Outra maneira de olhar o ‘caso Cavani’

OPINIÃO25.07.202003:30

Muito se falou e escreveu recentemente sobre a possibilidade do internacional uruguaio  Edinson Cavani vir para o Benfica. Hoje, como se sabe, houve fumo, não houve fogo. Talvez que, em alguns casos de jornalismo virtual, nomeadamente televisivo, tenha havido apenas uma fumarada, até porque o momento parece particularmente sensível e a dança das cadeiras deixa tudo e todos nervosos, à procura de audiências a qualquer preço. E isso é obviamente mau. Para os canais que seguem a vertigem das audiências e que acabam por se descredibilizar, mas também, o que é mais grave, para o jornalismo em geral, porque não raras vezes há a tendência de meter tudo e todos no mesmo saco de descredibilidade penalizante.
Mas é verdade que a notícia de que o Benfica se interessou por Cavani e que Cavani se interessou pelo Benfica não tinha um fundamento de falsidade, muito embora a forma como alguns a desenvolveram a tenha tornado, já, no domínio da ficção.
Seja como for, Luís Filipe Vieira terá percebido que não se tratava propriamente de uma oportunidade tentadora, mas de uma aventura e, como tal, descoseu a bainha do negócio e fez soltar um comunicado curioso, pela sua originalidade, onde dizia que há jogadores que não se enquadram na realidade económica e financeira do futebol português.
É uma verdade de um racionalismo irrepreensível. O Benfica, ou qualquer outro clube português, não pode, ou não deve, deixar-se seduzir pelo luxo de contratar jogadores da elite do futebol mundial, mas que não poderão dar qualquer retorno no final de contrato. O que será o mesmo que dizer que nenhum dos nossos clubes, alguma vez, poderá chegar a jogadores desse nível superior.
Mas será isto uma verdade absoluta?
Não é. Como bem todos se lembram, o FC Porto contratou Iker Casillas, num esforço financeiro evidente, sabendo que não poderia aspirar a qualquer retorno financeiro. Infelizmente, a experiência acabou de forma abrupta e triste, mas só alguém pouco lúcido ou esclarecido dirá que o FC Porto não teve retorno. Teve, e muito. No prestígio internacional que conquistou, na consolidação de um espírito altamente profissional no plantel, na forma como a relação entre clube e jogador se demonstrou ser de conveniência mútua e, por fim, na imagem de rara competitividade que o futebol português, através do FC Porto,  ofereceu ao mundo.
A verdade é que o futebol nacional, na fase de estagnação em que se encontra, ao nível interno, e na imagem de conservadorismo bacoco que projeta internacionalmente, estaria precisado de algum espírito de aventura, uma ponta de utopia, enfim, de uma aposta num jogador fora de série, daqueles que são capazes, por si só, de animar um campeonato, chamar público, renovar o espírito pequenino e remediado tão típico da mentalidade lusitana.
Não sei se esse jogador poderia ser Cavani, um avançado uruguaio de extraordinária qualidade, mas, evidentemente, no pôr do sol da sua brilhante carreira, ou se poderia ser outro, mais conveniente e mais produtivo, mas parece-me que o futebol português muito teria a ganhar com a contratação de um jogador capaz de chamar a atenção internacional e de excitar o mundo aborrecido e monótono deste futebol a preto e branco.
Acautelando a devida proporção, atente-se no caso de Itália, onde um futebol aborrecidíssimo ressuscitou de luz e cor com a contratação de CR7. Claro que não temos, em Portugal, clubes com a dimensão da Juve, mas há não é preciso ser o melhor do mundo.