Os riscos de decidir sem sair de casa

OPINIÃO08.08.202003:30

O Sporting estuda o futuro. É a notícia boa. A notícia má é que cada um decide o que estuda. Um grupo de sócios de reconhecido mérito e estatuto social estudou uma alteração estatutária que não tem a ver com a mudança estatutária que a direção pretende propor. Aqui, entre os órgãos sociais, a ideia vai no sentido da massificação do voto. Os sócios, dizem as fontes oficiais, ultrapassam, agora, os cem mil e o desejo é que as decisões não passem, apenas, por cerca de um por cento dos promissores votantes, mas por uma significativa maioria. Como será isso possível? Pois pela modernidade do i-voting, que permitirá o voto dos sportinguistas, estejam onde estiverem, sem precisarem de ir à assembleia de voto. Garante, o presidente da assembleia geral, que, aliás, nunca reagiu às críticas de uma ausência injustificada do grupo do «novo rumo», que o i-voting seria um avanço democrático e seguro.
Mas falamos de quê?
Falamos de votações relativas ao clube e a única incidência que poderão ter no futebol profissional diz respeito à escolha dos órgãos sociais e da direção que, por sua vez, determina a escolha dos administradores da SAD.
Ora, o que não deixa de ser curioso é que apesar dessas administrações terem uma gestão autónoma, os sócios continuam a manter o sonho de uma liderança do tipo democracia popular, onde o voto de cada um, em teoria, tudo pode decidir na gestão das empresas relacionadas com o clube. E isso, por muito que pareça politicamente incorreto e supostamente antidemocrático, não melhora com maior representatividade, apenas torna o risco maior, porque numa assembleia geral, com a presença física dos sócios, ainda pode haver influência da argumentação de quem sabe do que fala, mas numa votação do tipo pandémico, em que todos ganham o direito de decidir a partir de casa, o voto torna-se imprevisível e pode muito bem tornar qualquer clube totalmente ingovernável.

A UEFA já percebeu que tem um problema complicado para resolver na abertura da nova época das competições europeias. Uma coisa é pisar o tapete vermelho lançado por Fernando Gomes e dizer que a fase final da Champions se jogará, toda ela, em Lisboa; outra, bem diferente, é pensar em toda a logística desde a  fase inicial de eliminatórias com jogos em que participam equipas menos preparadas e menos equipadas, até à conclusão das fases de grupo, o que envolve todos os países e todos os clubes qualificados, obrigando a viagens entre Estados que têm critérios e regulamentação diferente no que respeita à segurança dos seus cidadãos.
Os sinais que nos chegam do avanço da pandemia são, aliás, perturbadores. Muitos países que já tiveram significativos resultados estão, agora, sujeitos a um novo aumento de infeções, já havendo quem admita que chegou a segunda onda de contágios. Apesar da boa vontade de países como a Hungria, a Polónia a Grécia ou o Chipre para receberem alguns jogos em território neutro, dificilmente haverá uma solução viável. Por exemplo, países como a Inglaterra, que têm sido particularmente rigorosos no que respeita à lista de países que permitem corredores aéreos sem restrições, não mudariam de política, apenas, para permitirem que se realizassem os campeonatos europeus de futebol. Perante a complexidade do problema, o regresso do público aos estádios é o que menos preocupa Aleksander Ceferin, o presidente da UEFA. Ele sabe que está em causa algo de muito mais grave e de muito mais importante para o futuro das competições.