nos esperança, com a sua reeleição, que vamos lutar, com determinação e competência para procurar garantir o futuro do futebol. Não tenho direito a voto na Assembleia da Federação Portuguesa de Futebol, nem faz falta, mas dou-lhe todo o meu apoio, porque sempre apoiarei quem quer reflectir antes de dizer ou fazer.
Passe a vaidade de lembrar que ando há dois anos a dizer que os clubes, designadamente o meu, tinham de mudar de vida, expressão que agora já vejo mais usada, porque o Covid-19 a isso nos obriga e vai obrigar. Valia o que valia, tanto mais que, como é óbvio, não previ a causa da crise, e, por consequência, achava que a mudança seria muito mais lenta e traria uma resistência muito maior. Os exemplos são mais do que muitos, porque há certas mentalidades que só mudam quando são obrigadas a mudar. O povo diz que só os burros não mudam, mas há inteligentes e espertos que também não lhes interessa mudar. Infelizmente, as causas imediatas da mudança são uma catástrofe de consequências ainda não previsíveis na totalidade!
Muita gente veio dizer que estava despeitado com o resultado obtido, quando escrevi, após as últimas eleições no Sporting, que o meu tempo tinha acabado, sendo necessário mudar de vida, não só no meu clube, como nos outros. Na verdade, não esperava um resultado tão diminuto ou residual, tanto mais quanto houve muitos comentadores e opinadores não interessados, nem comprometidos, que achavam ser eu o mais bem preparado para assumir o cargo. Mas tive a humildade de tirar as devidas ilações daquele resultado e, ao contrário do despeito de que alguns me acusam, disse sinceramente que a constatação do meu tempo ter acabado não me causava amargura ou azedume, mas sim preocupação!
Os tempos que se seguiram deram-me razão, e, por isso, pergunto agora: mesmo que estivesse amargurado ou azedo, tinha ou não razões para estar preocupado com o futuro do meu clube e do futebol em geral, para já não falar de outros aspectos da nossa vida na sociedade actual? Consequência dessa preocupação legítima levou-me a continuar a pensar e a lutar pelas minhas ideias e ideais, porque esse tempo ainda não acabou e vai continuar a dar-me razão. Valem o que valem, e sei que não valem de muito, sobretudo no que ao meu clube dizem respeito. Mas vale verificar que há cada vez mais pessoas que pensam como eu, que defendem o que eu defendo, e para quem o tempo ainda não acabou. Espero que todos saibam aproveitar este tempo que tem de ser forçosamente de reflexão e acção racional e humilde.
É por ter pouco valor e importância aquilo que eu digo e escrevo que aplaudo de pé a posição que o Presidente Fernando Gomes acaba de assumir publicamente e que parece definir um rumo para o futebol ao contrário daqueles que se recusam a encontrar esse rumo, navegando à vista.
Não faltam os que acusam o Presidente da FPF de uma posição eleitoralista, quando é evidente que ele não tem necessidade dessa manobra. Pelo contrário, não tem nada de eleitoralista, antes sendo um verdadeiro programa de acção, com um objectivo bem definido, de que nem todos gostarão e alguns procurarão boicotar. E não precisa de dizer muito mais, pois se conseguir pôr em prática as suas ideias, já fará um grande trabalho a acrescentar a tudo o que tem feito.
Relativamente à competividade das competições, e no que diz respeito as competições não profissionais, já Fernando Gomes deu nota de que a proximidade das equipas faz aumentar o interesse dos adeptos e uma diminuição das despesas, tal como defendi quando Presidente da Liga Portuguesa de Futebol Não Profissional.
De resto, apenas tenho uma observação a fazer ao artigo de Fernando Gomes, qual é, a passagem que refere «mais respeito pela arbitragem». Sempre ouvi dizer que se devem respeitar os outros para nós próprios sermos respeitados. Ora, se os clubes, os treinadores e os jogadores devem respeitar a arbitragem, também a arbitragem (incluindo o VAR) deve respeitar todos os outros agentes, e muitas vezes, demasiadas vezes, não o faz, ofendendo a verdade desportiva e fazendo dos adeptos parvos.
Fernando Gomes preconiza uma verdadeira revolução nas práticas e mentalidades dos que vivem do e para o futebol. Desejo que sem concessões para os que preferem a mentira e não a verdade, a corrupção em vez da ética e da transparência! E, para isso, a disciplina desportiva não pode estar sempre à espera da outra justiça que pelo tempo que demora é normalmente injusta, ferindo a verdade desportiva. Só assim se pode aceitar que as regras sejam duras e para cumprir como refere. Dura lex, sed lex, mas de nada vale se não for aplicada em tempo.
O futuro do futebol não está garantido, diz o Presidente da Federação Portuguesa de Futebol, e diz bem. E pode ficar comprometido se o presente for ocupado com discussões fúteis e inúteis, como são muitas das discussões passadas.
Esperemos que nos próximos meses saibamos ter os pés assentes na terra e juízo na cabeça, porque só assim se poderá ter alguma esperança no futuro mais remoto. Temos de ser implacáveis com todos os vírus, seja o Covid-19 ou os que infectam a moral e a ética. Diz bem Fernando Gomes que «as pessoas conseguem viver sem futebol», admitindo que poderão viver pior. Eu acrescentaria que o futebol viverá melhor, sem certas pessoas !...
DE SANÇÃO A OBRIGAÇÃO! APELO