Os rostos da crise no circo dos leões
BRUNO DE CARVALHO deve submeter o seu nome, a sua presidência, o seu projeto a eleições? A resposta é sim. Porque mudaram drasticamente as circunstâncias nas quais foi eleito por esmagadora maioria e alteraram-se também profundamente as circunstâncias, depois da assembleia em que se achou legitimado.
De então para cá não passou muito tempo, mas passou todo um rio revolto que tudo arrastou. Começou nas disparatadas críticas públicas ao modo como os seus jogadores chutavam à baliza, ou se comprometiam com o jogo, passou por um irreversível abalo da autoridade do treinador e ultrapassou todos os limites da paciência de qualquer cidadão leonino na forma, pelo menos permissiva e displicente como encarou o problema grave da proteção física e psicológica aos seus jogadores, ameaçados por uma corja extremista num lugar supostamente inacessível do estádio de Alvalade e, depois, barbaramente agredidos em Alcochete, o que mereceu ao presidente uma frase que ficará entre as mais célebres no futebol português: «Foi chato, mas amanhã é outro dia».
De tudo isto derivou um divórcio irreversível com toda a equipa de futebol, o corpo técnico, onde se inclui Jorge Jesus, e todo o staff clínico. E estes factos originaram a rutura com o seu grupo apoiante mais mediático e indefetível, de Ricciardi a Eduardo Barroso, de José Eduardo a Daniel Sampaio. É chato, mas nada é como era...
MARTA SOARES fez bem em decidir marcar uma assembleia geral de sócios para destituição do presidente? Lamentavelmente, a resposta é não. E não, porque as circunstâncias desaconselham qualquer ajuntamento entre as partes em conflito extremado. Basta olhar para a cena canalha da vã tentativa de comunicação do presidente da assembleia geral demissionário, que pretendia informar os jornalistas do resultado da reunião com Bruno de Carvalho e seus mais resistentes acólitos, para se perceber que uma assembleia de sócios para destituição do presidente se transformará numa batalha campal, que nem o mais pesado corpo de intervenção policial conseguirá evitar. E mesmo que fosse possível, coisa que não será, criar condições musculadas para permitir uma assembleia pacificada no seu ambiente, a simples constatação de que essa reunião se fará em cima de um barril de pólvora, afastará de uma decisão fundamental para o futuro do clube todas as pessoas de bom senso que não querem ser heróis desnecessários, obrigados a colocarem tão obviamente em causa a sua integridade física e a sua saúde mental.
A meu ver, a única solução possível para resolver o dramático momento do Sporting é o da convocação de eleições. Diz Bruno de Carvalho que eleições, nesta altura, colidem com os «superiores interesses do Sporting». Pior do que os factos confessados pelo presidente leonino, que confirma o bloqueio da sua ação, estando impedido de ter a autoridade necessária para negociar contratos e de encontrar liquidez de tesouraria?
Vistas bem as coisas, que razão objetiva e digna de ser considerada apresenta Bruno de Carvalho para prolongar toda esta horrível agonia? Apenas o que considera serem «os superiores interesses do Sporting» que, na sua perspetiva, só ele é capaz de dar resposta, mesmo que fragilizado. O problema é que não é ao presidente que compete decidir, em causa própria, quais são os superiores interesses do Sporting. Essa é, precisamente, a competência maior dos sócios e deve ser expressada em eleições.