Os ‘meninos’ à volta do leitão
Temos excelentes jogadores e excelentes treinadores, mas faltam dirigentes que saibam olhar ao interesse comum
A CABOU na Mealhada, e na linguagem do futebol, a expressão usada por Mateus no seu Evangelho, «não atirem pérolas aos porcos», isto é, não gastem o que temos de precioso com quem não aprecia. A partir de agora o que há de precioso no futebol há que o gastar com o leitão.
Como todos sabem, leitão é um porco jovem, antes de ser desmamado, e por isso podemos dizer que o futebol português saiu da Mealhada rejuvenescido! Estamos em tempo de sub-21 e foram os meninos do futebol português que se sentaram à volta do leitão!
No fim, Jorge Nuno Pinto da Costa disse que o primeiro-ministro tem de demitir os responsáveis por estas situações e, se não for capaz de o fazer, então que se demita. Não sei se Pinto da Costa tem ou não razão para pedir estas demissões, mas devia ir um pouco mais longe e, com espírito construtivo, sugerir que fosse para ministra do Desporto, ou mesmo para primeira-ministra, a actual ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública!
Na verdade, e embora ainda não tivesse visto muitos resultados na modernização do Estado, que aliás mete o bedelho em tudo e mais alguma coisa, talvez a sua pasta no Governo actual a inspirasse para uma certa modernização do futebol português, embora este talvez precise mais de moralização do que propriamente de modernização. Pelo contrário, somos até muito modernos, tirando o corporativismo salazarista de alguns órgãos e associações que integram a Federação Portuguesa de Futebol, como de resto o próprio Estado.
Mas é sobretudo o seu nome, Alexandra Ludomila Ribeiro Fernandes Leitão que a recomenda para tão exigente cargo. A sede do próprio Conselho de Ministros devia mudar para a Mealhada porque as soluções do País e do futebol estão no leitão. Leitão ao poder e passaremos a ser um país a sério!
A Liga para que serve? Para nada, pois o seu presidente tem por apelido Proença - nada que se coma - e o Benfica não gosta dele, nem com molho do tomate, muito menos com vinho espumoso. E a Federação? Tem Fernando Gomes que também me parece não ser do agrado do Futebol Clube do Porto!
Não há qualquer respeito pelo presidente da Liga e vice-presidente da Federação porque normalmente estes lugares são ocupados por pessoas que fazem fretes a uns e não fazem a outros, isto é, não têm qualquer respeito pela sua posição institucional. E quem não se dá ao respeito, não pode ser respeitado. Não é o caso de Pedro Proença, um antigo árbitro, figura prestigiada nacional e internacionalmente. A sua licenciatura faz, no entanto, e sei bem porquê, alguma comichão a certas pessoas.
E na Federação Portuguesa de Futebol, embora com um presidente que tem feito excelente trabalho, há uma mistura de gente que não se recomenda, nem se devia tolerar, como sejam as associações de classe a confundirem os seus interesses com os do futebol e a gerirem os órgãos da Federação, como por exemplo o Conselho de Arbitragem, que todos querem dominar e manipular.
Razão tinha o falecido árbitro Vítor Correia que costumava dizer que no futebol português já tinha visto tudo, inclusive um porco a andar de bicicleta, e agora só faltava ver a bicicleta a andar de porco!
Hoje, Vítor Correia estaria completamente desactualizado, porque estando os clubes, ainda que alguns apenas em teoria, virados para a formação, já não se deixa o leitão chegar a porco para o pôr a andar de bicicleta. Agora o leitão anda de Mercedes ou equivalente!
É verdade que há uns anos - no tal meu tempo que já passou - os presidentes se sentavam à mesa para discutir - e algumas vezes com o poder político - e para resolver os problemas do futebol, e resolveram muitos, sem querer saber de sindicatos ou associações patronais, associações de classe e outras sem classe nenhuma, mas para formar associações de clubes e, finalmente, a Liga Portuguesa de Futebol Profissional e mentalizar todos os dirigentes que havia muitos problemas para a indústria do futebol para além do penálti que se marcava ou não marcava ou do cartão amarelo que devia ter sido vermelho e não foi. Ainda há gente viva que se lembra das paelhas em casa do saudoso João Rocha, por ele confeccionadas, que terminaram algumas vezes com o ministro Almeida Santos a cantar - e bem - o fado de Coimbra, acompanhado à guitarra por um presidente do Supremo Tribunal de Justiça, o Conselheiro Almeida Borges! E isto não era promiscuidade entre a política e o futebol, mas uma forma séria, e sem dramas, de encarar os ventos do futebol que já sopravam para o lado da importância que hoje têm na economia mundial. A esses presidentes muito se deve do bom que hoje se tem. O problema não é a ementa do repasto, mas sim da mentalidade e do carácter de quem se senta à mesa do orçamento na política ou do leitão no futebol.
Que tenham interesse em comer paelha ou leitão, não é isso que importa. O que importa é que cada um dos que se sentam à mesa à volta do manjar não tenham outros interesses que não sejam os colectivos, seja na politica, seja no futebol!
Temos excelentes jogadores e excelentes treinadores, isto é, excelente matéria-prima, mas faltam dirigentes que saibam olhar ao interesse comum e desenvolver o futebol como uma indústria credível, sem situações ridículas e incompreensíveis! Podemos imaginar um restaurante de luxo, com a melhor matéria-prima no que toca aos alimentos, mas com cozinheiros que apresentam croquetes fritos em óleos mais que requentados?
Não interessa o que lhes servem à refeição, no sul, no norte ou no centro. Pode ser leitão, bacalhau ou uma simples carcaça com manteiga. Interessa-nos sim que sirvam os clubes que representam e não se sirvam deles, assim servindo o interesse nacional e o do futebol. Comam à vontade, mas não comam tudo e não deixem nada! Na política, como no futebol!
Alguns jornais mostravam nas capas fotografias de Vieira e Pinto da Costa sem máscara. Não sei como estiveram antes e durante o leitão, à saída havia quem tivesse máscara (Pinto da Costa e Vieira, por exemplo) e quem a não tivesse. De resto, muito antes da pandemia, já havia quem usasse máscara e quem a não usasse. E alguns que usavam deixaram-na cair! É a vida, a política e o futebol no seu esplendor!
No futebol, como na política, anda muita gente de máscara, quer realmente, quer em sentido figurado, mas sempre mudável conforme os interesses com que jogam!
Mas ao vê-los sair do restaurante, olhando a sua inocência a descoberto ou tapada pela máscara, veio-me à memória aquela bela canção dos meninos do Huambo, soberbamente interpretada por Paulo Carvalho, mas com um refrão diferente e adaptado ao momento:
Os ‘meninos’ à volta do leitão
Vão aprender sem ‘cheta’, nem alegria,
Sem a Liga, nem tão pouc’a Federação
Vão saber o que custou a pandemia!