Os recomeços

OPINIÃO30.08.202004:00

1 - Aí está o sorteio da Liga NOS e da segunda Liga. E das outras competições  de futebol - exclusivamente as autorizadas pela DGS! -, sejam as organizadas pela FPF sejam pelas Associações Distritais e Regionais de Futebol. E de outras modalidades de pavilhão e ao ar livre nos termos de protocolo articulado e publicado. E com a angústia de os escalões de formação ficarem de fora com sentida angústia para os jovens praticantes e seus Pais e Avós (!), sufoco financeiro para os clubes e outras estruturas associativas ligadas ao desporto e incapacidade de perceção da igualdade de tratamento e da coerência de  procedimentos , princípios e valores essenciais e determinantes a um verdadeiro Estado de Direito democrático. Começo a ter a sensação que a pandemia cria uma certa convicção que a igualdade tem dias e a coerência tem momentos e determinadas circunstâncias. O que começa a ser intensamente exteriorizado como bem  percebeu, e sentiu, no Porto, o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa. O que temos, para já, é o sorteio da nossa principal competição e com a primeira jornada a decorrer na semana de 20 de setembro, cinco dias após todo o País se confrontar  com  um aviso, com tempo, de um novo estado de contingência. E cinco depois do arranque formal das aulas e com a consciência, por ora,  que haverá nas escolas a disciplina de Educação Física. E, complementarmente, atividade de tempos livres que, acredito, em muitos locais já foram plenamente retomadas para alívio, desde logo, de muitas tesourarias! O que fica do sorteio, cheio de ritmo e intercalado de justos prémios, é um confronto, na primeira jornada, dos dois clubes (SAD’s) que conquistaram o acesso direto à Liga dos Campeões e da Liga Europa - Futebol Clube do Porto e Sporting de Braga agora liderado por Carlos Carvalhal -, a deslocação do Benfica a Famalicão e a receção do Sporting ao Gil Vicente. O calendário proporciona os principais confrontos para as últimas jornadas - a 14.ª. e a 16.ª -, o que determina que o Benfica só irá encontrar  o Futebol Clube do Porto e o Sporting em …2021! Mas já na quarta jornada, a meio de outubro, o Porto de Sérgio Conceição desloca-se a Alvalade para defrontar o Sporting de Rúben Amorim. E logo antes do arranque da fase de grupos das competições europeias e após a segunda pausa para os jogos das  seleções  nacionais  e antes mesmo do final do primeiro período de transferências . O calendário aí está. Para já sem  público, apesar das legítimas insistências do Presidente da Liga Portugal, que organizou e protagonizou, na passada sexta-feira, uma atrativa festa/sorteio a partir de Vila Nova de Gaia. O calendário mostra que até à quinta jornada, ou seja, até ao final de outubro, o Benfica de Jorge Jesus joga três vezes no Estádio da Luz - Moreirense, Farense e Belenenses SAD (ou em rigor B-SAD) - e tem duas nada fáceis deslocações ao Minho, a Famalicão e a Vila do Conde (Rio Ave). E na sétima jornada, e depois de ir ao Bessa e ao novo Boavista, recebe o Sporting de Braga (à sétima jornada, prevista para 8 de outubro) . O calendário aí está. Nele entram os outros calendários , como  a final four da Taça da Liga prevista para as vésperas do Natal , e nas próximas três edições na bonita cidade de Leiria, e, naturalmente, o calendário da participação da nossa principal seleção na sua complexa fase de grupos da Liga das Nações e, por excelência, o calendário das fases de grupos das Liga dos Campeões e da Liga Europa, onde se deseja firmemente que estejam presentes todas as equipas portugueses em processo desportivo de acesso . Ou seja, que ultrapassem, com todo o êxito, as eliminatórias  de acesso. Seria um sinal bem positivo nesta nova primeira época em que estamos no sexto lugar do ranking da UEFA . Ou seja, aquele que por exemplo permite que no final desta época, deste recomeço e,   logo, deste calendário, os dois primeiros classificados da ainda Liga NOS tenham acesso direto à fase de grupos da Liga dos Campeões.

2 - Amanhã o Benfica fica a saber quem é o seu adversário na pré-eliminatória de acesso ao play-off da Liga dos Campeões e, ainda, se o jogo se disputará em casa ou fora de casa! Antes do arranque da nossa Liga este novo e renovado  Benfica de Jorge Jesus tem três jogos determinantes. Diria que dos mais importantes desta época que  agora  recomeça. Acredito que tudo será feito para criar as condições para o Benfica ter acesso à fase de grupos da Liga dos Campeões. Aceito que a construção seja feita por etapas em razão, até, do largo  período de novas inscrições definido para o futebol português. Mas o Benfica tem de ter, como decerto a partir dos jogos particulares  será evidenciado (como o de hoje no Estádio da Luz), a coluna central da sua nova equipa sedimentada até aos meados de setembro. Depois da confusão de tantas pretensas contratações importa que o paraíso da estabilidade se afirme e se proclame. Até para que as claques deixem de ser bruxas, os altifalantes baixem o tom dos seus insistentes anúncios - ao que dizem…  nunca tóxicos -, a excitação termine e o plantel se feche  e saibamos, de certeza, com o que, de verdade, contamos. Com a consciência,  desde há séculos , que «quem começou tem metade da obra executada»! Bom recomeço!

3 - O terramoto Messi chama a nossa atenção. Também ao nível do direito do desporto, da singularidade da época desportiva que acaba de terminar, da natureza, validade  e âmbito do seu contrato e da sua proclamada cláusula de liberdade. Mas Messi também ajuda a perceber, em ousados termos de geopolítica, a crise de identidade   da Catalunha, as clivagens que dividem Espanha, o problema da monarquia e da forçada ausência do  Rei Emérito, a crise de e no Governo central e, logo, quase que o fim de um ciclo em que Catalunha e o Barcelona  se confundiam. «Mais do que um clube» era a mensagem  mil vezes repetida. Mas o que fica, por excelência, é a construção de uma identidade vencedora que tinha em Messi  a referência, a excelência, o pivot, o capitão, o líder indiscutível. Percebe-se o sentimento de orfandade que invade a cidade, a região, os sócios , os milhões de simpatizantes. A lúcida e sempre sagaz  crónica de Jorge Valdano de ontem neste jornal faz-nos  a síntese: «Vai-se embora porque com 33 anos não pode levantar o Braça sozinho e porque, neste Barça, não pode continuar a ser Messi!»  O que significa que também em Barcelona e no Barcelona pode ter de haver um recomeço!